Eleições 2024: a “teoria” Pędłowski
"Segundo a 'teoria' acima, queríamos perder. Logo, os erros cometidos pelo PT e pelo governo teriam sido propositais; e as derrotas teriam sido autoinflingidas"
Quem venceu as eleições de 2024? Depende do resultado do segundo turno.
Quem venceu o primeiro turno? Quem teve mais votos, conquistou mais prefeituras e mandatos de vereança, ou seja, o campo político que vai da centro-direita até a extrema-direita.
Entre os que admitem isso, há quem acrescente três complementos:
-que o PT não teria vencido, mas também não teria sido derrotado;
-que a vitória teria sido da “democracia”;
-que o governo Lula teria saído vitorioso.
O primeiro complemento não encontra amparo nos dados divulgados pelo Grupo de Trabalho Eleitoral do PT (GTE).
Segundo o GTE, "em 2020, o PT estava presente em 1.584 municípios, elegendo 183 prefeitos e prefeitas, 206 vices em coligação com aliados, e 2.663 vereadores e vereadoras. Agora, elegendo 248 prefeitos(as), 222 vices e 3.118 vereadores(as), além dos 13 municípios em que vai disputar o segundo turno. O PT estará presente em 1.742 municípios".
Também segundo o GTE, o PT recebeu 6.909.779 votos em 2020 e 8.884.677 votos em 2024.
Mesmo considerando que o eleitorado total de 2024 é maior do que o de 2020, o PT cresceu. Isto é verdade. E se o PT fosse uma pessoa buscando superar seus próprios problemas, o resultado da eleição de 2024 teria sido, sem dúvida, um progresso em relação a 2024.
Mas o PT não é uma pessoa buscando superar suas próprias metas, o PT é um partido em luta contra outros. E o problema é que estes outros partidos cresceram muito mais do que nós.
Em números absolutos de votos válidos, o PT ficou em sexto lugar, atrás do PL, do PSD, do MDB, do União e do PP. E se considerarmos apenas estes 6 partidos, o PT ficou em quinto lugar em taxa de crescimento. O PT cresceu 25% em relação a 2020. Já o PL cresceu 233%, o PSD cresceu 33%, o MDB cresceu 30% e o PP cresceu 29%.
Além disso, o PT conquistou 183 prefeituras em 2020. Acontece que muitos prefeitos se filiaram ao PT, antes da eleição de 2024. Quando a campanha de 2024 começou, tínhamos 265 prefeituras. E na eleição de 2024, conquistamos 248 prefeituras. Logo, se for para ser rigoroso, não teríamos crescido 82, teríamos diminuído 17 prefeituras...
Além disso, 188 destas prefeituras são em cidades com menos de 20 mil habitantes. E só 2 ficam em cidades com mais de 200 mil habitantes. Claro, isto pode mudar drasticamente a depender do que ocorra no segundo turno. Mas os números realmente existentes não autorizam falar em vitória ou crescimento do PT.
Já a ideia de que a vitória teria sido da “democracia” parte do pressuposto de que golpistas seriam os do 8 de janeiro, a turma do cavernícola e do boçal. Já os demais setores da direita seriam democratas.
Aceito este pressuposto, restaria verificar qual foi o desempenho - no primeiro turno - das candidaturas ligadas explicitamente à extrema-direita.
O Partido Liberal, por exemplo, foi o que recebeu maior número de votos entre todos os partidos. Ademais, o PL cresceu 233% em relação ao resultado obtido nas eleições de 2020. Se a isso acrescentarmos resultados como os obtidos pelo boçal na eleição de São Paulo capital, a conclusão é que é a extrema-direita cresceu, mesmo estando fora do governo.
Por outro lado, cabe questionar o pressuposto apontado anteriormente. Em muitas cidades do país, houve alianças de primeiro turno entre direita e extrema-direita. Em São Paulo capital, por exemplo, Nunes foi apoiado por Bolsonaro. O mesmo vale para Melo, em Porto Alegre. A lista é imensa. Ou seja: a direita "democrática" no Brasil não é tão democrática assim.
Claro, há quem pense o contrário, como é o caso do ex-deputado federal João Paulo Cunha, que já está defendendo que Lira entre no governo Lula.
A entrevista de Cunha está aqui: Estadão 🗞 | ENTREVISTA | Integrante da “velha guarda” do PT, o ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha atua cada vez mais nos bastidores… | Instagram
Sobre o governo Lula, há quem lembre que as eleições são municipais: não estavam diretamente em jogo nem o governo, nem Lula.
Além disso, há quem diga que como o governo de Lula é de “frente ampla”, ele só poderia ser considerado derrotado se candidaturas explicitamente oposicionistas tivessem sido vitoriosas.
Finalmente e paradoxalmente, há quem argumente que mesmo um resultado final problemático poderia ser revigorante para uma candidatura de Lula à reeleição, em 2026.
Os resultados do segundo turno vão responder se estes argumentos e outros similares procedem ou não. Mas não é preciso esperar o dia 27/10 para discutir a procedência da “teoria Pedlowski”.
A tal “teoria” está exposta aqui:
Reproduzo abaixo dois trechos representativos desta teoria:
-“avalio que a estratégia eleitoral determinada por Lula e pela cúpula dirigente do PT era algo que ia no sentido de “entrar em campo para jogar, fingindo que se quer ganhar, mas fazendo uma força danada para perder”;
-“discordo de quem diz que a política da “Frente Ampla” de Lula foi derrotada no primeiro turno das eleições municipais de 2024. Na verdade, essa política ficou fortalecida ao apontar para um cenário em 2026 em que novamente será o PT (e seus aliados) contra o conveniente fantasma da extrema-direita”.
Segundo a “teoria” acima, queríamos perder. Logo, os erros cometidos pelo PT e pelo governo Lula teriam sido propositais; e as derrotas teriam sido autoinflingidas.
O incrível nesta “teoria” não é sua semelhança com as narrativas conspiratórias que se escutam, por exemplo, na Jovem Pan.
O incrível é que seu autor não perceba que, a depender dos resultados dos dois turnos de 2024, o que poderemos enfrentar em 2026 é uma “frente ampla” sem o PT e contra o PT.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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