Lula não é Boulos, Bolsonaro não é Nunes
"A culpa é sempre dos eleitores ou dos marqueteiros", escreve Alex Solnik
A culpa é sempre dos outros.
“Pedrinho, por que você tirou zero na prova?”
"Porque a professora é racista”.
“Por que seu time perdeu?”
“Você não viu? Eles compraram o juiz!”
“Por que você foi condenado pelo 8/1?”
“Porque o Xandão não foi com a minha cara”.
Na política não podia ser diferente. Os “especialistas” em política e marketing estão atordoados com o que acontece em São Paulo. O candidato a prefeito de Jair Bolsonaro não recebe nem metade das intenções de voto de quem costuma votar em Bolsonaro. O mesmo acontece com o candidato de Lula. E olha que o primeiro é o maior líder da direita e o outro, o maior líder da esquerda.
Já trabalhei em campanhas eleitorais, numa situação como essa a pressão sobre os marqueteiros chega às raias do insuportável (assédio moral não traduz o clima) e os marqueteiros, em vez de tentar encontrar uma solução, procuram uma resposta.
E a resposta é: os eleitores ainda não sabem que Nunes é o candidato de Bolsonaro. Nem que Boulos é o candidato de Lula. Mas nós vamos continuar martelando até que isso entre na cabeça do eleitor, que é um ignorante, no mínimo. Um cabeça-dura.
A culpa é do eleitor!
Os políticos até aceitam essa explicação dos marqueteiros com os quais gastam os tubos, mas põem a culpa neles, que não conseguem colocar essa coisa tão simples na cabeça do coitado do eleitor. Puxa, todo mundo vê que Lula é Boulos e Bolsonaro é Nunes, ora bolas!
A culpa é do marqueteiro!
Aí você se coloca na cabeça do eleitor de Bolsonaro.
O partido dele é o PL, número 22. O partido de Nunes é o MDB, 15.
Ele procura na lista de candidatos a prefeito o número 22. Não tem. O PL. Não tem.
Bolsonaro é um cara estridente e radical. Nunes é um cara discreto e moderado.
Bolsonaro é evangélico, Nunes é católico.
Bolsonaro é contra as vacinas, Nunes é a favor.
O MDB, partido de Nunes, liderou o combate à ditadura militar e aos torturadores.
Bolsonaro é o tiete número 1 da ditadura militar e dos torturadores.
Ah, mas o vice de Nunes, aí sim, é do PL e seu número é 22. E o eleitor pensa: vice não manda em coisa alguma, se Bolsonaro não vai mandar na prefeitura, então por que diabos vou votar nele?
Ponha-se agora na cabeça do eleitor de Lula. O partido dele é o PT, número 13. O partido de Boulos é o PSOL, 50.
Ele procura na lista de candidatos a prefeito o número 13. Não tem. O PT. Não tem.
Lula é um cara moderado de esquerda que se aliou à direita para vencer em 2022.
Boulos, que sempre esteve à esquerda de Lula, aliou-se à esquerda moderada para tentar vencer em São Paulo.
Lula fez fama por liderar as maiores greves operárias que enfraqueceram a ditadura militar. Boulos fez fama por liderar movimentos de moradia que preconizavam a ocupação de imóveis desabitados.
Lula elegeu Dilma Rousseff.
Boulos fez campanha contra Dilma por promover a Copa do Mundo de 2014.
Lula fundou o PT. Boulos é do PSOL, uma dissidência do PT que nasceu por discordar de Lula. Rival, portanto, do PT.
Ah, mas a vice é do PT! Quer dizer então, pensa o eleitor de Lula, que não é o PT quem vai mandar, não vai ser Lula. O PT estará a reboque do PSOL de Boulos. Então por que, diabos, pensa o eleitor de Lula, vou votar em Boulos?
O eleitor de Bolsonaro olha a cara de Nunes e conclui que um não tem nada a ver com o outro. Olha o seu passado e conclui que nem eles, nem seus partidos têm alguma coisa a ver com o outro.
O eleitor de Lula olha a cara de Boulos e conclui que eles têm apenas uma coisa em comum: a barba. Se bem que uma ainda preta, e outra branca.
O eleitor de Bolsonaro não se reconhece em Nunes.
O eleitor de Lula não se reconhece em Boulos.
O eleitor de Bolsonaro que não se reconhece em Nunes já encontrou outro candidato mais parecido com Bolsonaro.
O eleitor de Lula que não se reconhece em Boulos não tem outra opção.
Mas a culpa, em caso de derrota, será dos eleitores. Ou dos marqueteiros.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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