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    Weiller Diniz

    Jornalista especializado em cobertura política, ganhador do prêmio Esso de informação Econômica (2004) com passagens pelas redações de Isto É, Jornal do Brasil, TV Manchete, SBT. Também foi diretor de Comunicação do Senado Federal e vice-presidente da Radiobrás, atual EBC.

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    Estadista do cercadinho

    "Entre os métodos recorrentes de Jair Bolsonaro para tramar contra a democracia representativa muitos têm inspiração nefasta no nazismo", escreve o jornalista Weiller Diniz

    (Foto: Reprodução)

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    Em suas vagueações mundo afora, fruto do ócio improdutivo e do sadismo degenerado, o capitão Bolsonaro parece não cansar de enxovalhar indistintamente os brasileiros por onde pisa, sempre babujado por comitivas exóticas em hospedagens nababescas. O anão institucional do cercadinho vem buscando camuflar sua pequenez administrativa e política em missões internacionais improdutivas, cada vez mais restritas a nações com fortes convergências com sua índole autoritária e ditatorial. Entre as nações democráticas se sente desconfortável.

    O tour desértico aos Emirados Árabes, Bahrein e Catar não produziu um resultado concreto conhecido, além de uma motociata inútil e poeirenta. Mais uma exibição internacional de despreparo, apenas para verbalizar tolices incompreensíveis. Em Dubai chegou a dizer que por lá tratou da “troca de presos políticos”. Para ele, são presos políticos no Brasil Roberto Jefferson, antes Daniel Silveira e, em breve, Allan dos Santos. Miragens do sheik golpista.

    O histrião do cercadinho demonstra sua “pouca inteligência” sempre que o mundo abre os microfones para ele se expressar. Em janeiro de 2019, a estupidez fez a estreia mundial. No encontro de Davos, além de um discurso pífio de 15 minutos que frustrou expectativas internacionais, Bolsonaro protagonizou uma das barbaridades do anedotário mundial da política, ao oferecer a exploração econômica da Amazônia ao ecologista Al Gore. O diálogo é um trecho do documentário alemão “O Fórum”, que retrata os bastidores do evento. O registro foi publicado em várias redes sociais.

    Nas cenas, Al Gore se aproxima do presidente para mostrar solidariedade em relação ao estado de conservação da Amazônia, afirmando: “Estamos todos muito preocupados com a Amazônia, é algo que me toca profundamente”. O presidente brasileiro vê a situação com um olhar turvado, do andar de baixo: “Temos muita riqueza na Amazônia e eu adoraria explorar essa riqueza com os Estados Unidos”.

    Na abertura da 76ª Assembleia Geral da ONU, em setembro em Nova York, o Golias do cercadinho não se limitou a ridicularizar o Brasil. Mentiu numa incontinência despudorada: “Estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção”…“Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior”… “No Brasil, para atender aqueles mais humildes, obrigados a ficar em casa por decisão de governadores e prefeitos e que perderam sua renda, concedemos um auxílio emergencial de US$ 800 para 68 milhões de pessoas em 2020”… “Lembro que terminamos 2020, ano da pandemia, com mais empregos formais do que em dezembro de 2019”… “Apoiamos a vacinação, contudo o nosso governo tem se posicionado contrário ao passaporte sanitário ou a qualquer obrigação relacionada a vacina”…”Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina”…”Não entendemos porque muitos países, juntamente com grande parte da mídia, se colocaram contra o tratamento inicial”.

    A hipocrisia, a ignorância e a mentira patológica estarrecem. O PSL pelo qual foi eleito usou laranjas. Os filhos estão investigados ou denunciados por corrupção, o vice-líder foi flagrado com dinheiro na cueca, há ministros indiciados, Paulo Guedes tem uma offshore, o orçamento secreto é para corromper o parlamento e o escândalo das vacinas foi escancarado. Na compra da Astrazeneca era cobrado 1 dólar de propina por dose. A aquisição da Covaxin, exigida por Bolsonaro, só foi cancelada depois que a CPI encadeou mais de 20 irregularidades. Entre elas superfaturamento, falsificação de documentos, pressão sobre servidores e pagamentos antecipados em paraísos fiscais a empresas estranhas ao contrato.

    A compra só foi desfeita depois que o laboratório indiano descredenciou a intermediária, a Precisa Medicamentos, caloteira conhecida do líder do governo e ex-ministro da Saúde, Ricardo Barros. A excursão serviu para disseminar fake news, espalhar Covid-19 e ainda rendeu um festival de gafes, esfarelando o pouco que restava da nossa credibilidade. Bolsonaro se encontrou com o premiê britânico Boris Johnson e respondeu que “ainda não” se vacinou, que estava com imunidade contra Covid-19 alta porque já teve o vírus. O dedo obsceno do ministro da Saúde também não será esquecido.

    Em novembro, os périplos do liliputiano Jair Bolsonaro evidenciaram o desprezo diante dos chefes de Estado do G20. O capitão ficou deslocado, não conseguiu interagir com outros líderes e o Brasil amargou a certeza de ser um pária mundial, insignificante para outras nações. Não pisasse o pé de Angela Merkel teria saído sem ser notado. Para o Brasil ficou apenas a imagem da selvageria e a agressão a jornalistas brasileiros. A vergonha foi de tal magnitude que Bolsonaro foi constrangido a desistir da segunda perna da excursão, em Glasgow, na Escócia.

