Lula fez graves alertas ao mundo, mas um ponto novo foi a defesa da regulação digital
'Big Techs têm despertado preocupações em diversas frentes, incluindo privacidade e concorrência desleal', escreve a jornalista Tereza Cruvinel
Em seu discurso na ONU, o presidente Lula falou como líder do Sul global e dos emergentes, cobrando dos países ricos o enfrentamento de urgências como a reforma da governança global, a adoção de medidas mais efetivas contra a crise climática, esforços reais pela paz, combate à desigualdade, à pobreza e à fome, entre outras. De tudo isso ele já havia falado, com diferentes entonações, em outros fóruns internacionais. Um ponto realmente novo em sua fala foi a defesa da regulamentação do ambiente digital, notadamente das Big Techs e da Inteligência Artificial.
Nesta quarta-feira a semana de alto nível na ONU se encerra com a realização inédita de uma reunião do G20 em paralelo com a Assembleia Geral da ONU, uma iniciativa da presidência brasileira. E nela, a questão da regulamentação digital terá mais ênfase, não só no discurso de Lula. O Brasil deve apresentar uma proposta de compromissos neste sentido, a ser considerada por seus pares do G20, como ponto de partida para adesão de outras nações.
Em sua fala de ontem, Lula fez uma referência velada à polêmica envolvendo o X (antigo Twitter) no Brasil, defendendo o controle de empresas que “acham que não têm que observar as legislações dos países”.
Vale registrar também como novidade a apresentação de uma proposta concreta de reforma da ONU. O presidente propôs, além da sempre falada reforma do Conselho de Segurança, com inclusão de países da América Latina e da África, a transformação do Conselho Econômico e Social da ONU no principal fórum coordenador das medidas de combate ao aquecimento do planeta e favoráveis ao desenvolvimento sustentável. A questão climática, disse Lula cobrando mais empenho dos ricos e mais ajuda aos emergentes para enfrentá-la, não pode mais ser “desplanetizada”. Defendeu ainda a reativação da Comissão da Paz, hoje praticamente inativa, e o fortalecimento da Assembleia Geral como órgão decisório maior.
A regulamentação das Big Techs, que inclui gigantes como Google, Meta (Facebook), Amazon, Apple e Microsoft, é um desafio para todos os países exatamente por envolver interesses econômicos gigantescos.
Com seu imenso poder econômico, influência sobre a comunicação e o uso crescente de tecnologias como inteligência artificial, essas empresas têm despertado preocupações em diversas frentes, incluindo privacidade, concorrência desleal, manipulação de dados, a à democracia e controle de informações.
Agora mesmo, na campanha eleitoral, um candidato que é produto do mundo digital desgovernado, Pablo Marçal, vem tumultuando o processo, naturalizando a violência política e contribuindo fortemente para a descrença na democracia. O TRE de São Paulo e o Ministério Público Eleitoral já poderiam ter removido do processo este fator conturbador, nefasto à vida democrática.
Por outro lado, o Brasil acaba de dar um bom exemplo ao mundo ao banir a rede X do país, enquanto seu controlador não cumprisse ordens do STF para remover perfis criminosos e não tivesse representação legal em território nacional. Elon Musk piscou, depois de tripudiar sobre o Judiciário brasileiro, e agora está se ajustando às exigências do ministro Alexandre de Morais. Mostramos a ele que este é um país soberano e não a casa de Mãe Joana, como disse Lula em outras palavras.
Isoladamente, entretanto, nenhum país será vitorioso contra o polvo digital, e o Brasil sabe disso. No âmbito do G20, o governo Lula insistirá nisso, propondo compromissos com uma regulação digital que também não pode ser desplanetizada.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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