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    Mario Vitor Santos

    Mario Vitor Santos é jornalista. É colunista do 247 e apresentador da TV 247. Foi ombudsman da Folha e do portal iG, secretário de Redação e diretor da Sucursal de Brasilia da Folha.

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    Golpe? Que golpe?

    "Desespero e paranóia não ajudam a esvaziar a farsa de Bolsonaro", escreve o jornalista Mario Vitor Santos

    Bolsonaro, fachada do STF e urna eletrônica (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino | STF | TRE)

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    Por Mario Vitor Santos

    O país vem sendo abastecido de notícias e análises segundo as quais o presidente Jair Bolsonaro prepara um golpe. Ao emitir, desde o primeiro dia de mandato, seguidas declarações de que o sistema eleitoral brasileiro é fraudado, o presidente na verdade já teria tomado um caminho sem volta. Quem diz que Bolsonaro dará um golpe tende a exagerar na dose e a descartar as dificuldades que essa opção traz e a fazer o jogo, que é o de ganhar no grito.

    A conferir:

    1) A ideia do golpe prejudica a candidatura Bolsonaro. Aceitar participar de uma eleição em que o próprio candidato diz não confiar é, além de contraditório, um tiro no pé em termos eleitorais. São duas campanhas excludentes, uma para convencer o eleitor a votar em você e outra para levá-lo a duvidar do sistema da eleição. Além de estimular a abstenção, há uma incoerência, que só seria resolvida se o candidato se retirasse da disputa, que diz ser  viciada, em lugar de legitimá-la com sua participação.Sempre se poderá dizer que Bolsonaro aceitou assumir o poder com o resultado das urnas de 2018 em que foi sagrado vencedor. Agora, quando está em desvantagem, vai virar a mesa? O momento ótimo dessa providência já passou por falta de condições. Agora, Bolsonaro só perde eleitores moderados ao questionar a votação.

    2) a candidatura Bolsonaro dificulta o golpe. Participar no vértice de todas as etapas de eleições tão gerais como as brasileiras implica mobilizar milhares de candidatos em todos os níveis. Envolve compromissos federais e com governadores em todos os 27 estados, o Distrito Federal e com outros candidatos aos governos estaduais, também com aqueles que concorrem ao terço do Senado ou às 513 vagas da Câmara Federal. O mesmo vale para as milhares de candidaturas às assembleias estaduais, sem falar dos partidos aliados, federados e coligados em todos os níveis. Cada uma dessas candidaturas é uma máquina social voltada para o resultado que depende das urnas eletrônicas. Vale perguntar: na existência de um golpe antifraude, vão ser anuladas ou interditadas as eleições e seus vencedores, inclusive os aliados do bolsonarismo, em todos os estados e níveis atestados pelas urnas eletrônicas? Ou só serão vetados os vencedores da oposição?

    3) a efetivação do golpe não tem apoio institucional interno e muito menos internacional. Também pelo que foi dito acima, um golpe em ano eleitoral, na proximidade do pleito, não terá apoio da Câmara (nem mesmo de Arthur Lira, o presidente da Casa, a julgar por suas declarações), do Senado (Rodrigo Pacheco já deixou claro) e menos ainda das instâncias da Justiça, a começar pelo Supremo Tribunal Federal e o próprio organizador da disputa, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Não que estes tribunais sejam defensores incondicionais da pureza eleitoral. Só não há interesse agora.

    Os meios de comunicação conservadores, como os do grupo Globo, diferentemente do que aconteceu em 1964 e 2016, manifestam-se agora unanimemente, com uma ou outra exceção, favoráveis ao sistema de votação e consideram que Bolsonaro mente e desestabiliza a democracia ao investir contra ele. 

    No plano internacional, não há qualquer indício de que um eventual golpe encontraria senão distância, frieza e até rejeição das potências e blocos, a começar pelos Estados Unidos. Envolvidos no passado nas conspirações contra João Goulart e Dilma Rousseff, os EUA agora, por conveniências eleitorais internas e geopolíticas, fazem questão de alardear seu respeito às urnas brasileiras e assim se afastar de Jair Bolsonaro. O presidente brasileiro é adversário, quase inimigo, do seu correspondente da Casa Branca, o democrata Joe Biden.  O brasileiro fez campanha pelo republicano Donald Trump, que se prepara para disputar de novo a presidência estadunidense. Há um certo paralelismo nos processos americano e brasileiro, sendo Bolsonaro um caudatário de Trump. Bolsonaro vai pressionar, mas se derrotado vai considerar a hipótese de repetir Trump e aguardar nova eleição.

    Imagina-se que o golpe aqui ocorreria por alguma fagulha na forma de conflito, rebelião ou uma provocação no processo de votação, ou mesmo por uma insurgência contra o resultado inaceitável das urnas para os bolsonaristas, maquiado na fantasiosa "sala secreta" que Bolsonaro diz existir no TSE.

    Nessa linha, o golpe tupiniquim poderia ser moldado na suposta tentativa de adeptos do trumpismo no episódio da invasão ao Capitólio. Mas aquela não foi uma tentativa séria de golpe, como os democratas e a mídia ocidental, totalmente alinhada a eles, procuram fazer crer. A invasão do Parlamento estadunidense foi uma aventura desarticulada e um protesto desastroso sem qualquer ambição de tomada do poder. Acusa-se Trump de engendrar esse assalto, mas nem ele seria capaz de tanta improvisação. Nem mesmo a suposta recusa dos militares americanos àquele "golpe" é digna de crédito. Nem lhes foi pedido o golpe, nem eles heroicamente negaram. 

    Fica a dúvida sobre a atitude dos militares brasileiros diante de um eventual chamado a um golpe de natureza continuísta contra as eleições, estes militares que já foram lançados atrapalhadamente no questionamento do sistema eleitoral. A resposta a essa questão é não. Apesar de sua índole golpista, o estamento militar não pode agir politicamente alheio e à margem das "regras da política".

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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