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Daniel Rodrigues

Graduando em História pela UEPB; membro do Projeto de Pesquisa "História Judaica" e do Projeto de Pesquisa e Extensão "Núcleo de História e Linguagens Contemporâneas''

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Golpe Civil-Militar: a narrativa e a Reatualização dos discursos da extrema direita

Como se deram as narrativas e discursos da extrema direita e como foram se reatualizando com o passar das décadas?

Tanques tomaram as ruas em abril de 1964 (Foto: Domínio Público)

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A partir deste ano de 2023, completou-se cinquenta e nove anos após a instauração do Regime Militar (1964-1985) no Brasil. Houve um aumento considerável de produções historiográficas sobre a respectiva temática, no qual tal fato iniciou-se de forma fervorosa há uma década, quando o golpe militar completava cinquenta anos em 2014. O aumento da abordagem sobre o assunto se deu, também, devido aos vários embates políticos presenciados no presente ano de 2022. Resumido como sendo um ano de forte polarização política, polarização esta, que veio se estabelecendo há um tempo, desde de 2018, e se tornou mais forte com a soltura do Lula, no dia 08 de Novembro de 2019. No qual se tornou elegível e possível candidato às eleições de 2022, já sendo taxado como o único candidato capaz de vencer Bolsonaro — o líder da Extrema Direita no Brasil. Com certeza um ano marcado por uma das maiores polarizações políticas da história do país.

Atualmente discute-se bastante sobre o Golpe Civil-Militar, graças às ameaças e a tentativa errônea de mais um Golpe de Estado, em 08 de Janeiro de 2023. No entanto, quando o acadêmico vai realizar uma consulta ao passado, ele deve ter cautela, cautela de se deparar com barreiras que inviabilizam a reflexão e a crítica dos acontecimentos da nossa realidade presente. Implementando a transição da crítica para uma romantização/idealização de um falso passado. Quando lançado o olhar historiográfico ao passado, efetivamente, é percebido o predomínio da ausência de memórias ou simplesmente o silenciamento de determinadas experiências, e posteriormente, o esquecimento. 

O Regime Militar, como é comum na maioria dos Regimes Ditatoriais, são caracterizados pelo abuso de poder, pelo autoritarismo e excesso de violência. Logo, é necessário legitimar de alguma maneira todas essas ações repugnantes, a partir do desenvolvimento de um elo com a sociedade, mas como? Impondo barreiras sobre a respectiva área de estudo, silenciamento e até a criação de novas memórias sobre o passado, glorificando-o, idealizando-o. Em seguida, apresentando uma narrativa, que por sua vez atravessou décadas, e está incluída no discurso da Direita Extremosa, seja em qualquer nação que ela coloque seus tentáculos. É um discurso conservador que afirma acreditar no progresso, ao mesmo tempo que mantém a mesma hierarquia social e as mesmas instituições sem realizar quaisquer tipos de reformas de base. Acima de tudo, buscam defender fervorosamente os valores tradicionais, bem como a família e a religião determinante da região. No fim, o conservadorismo reacionário, autoritário e extremista é preponderante. 

Outro discurso bem conhecido pela Extrema Direita (que também atravessou décadas) é o discurso do Anticomunismo. Esse discurso se mostra sendo muito relevante nas análises da Ditadura Militar Brasileira, pois, talvez sem ele, os militares não conseguissem dar o Golpe de Estado e tomar o Poder no país, em 1964. O enfrentamento do comunismo foi se reafirmando e tomando forma graças a grande mídia corporativa brasileira, que se encontrava aparelhada ao Estado. Por conseguinte, o elo para com a sociedade foi sendo desenvolvido sob o pretexto de um falso progresso no âmbito da economia e a defesa dos valores tradicionais, isto é, a proteção da moral cristã das famílias católicas brasileiras. 

Para que seja possível entender o discurso do Anticomunismo e sua forte inserção, principalmente nos momentos de crise na história do país, o historiador Rodrigo Patto Sá Motta, busca explicar o surgimento de tal discurso a partir de três paradigmas essenciais: o Catolicismo, o Nacionalismo e o Liberalismo. O Comunismo se mostrava/mostra como uma ameaça ao catolicismo, pois segue uma linha de perspectiva no que concerne a questionar a existência de Deus, ao mesmo tempo que destacava-se por um suposto materialismo ateu. Dessa forma, a Igreja Católica adotou o discurso anticomunista sob a justificativa de que os comunistas almejavam o fim da moral cristã e a destituição da família tradicional. Portanto, é possível perceber que a Igreja Católica atuou como uma instituição política e ideológica altamente capitalista, que visava acima de tudo, o acúmulo de capital (uma verdadeira empresa). Utilizando, do que se pode chamar, de um sistema específico de persuasão, a propaganda. Pretendendo alienar seus fiéis em suas ações, modo de vida e convicções. Não é atoa que a Igreja Católica apoiou Regimes Totalitários, sobretudo, na primeira metade do século XX, influenciando através de narrativas, símbolos, ideologias, mantendo um elo com a sociedade altamente católica e possuindo uma enorme relação com a Direita Extremosa.

