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    Pablo Nacer

    Jornalista, autor do livro Meu Avô A´uwê - sobre três viagens a uma aldeia indígena xavante - e ex-Brasil 247, atualmente vive na Austrália

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    O senhor da guerra não gosta de crianças

    O que explica a canção do senhor da guerra, de Renato Russo, ser tão atual passados 32 anos? Cui bono, bebê! É só olhar quem lucra com a porra toda

    Renato Russo (Foto: Divulgação)

    Publicado originalmente no Blog do Pablito

    “Mais uma guerra sem razão
    E já são tantas as crianças com arma na mão
    Mas explicam novamente que a guerra gera empregos
    E aumenta a produção
    Uma guerra sempre avança a tecnologia
    Mesmo sendo guerra santa, quente, morna ou fria
    Pra que exportar comida
    Se as armas dão mais lucros na exportação?

    O que explica A canção do senhor da guerra, gravada por Renato Russo há 32 anos, ser tão atual?

    O ex-presidente uruguaio Pepe Mujica disse, certa vez, que quando se chega ao poder, o presidente do país senta-se apenas na ponta da cadeira, pois o restante já está ocupado.

    Os ocupantes a que Mujica refere-se é o tal do Estado Profundo, aquele que entra governo, sai governo, está sempre no poder. A ideia de que há grandes diferenças entre a pessoa apontada pelo Partido Democrata e pelo Partido Republicano para concorrer à Casa Branca, por exemplo, é pura ilusão, pois, no final das contas, quem realmente governa é o famoso Cui bono. Que, em carioquês livre, podemos traduzir como:

    Quem lucra com a porra toda?

    A resposta é simples: o senhor ou a senhora da guerra, no caso do Partido Republicano, ou senhore da guerra, no caso do Partido Democrata.

    Desenhando:

    acoes-lockheed-martin
    Ações da Lockheed Martin(Photo: Mona Chalabi)Mona Chalabi

     O gráfico acima das ações da Lockheed Martin, a maior produtora de armas do mundo e fabricante da aeronave F-35 (guarda esse nome), que Israel usa em seus bombardeios regulares a Gaza, obteve um retorno total de 54,86% no ano seguinte aos ataques de 7 de outubro de 2023, superando o S&P 500 em cerca de 18% ao fechamento do pregão em 4 de outubro deste ano, de acordo com a Responsible Statecraft.

    Nos EUA, corporações e sindicatos são proibidos de contribuir diretamente para candidatos à presidência. No entanto, doações individuais de membros, empregados ou proprietários da organização, bem como dos familiares diretos desses indivíduos, é a brecha encontrada para que as grandes corporações despejem milhões de dólares a cada quatro anos.

    Segundo a OpenSecrets, em 2020, do total de $7,327,230 investidos doados pela Lockheed Martin entre candidatos ao Congresso, comitês eleitorais e, indiretamente, aos dois postulantes à Casa Branca, $542,134 foi investido doado a Donald Trump e $484,518 a Joe Biden.

    Na atual corrida, do total de $4,237,708, $264,601 foi investido doado a Kamala Harris e $129,676 a Donald Trump.

    Relatório divulgado nesta quinta-feira (10) pela Comissão Internacional Independente de Inquérito da ONU sobre o Território Palestino Ocupado, incluindo Jerusalém Oriental e Israel, concluiu que os ataques de Israel a instalações de saúde em Gaza e o tratamento de detentos e reféns constituem crimes de guerra e crimes contra a humanidade.

    “Israel tem implementado uma política deliberada para destruir o sistema de saúde de Gaza como parte de um ataque mais amplo à região, cometendo crimes de guerra e crimes contra a humanidade. O relatório destaca ataques constantes e intencionais contra profissionais de saúde e instalações médicas em Gaza (…). Os ataques a instalações médicas em Gaza, especialmente as voltadas para o cuidado pediátrico e neonatal, causaram sofrimento incalculável a crianças, incluindo recém-nascidos. O relatório afirma que, ao continuar esses ataques, Israel violou o direito à vida das crianças, negou-lhes acesso a cuidados básicos de saúde e criou condições de vida que podem resultar na destruição de gerações de crianças palestinas e, potencialmente, do povo palestino como um grupo”, diz a Comissão da ONU.

    Ao investir pouco mais de 100% em Kamala em relação a Trump, parece que a Lockheed Martin está bem feliz com o Partido Democrata no poder e o horror descrito pela ONU. Mas, conforme vimos com os investimentos nas últimas duas campanhas, também estaria de boas com um eventual retorno de Trump.

    Outra empresa que não esconde a felicidade é a Raytheon, a segunda maior produtora de armas, que fornece bombas “bunker buster” para Israel. Essas são aquelas armas proibidas para uso em áreas com alta densidade populacional, mas que Benjamin Netanyahu tem usado repetidamente em áreas densamente povoadas, tanto em Gaza quanto no Líbano. O retorno total da Raytheon para os investidores no último ano, também de acordo com a Responsible Statecraft, foi de 82,69%, superando o S&P 500 em cerca de 46%. No atual pleito, o investimento dos “indivíduos” da Raytheon é de $244,201 em Kamala Harris e $127,695 em Donald Trump.

    Voltando a Lockheed Martin, a maioria dos negócios da empresa, segundo a própria, é com o Departamento de Defesa dos EUA e com agências do governo federal dos EUA. Para isso, eles contam com mais de 350 instalações e 13.300 fornecedores em todos os estados norte-americanos e em mais de 50 países.

    Um desses países é a Holanda, que em fevereiro viu a Oxfam Novib, juntamente com as organizações PAX e Rights Forum, ganharem uma ação judicial contra o país por exportar armas para Israel que são utilizadas em Gaza. O Tribunal dos Países Baixos ordenou que Amsterdam deixasse de fornecer peças do caça F-35 a Israel no prazo de sete dias, devido ao risco evidente de graves violações do direito humanitário internacional. Risco esse que, como vimos acima, é realidade. Com base em relatórios da Anistia Internacional e da ONU, o juiz concluiu, em FEVEREIRO, que muitos civis, incluindo crianças, são alvo de ataques.

    A Austrália, claro, está nesse balaio. A Lockheed Martin, com cerca de 70 fornecedores australianos, fabrica o caça F-35. Se o país realmente respeita as Convenções de Genebra, o Tratado de Comércio de Armas Convencionais e acredita na balela propagandeada pelos Estados Unidos da tal “ordem internacional baseada em regras”, poderia imediatamente parar de fornecer caças F-35 aos senhores da guerra para impedir a matança indiscriminada de crianças palestinas, libanesas, sírias, iemenitas…

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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