Não aguentamos, Argentina!
"É difícil aceitar uma Argentina que rejeita sua cultura, seu cinema, sua literatura, sua música", escreve Emir Sader
É insuportável, para nós que não somos argentinos, mas que amamos tanto a Argentina e os argentinos, os sentimentos que vivenciamos. É insuportável viver em um país como a Argentina, nas mãos de pessoas que não amam a Argentina, que a desprezam junto ao que há de melhor nela. Comem a comida argentina como quem engole um comprimido, desconhecem o cinema argentino e o desprezam.
É insuportável ver um país tão solidário ter Israel e os Estados Unidos como únicos aliados, sem se preocupar, pelo contrário, com o massacre dos palestinos, de seus filhos, de suas mães. É impossível ver a Argentina de costas para a América Latina, distante da integração latino-americana, do Brasil, do México, da Colômbia, da Bolívia, do Uruguai, da Venezuela. É triste ver o governo argentino entregue a si mesmo, longe dos problemas de outros países do mundo.
É difícil aceitar uma Argentina que rejeita sua cultura, seu cinema, sua literatura, sua música, todos os seus meios de comunicação, todas as suas artes, tudo o que lhe dá sua identidade. Parece uma Argentina da qual tiraram a alma, o espírito. Parece que outros povos, que nada têm a ver com a Argentina, se apoderaram do país, de sua história, de sua cultura, de seu povo. Parece que, se você voltar a Buenos Aires, conhecerá outras pessoas, ouvirá outras conversas, encontrará outros livros nas livrarias, verá outras pessoas circulando pelas ruas, com outro jeito de ser, de falar, de cumprimentar, de abraçar.
Como se as melhores livrarias que você conhece não existissem mais, os melhores lugares para comer carne, caminhar pelas ruas, circular pelas avenidas, tomar café, comer pizza, empanadas. Não aguentamos mais não ter um país irmão querido para o qual sempre queremos viajar, que nos receba com carinho, com alegria. Um país mesmo ao lado, próximo, acolhedor.
É como se gente estranha, estrangeira, tivesse tomado conta do país e feito dele outro país, um país estranho, que não reconhecemos e que não nos reconhece. É impossível imaginar uma Argentina diferente daquela que conhecemos há tanto tempo, para onde sempre viajamos. Uma América Latina sem a Argentina, com um governo que não se reconhece como latino-americano.
É impossível continuar convivendo com esse país estranho, alheio a si mesmo, que não sabe até que ponto coexistirá com esse governo, que não tem nada de argentino, que rejeita tudo o que é argentino. Quase como se me recusasse a chamar este país com o mesmo nome, com a mesma bandeira, com os mesmos escritores queridos, com aquela história extraordinária. A Argentina está de volta, precisamos muito de você, não podemos viver sem você. Não aguentamos mais.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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