Sobre o âmbito do Nacionalismo, o Comunismo se mostrava também como uma ameaça. Os Nacionalistas defendiam ideais de ordem, o predomínio das hierarquias sociais, os valores tradicionais e a centralização das instituições do Estado. Logo, o Comunismo era visto como uma ameaça a toda estrutura de organização da sociedade, visto que defende fortemente a divisão social e especialmente a luta de classe. Na doutrina Liberal, o Comunismo era visto como um sistema que destrói a liberdade individual e a propriedade privada, uma vez que nesse sistema econômico e político, prevalece o ideal de uma sociedade sem classe. Não existe propriedade, somente o conceito de bens comuns, no qual os indivíduos são proprietários dos meios de produção (propriedade comum) e seus próprios empregados. Portanto, tal discurso anticomunista prevalece, não somente na sociedade brasileira (ainda mais forte em momentos de crise), mas, também, na narrativa dos movimentos de Extrema Direita espalhados pelo mundo, bem como na Itália, Hungria, Portugal, dentre outros. 

No que se refere a violência e a repressão política perpetrados aos opositores do governo em Regimes totalitários, nesse caso, no Brasil, observa-se que foi legado à sociedade brasileira traumas, danos e sequelas irreversíveis. Como por exemplo, o silenciamento e esquecimento da violência imposta aos opositores e considerados inimigos do Regime. Isso, devido a política e lei de anistia, no qual esperava-se a superação do drama sofrido. No entanto, o que se sucedeu foi o silêncio causado pelo medo, medo este, que reverbera atualmente na sociedade, quando o abuso de autoridade/poder exercido pelos agentes institucionais do Estado não são denunciados. É crucial também ressaltar o surgimento de narrativas fascistas, que acabam legalizando e naturalizando a ação desses agentes do Estado, como por exemplo: “Bandido bom é Bandido Morto”. 

Esse ódio, violência e repressão observada, especialmente na polícia, é fruto do processo de centralização e militarização das instituições do Estado a partir da instauração do Golpe Militar, em 1964. É fruto da impunidade para com os torturadores e carrascos da Ditadura. Que se traduz negativamente nas ruas dos grandes, médios e pequenos centros urbanos.

Mas e quanto ao envolvimento dos militares com o atentado terrorista no Distrito Federal, no dia 08 de Janeiro de 2023? O professor de Economia Política e Economia Brasileira, Eduardo Costa Pinto, ao discutir sobre a Extrema Direita, afirma que no interior das forças armadas residem posições políticas e ideológicas antagônicas, motivadas, obviamente, pela disputa do poder interno. Ademais, pela sistematização do pensamento do Politicamente Correto e o Marxismo Cultural. Ou seja, os Marxistas perceberam que não seria possível realizar a revolução clássica utilizando as armas, logo, a revolução seria de caráter cultural, a partir dos intelectuais orgânicos. Portanto, os pensadores intelectuais, sobretudo, a escola de Frankfurt, estariam criando um senso comum modificado. As pessoas estariam sendo modificadas por esses intelectuais orgânicos sem perceberem. Esse Senso Comum Modificado se dá através do professor universitário, da indústria midiática que apresenta um casal lgbt, de questões que vão contra os valores tradicionais, do movimento ambientalista, do movimento negro, isto é, qualquer movimento social que mude os valores tradicionais é considerado marxismo cultural ou politicamente correto. 

Não é atoa que o discurso de que a universidade é um lugar de balbúrdia, porque ali estariam os intelectuais orgânicos criando um senso comum modificado nos jovens, se consolida cada vez mais. Com isso, é possível perceber, que essa doutrina militar que está sendo criada é uma reatualização do discurso anticomunista observado anteriormente. E essa doutrina está impregnada na formação do militar brasileiro, sendo incluída no conteúdo das escolas militares. Contribuindo assim, para o pensamento de que o elo desenvolvido entre o Estado e os Civis da sociedade se amplie até o espaço interno das forças armadas, levando a alienação do presente oficial. Uma grande porcentagem dos oficiais são completamente Bolsonaristas — inimigos do marxismo cultural, inimigo do Comunismo e de tudo que “destrua” os valores tradicionais. Por conseguinte, esse ponto do Bolsonarismo com a questão militar tem haver com os discursos do movimento da Extrema Direita. 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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