Em um dos dois, erramos
"As duas indicações são demonstrações da 'tese do dedo podre'", escreve Fernando Horta
A informação de que o presidente Lula escolheu para a função de procurador geral da república (que terá a última palavra sobre TODOS os indiciamentos de Jair Bolsonaro, por exemplo) Paulo Gonet e para a vaga de Rosa Weber no STF o ministro Flávio Dino caiu como uma bomba no campo progressista, hoje. Se Dino tem todos os predicados para ser ministro do STF (embora eu ache que não deveria ser), Gonet tem tudo o que um governo progressista deveria se afastar quando se fala em nomeações para o judiciário. Mas não foi nesta dupla, que o presidente Lula errou.
O buraco é mais embaixo.
Gonet, em 2002, já defendia a estranha tese do “racismo reverso” e seus assemelhados. Isso, portanto, muito antes de Bolsonaro, MBL e Brasil Paralelo. Se Lava a Jato tivesse criado um grupo chamado “Filhos de Gonet” (em vez do grupo real “Filhos de Januário”) seria a única decisão verdadeira da tal “força-tarefa”. Gonet defendeu a ditadura, Gonet defendeu os abusos digitais nas eleições, e Gonet, se estivesse vivo teria sido contra a Lei Áurea. A pergunta que devemos fazer é: por que o presidente fez isso?
A resposta me parece clara: Gonet é o passaporte que garante Dino ser aceito nas sabatinas do Senado. Nos últimos dias, duas indicações do presidente foram derrotadas pelos senadores, mandando um poderoso recado de Pacheco. Tal qual a bem-sucedida campanha de Lira, “Caixa por votos”, Pacheco também deseja o seu quinhão. A partir daí, Dino só passaria na sabatina se Pacheco recebesse um “agrado”. Gonet.
Podemos perder tempo discutindo se o agrado é do tamanho da benesse. O que vale mais: um Dino entre outros 10, ou o PGR mais conservador, desde Haroldo Valladão? A resposta não nos leva a lugar algum. A questão é outra. Se a presença de Dino no STF é tão importante que vale perdermos um ministro da justiça balizador do governo, um presidenciável, um senador progressista e um jovem político para as próximas décadas e ainda ganharmos um PGR que é a antessala do fascismo, isso significa dizer que a institucionalidade brasileira está sobre risco. A única alternativa para explicar isso (não sendo a famosa do “dedo podre de Lula nas indicações”) é que estamos às portas de uma ruptura institucional, e Dino seria um reforço confiável e de coragem numa Suprema Corte que está há anos “acovardada”.
Se isso é verdade, então a indicação de Zanin foi completamente equivocada. Zanin não ajudou a questão da diversidade no STF. Não trouxe qualquer novidade de pensamento da corte. Deu decisões recentes que assustam até os mais “de centro” e não sendo político, não serviu de moeda de troca na dança das cadeiras. Ou seja, Zanin deixa de fazer aquilo o que precisamos deslocar Dino para fazer. E se precisamos de duas indicações para acertar, vamos mal.
Penso que, no fundo, as duas indicações são demonstrações da “tese do dedo podre”. Não, obviamente, por qualquer mácula na indicação de Dino. Ocorre que me parece um preço muito alto duas cadeiras no STF, mais um PGR completamente contrário a qualquer questão progressista por uma estabilidade institucional que não há garantias. Me parece que a tônica do governo segue sendo gastar recursos demais por ganhos diminutos.
Que o futuro me prove completamente errado.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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