José Gregori, uma vida admirável
"Era um maravilhoso orador e uma pessoa ainda mais maravilhosa", diz Luiz Carlos Bresser-Pereira
Morreu ontem aos 92 anos um amigo de toda a vida, José Gregori. Ele era quatro anos mais velho do que eu, e eu o conheci na Faculdade de Direito, em 1953, eu no primeiro e ele no quinto ano fazendo na Sala do Estudante um grande discurso. Ele era um maravilhoso orador e uma pessoa ainda mais maravilhosa. Generoso e republicano, ele e sua mulher Maria Helena, punham sempre o interesse publico acima do seu interesse público. Estavam voltados para o bem do Brasil.
Voltei a ter contato com ele muito depois, em 1983, no governo democrático e iluminado de André Franco Montoro. Ele como deputado estadual e defensor das Diretas Já, eu como Secretário do Governo. Já nessa época ele, ao lado de Paulo Sérgio Pinheiro, assessor do governador, já surgiam como grandes defensores dos direitos humanos.
Éramos vizinhos em Ibiúna, a casa de Gregori muito perto da de Fernando Henrique. Encontrávamo-nos sempre lá. Em outubro de 1993, numa visita a Fernando Henrique, então ministro da Fazenda, sabendo que sua equipe estava preparando um plano de estabilização baseado na teoria da inflação inercial, disse a ele que esse plano seria bem-sucedido e ele seria o novo Presidente da República. José Gregori sempre lembrava dessa previsão.
Encontramo-nos novamente no governo Fernando Henrique Cardoso, ele como secretária nacional de Direitos Humanos (1997 a 2000) e ministro da Justiça (2000 a 2001). Como titular da pasta, chegou a trabalhar para viabilizar uma legislação batizada de Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito que substituiria a chamada Lei de Segurança Nacional (LSN). Ainda no governo Fernando Henrique foi embaixador em Portugal, e sempre me lembro de um memorável jantar em um restaurante de Lisboa.
José Gregori era um homem afável e confiável. Um ótimo amigo de seus amigos. Quando completou 85 anos, a comemoração na livraria Cultura do Conjunto Nacional foi em grande estilo. “Todo mundo” estava lá, porque era impossível não gostar e não respeitar este grande homem.
Em dezembro de 2018, com a vitória nas urnas de um candidato de extrema direita, nos reunimos, agora sob o comando de Paulo Sérgio Pinheiro, para fundar a Comissão em Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Arns. Sabíamos que os anos que se seguiriam seriam terríveis para os brasileiros no plano dos Direitos Humanos e para a democracia. A realidade infelizmente ultrapassou nossas previsões, mas agora tínhamos uma instituição de alto nível que, nos últimos quatro anos, fez tudo o que era possível para conter a barbárie. Embora não participasse das reuniões online, como eu também não tenho participado nos últimos tempos, José Gregori estava sempre presente na Comissão Arns. Juntamente com Margarida Genevois, presidente da Comissão de Justiça e Paz de dom Paulo e nossa presidente de honra, era Gregori uma inspiração para o nosso trabalho.
Aqui na Europa, onde estou agora para o casamento de uma neta, deixo aqui este meu testemunho de um homem cuja vida foi admirável.
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