Pegou mal demais, Armínio
Déficit fiscal brasileiro é consequência direta da altíssima taxa de juros – e não do salário mínimo
A fala de Armínio Fraga durante a Brazil Conference, em Harvard, não foi apenas infeliz. Foi sintomática de uma visão de mundo que se recusa a enxergar o Brasil real. Ao propor o congelamento do salário mínimo em termos reais por seis anos, o financista escancarou a desconexão de parte da elite econômica brasileira com a dinâmica social do país. Não faltou retórica, mas a proposta em si revelou um projeto de país onde a austeridade segue sendo aplicada de forma seletiva: aos de baixo, o arrocho; aos de cima, blindagem.
O problema fiscal brasileiro, como sabem até os iniciados no debate econômico, está diretamente associado à taxa básica de juros, uma das mais altas do planeta. Cada ponto percentual da Selic representa dezenas de bilhões de reais a mais transferidos para os rentistas, em um sistema que alimenta a concentração de renda e drena recursos do Estado. Frente a esse cenário, atacar o salário mínimo como o vilão do orçamento é não apenas incorreto do ponto de vista técnico, mas profundamente revelador do viés ideológico de quem faz essa defesa.
Valorizar o salário mínimo não é uma extravagância populista. É uma política que gera consumo, movimenta a economia local, reduz desigualdades e garante o mínimo de dignidade para milhões de brasileiros. Em um país com a desigualdade estrutural do Brasil, essa valorização deveria ser um consenso, e não alvo de propostas de congelamento vindas justamente daqueles que jamais experimentaram qualquer dificuldade financeira.
Um país menos desigual deveria interessar a todos – inclusive aos bilionários. Uma sociedade com maior inclusão social é também mais segura, mais estável e mais justa. Com menos muros, menos carros blindados, menos medo. É também mais meritocrática, como tantos do topo gostam de afirmar, mas raramente se dispõem a construir. Porque meritocracia verdadeira só é possível quando todos partem, minimamente, de uma linha de largada semelhante. E isso exige redistribuição de riquezas e oportunidades.
A fala de Armínio Fraga não apenas desconsidera essa realidade. Ela a rejeita. E, ao fazer isso, não contribui com soluções, mas com a perpetuação de um modelo que serve a poucos e fracassa para muitos. O Brasil precisa de um pacto nacional pelo combate à desigualdade. E isso passa, necessariamente, por valorizar o trabalho.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com redacao@brasil247.com.br.
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: