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    Moisés Mendes

    Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.

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    O horror desembarca em Gramado

    "O solo abre fendas numa das regiões mais belas do Brasil, cada vez mais degradada pela ganância da ocupação desordenada", escreve Moisés Mendes

    (Foto: Bruno Stoltz/Prefeitura de Gramado)

    A terra está rachando e engolindo casas e edifícios em Gramado. A Serra gaúcha enfrenta o medo e também o humor cruel em torno do estigma que acabou criando pelo excesso de empreendedorismo.

    Dissemina-se pela internet um aviso segundo o qual é preciso correr para ver o pavor de perto e de graça, antes que passem a cobrar ingresso. Porque tudo vira negócio na Serra gaúcha.

    As interrogações sobre as causas do fenômeno acionam questões de fundo. Falhas geológicas, chuvaradas e ocupação desenfreada podem explicar o que acontece, como se algumas áreas tivessem enfrentado um terremoto.

    Mas Gramado, uma das paisagens mais belas do Brasil, sairá ilesa das rachaduras no chão, mesmo com explicações técnicas que anistiem ou atenuem seus crimes?

    A questão de fundo é a encoberta pelos silêncios em torno da exploração predatória da Serra. Gramado e Canela, as cidades gêmeas, talvez não aguentem mais tanta ocupação, com os danos decorrentes da degradação ambiental.

    Corre em Canela, há mais de dois anos, uma investigação sobre quadrilhas envolvidas na concessão de licenças ambientais. Polícia e Ministério Público também investigam corrupção na área da promoção de eventos.

    É o que chamam de Operação Caritas, que caça criminosos em várias frentes. Há conluios de gente da prefeitura (já prenderam dois secretários), grandes empresários e a delinquência miúda que sempre se acomoda no entorno dos bandidos graúdos.

    Era fácil obter licenças ambientais para ocupação de áreas na Serra, com a ajuda de servidores municipais organizados como intermediários.

    Fácil para os endinheirados que furavam filas e protocolos. Uma barbada para empreendedores de extrema direita com parceiros nos governos, incluindo o poder nacional sob controle do fascismo.

    Gramado e Canela foram desfiguradas até pela imitação do que seria um lugar com raízes alemãs. Imitam a própria arquitetura da região, muitas vezes em cópias bizarras.

    A região se esforça para ficar feia. Há dois anos, uma das principais atrações de Canela é a réplica da Estátua da Liberdade de uma loja da Havan, erguida apesar da resistência de moradores, urbanistas, ambientalistas e lideranças.

    Turistas antes atraídos pelas virtudes da natureza, pela gastronomia e pelas festas da Serra, como o Natal Luz e o Festival de Cinema, agora visitam a região para conhecer a estátua de plástico do véio da Havan.

    Famílias tiram mais fotos ao pé da estátua grotesca do que na Cascata do Caracol. Grupos saem em enxame da Havan e vão para o outro lado da avenida que liga Gramado e Canela e fazem pose ao lado da réplica de um foguete da Nasa.

    Daqui a alguns meses terão uma roda gigante de 52 metros de altura, num complexo turístico que custará mais de R$ 50 milhões.

    Investimentos milionários são erguidos num ano e quebram no outro. Quem nasceu e se criou na região pede de volta a vida sem pressa e sem tanta ganância.

    A Serra gaúcha do chão rachado é uma das expressões da aceleração e da radicalização do empreendedorismo sem limites de tempos bolsonaristas. Na eleição do ano passado, Bolsonaro teve 74,83% dos votos de Gramado.

    A ocupação predatória acontece sob o silêncio da grande imprensa, que agora desloca suas equipes para examinar os buracos abertos no chão de encostas depenadas.

    O Estadão, jornal inventor de damas do tráfico, poderia aparecer na Serra para saber, sempre pensando em negócios, se não sairão duendes das fendas de Gramado, onde tudo se vende e tudo se compra. 

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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