O círculo vicioso da opinião publicada
"Essa abordagem beira a desonestidade intelectual", avalia Oliveiros Marques
Martele por dias seguidos uma notícia dizendo que o mundo vai acabar e, depois de um tempo – que nem precisa ser tão longo –, pergunte às pessoas se elas acham que o fim do mundo está próximo. A maioria, sem dúvida, responderá que sim, que o Armagedom está chegando.
Foi mais ou menos isso que a Folha de S.Paulo fez com o seu instituto de pesquisa, o Datafolha, no levantamento divulgado no dia 1º deste ano. Segundo essa pesquisa, realizada em dezembro do ano passado, 61% dos brasileiros consideram que a economia está no caminho errado.
A imprensa, incluindo a própria Folha, passou dias e dias, antes da realização do campo dessa pesquisa, noticiando a desvalorização do real sem tratar o movimento como deveria ser interpretado: um ataque especulativo. As manchetes, especialmente as dos telejornais, replicadas acriticamente por rádios em todos os cantos do país, seguiram a mesma narrativa.
Portanto, não é que as pessoas não percebam os sinais positivos da economia, como inflação controlada, desemprego em queda, melhor distribuição de renda, crescimento do PIB acima do esperado, aumento das vendas no varejo, entre outros. O problema é que, se faço uma pergunta fechada sobre expectativas em um momento em que as pessoas estão sendo bombardeadas por notícias sobre a alta do dólar e seu impacto negativo na economia, mesmo que nunca tenham visto uma cédula da moeda americana, elas responderão, de forma objetiva, que as coisas não vão bem.
Sinceramente, essa abordagem beira a desonestidade intelectual, tanto na formulação da pergunta quanto nas análises subsequentes. É o tipo de questão feita para criar uma manchete sensacionalista e alimentar um debate enviesado, mas que pouco contribui para entender de fato o que as pessoas pensam sobre o momento econômico do país e como enxergam sua vida nesse cenário.
Esse tipo de erro não é novo e já ocorreu com outros temas e em diferentes momentos. Para não acharem que meu comentário possui viés, é o mesmo que considerar absoluta uma pesquisa sobre o apoio à democracia após semanas de matérias sobre as condenações dos golpistas de 8 de janeiro.
Estudos como esses podem medir a força da opinião publicada e o impacto que ela exerce nas respostas das pessoas, reforçando a necessidade de um contraponto para evitar a cristalização de opiniões em um ciclo vicioso. Talvez esse seja, de fato, o objetivo da publicação: trabalhar para que essa visão se consolide como “a verdade”. No entanto, tais estudos estão muito distantes de refletir, de forma fidedigna, o que a população realmente pensa sobre a economia e, menos ainda, sobre o futuro.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com redacao@brasil247.com.br.
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: