Fux é mestre na estratégia de pedir vista e sepultar processos
Um tribunal não pode ficar refém das idiossincrasias de um único juiz
Os pedidos de vista no Supremo Tribunal Federal desde sempre servem muito mais a estratégias políticas de ministros do que a aprofundamento sobre ações em votação. O regimento da corte foi modificado em 2022 pela Emenda Regimental 58, e desde então o prazo máximo para devolução de um processo para conclusão do julgamento pelo colegiado é 90 dias. Três meses, em alguns casos, pode ser muito tempo. De outra parte, ainda vivem-se reflexos de “perdidos de vista” do passado. O campeão nessa modalidade de chicana é o ministro Luiz Fux.
Num nítido ato de “populisprudência” (termo cunhado pelo professor de Direito da USP Conrado Hübner Mendes, que aglutina populismo e jurisprudência), Fux pediu vista do processo da cabeleireira-pichadora-golpista Débora Rodrigues dos Santos. O juiz, de perfil muito mais punitivista do que garantista, sofreu um surto piedoso, como amplamente noticiado. De pronto emergiu como fio de esperança bolsonarista no STF.
A estratégia de pedir vista de um processo equivale, muitas vezes, a matá-lo no peito e sepultá-lo para sempre. O único arranjo aceitável do pedido de vista é que não interrompa por prazo indeterminado uma deliberação que começou e que deve continuar em tempo hábil. Muitas vezes, o processo é devolvido quando o caso em tela já teve desfecho político, econômico ou social que torna o julgamento dispensável. Isso pode significar a vitória de um juiz postergador potencialmente derrotado pela maioria na turma ou no plenário.
O desempenho de Luiz Fux no campo estratégico dos “perdidos de vista” é espetacular. Em agosto de 2015, ele pediu vista do Recurso Extraordinário 635.659 / ADPF 187, que trata da descriminalização das drogas e discute a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343 / 2006). O julgamento está paralisado até hoje.
Em novembro de 2021, após o voto do relator, ministro Ricardo Lewandowski, Fux pediu vista em processo sobre o Fundo Eleitoral (ADI 5.998 / DF), que discute a validade da emenda parlamentar que aumentou o Fundo Eleitoral para R$ 5,7 bilhões, furando o famigerado teto de gastos. O adiamento permitiu que as eleições de 2022 ocorressem com o fundo ampliado, sem definição sobre sua legalidade. O caso permanece indefinido.
Em maio de 2023, Luiz Fux pediu vista, após o voto do relator Gilmar Mendes, da ADI 6.057, a qual questiona a autonomia do Banco Central conferida pela Lei 13.848 / 2019. Fux ainda não devolveu os autos, ferindo a Emenda Regimental 58 (a dos 90 dias), que é 2022, mas que não estabelece sanções a quem descumpri-la.
A vista de um processo deveria ser condicionada à devolução em sessão imediatamente subsequente, ou no máximo em duas sessões. Um tribunal não pode ficar refém das idiossincrasias de um único juiz.
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