    O mal-estar é patente e expõe apenas o que sempre se soube sobre ele, a incapacidade de formular algo inteligível ou se expressar. É uma reiteração da humilhação mundial. Já de volta ao gigantismo do cercadinho, Bolsonaro errou o nome do senador de extrema direita italiano Matteo Salvini, único político de alto escalão na Itália que aceitou participar de um compromisso a seu lado fora do âmbito do G20.Em conversa com apoiadores, Bolsonaro chamou Salvini de “Salvati” e ainda confundiu o cargo do ultradireitista, dizendo que ele foi primeiro-ministro. Também errou o nome da “torre de pizza”.

    O efeito prático da jornada nas mil e uma noites escuras das arábias ditatoriais serviu para iluminar a relevância do ex-presidente Luiz Inácio da Silva no cenário mundial. Tratado com honrarias reservadas a altas personalidades, Lula foi recebido por Emanuel Macron, no Palácio do Eliseu com a marcha da guarda republicana, distinção dada aos representantes de grandes instituições internacionais. Além da forma, o governo francês divulgou – ao contrário das conversas ociosas de Bolsonaro – o conteúdo do encontro: governança global, combate às desigualdades, à fome, crise sanitária, situação climática e o desmatamento.

    Antes de se reunir com Macron, Lula foi recebido pela prefeita de Paris – berço do iluminismo -, Anne Hidalgo. Na passagem pela Europa ainda teve o encontro com Olaf Scholz, futuro primeiro-ministro da Alemanha, e com Pedro Sanchez, premiê e líder dos socialistas da Espanha. A recepção respeitosa e as conversas de Lula pela Europa tiveram ampla repercussão e editoriais nos jornais. Serviu para redimensionar o Brasil no exterior, revelando que o país é bem-vindo ao debate mundial sobre temas globais relevantes e contemporâneos. É desprezado quando a pauta é a do cercadinho, medieval e antidemocrática.

    Desde a posse, Bolsonaro conspira contra a democracia e seus alicerces. Seguindo um manual populista mal-ajambrado, convocou manifestações para rupturas institucionais, pregou abertamente a desobediência a decisões judiciais e tentou deslegitimar os demais Poderes da República. A índole golpista é fruto dos inquéritos no rastro do clã, da queda vertiginosa nas intenções eleitorais, do salto nas estatísticas de rejeição e desaprovação da gestão, da erosão da imagem desencadeada pela CPI da Pandemia, da ruína econômica (inflação, desemprego, fome, PIB em queda) e da prisão das cavalgaduras que serviram de biombo no desafio aos Poderes.

    Entre os métodos recorrentes de Jair Bolsonaro para tramar contra a democracia representativa muitos têm inspiração nefasta no nazismo: hostilizar a imprensa, atribuir todos os malogros aos comunistas (esquerda e o PT), incensar a mitomania ignorante, reforçar o ideário de reiteração de mentiras, apostar na propaganda maciça de falsidades alienantes, o culto à morte, o belicismo, a militarização dos cargos públicos civis e a disseminação do ódio contra todas as minorias, adversários, pensadores, escritores e a academia.

    A percepção do declínio democrático foi traduzida pelo relatório do Instituto para Democracia e Assistência Eleitoral, sediado em Copenhague. O Brasil é o país onde a democracia registrou piora no maior número de fatores que medem a qualidade do regime democrático nos últimos cinco anos. Foram retrocessos em muitos setores, entre eles nas liberdades civis, independência do Judiciário, integridade da imprensa e liberdade de expressão.

    O IDEA é uma organização intergovernamental apoiada por 34 países e dedicada ao estudo e à avaliação da democracia. O relatório se baseia no acompanhamento de 16 fatores relacionados ao funcionamento adequado de regimes democráticos. Desde o golpe híbrido, o Brasil retrocedeu em todos os campos: institucional, jurídico, político, econômico, cultural, meio ambiente, política externa e social. Foi a manipulação do Judiciário, condenando ilegalmente o favorito entre os candidatos de 2018, que proporcionou o início da erosão democrática, no qual o ex-juiz Sergio Moro foi recompensado com um cargo de ministro e hoje se apresenta como opção presidencial negaceando todas as transgressões da Lava Jato.

    O documento do IDEA dá destaque às iniciativas e declarações de Bolsonaro que colocaram em dúvida a licitude do sistema eletrônico de votação e a atuação do Supremo Tribunal Federal. O relatório sustentou que o presidente “testou explicitamente as instituições democráticas brasileiras, acusando ministros do Tribunal Superior Eleitoral de se prepararem para conduzir atividades fraudulentas relacionadas às eleições de 2022 e atacando a mídia”. A fúria contra a imprensa já está catalogada em diversos levantamentos específicos.

    O IDEA registra ainda que o presidente “alegou que as eleições poderiam ser canceladas a menos que ele fosse alterado” e “declarou que não iria obedecer ao STF, que conduz um inquérito contra ele por espalhar notícias falsas sobre o sistema eleitoral no país.” Além do Brasil, tiveram piora nesses quesitos a Polônia, o Benin e o Iêmen. O mundo nos rebaixa aos pigmeus da democracia, mas os pigmeus sempre morrem pequenos. A primeira-dama, beneficiária de depósitos gigantescos do Queiroz, andar fantasiada de Branca de Neve é a alegoria perfeita.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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