Por que fazer um livro sobre os 10 anos da Lava Jato? E por que chamar de desestabilização do Brasil?
'No resumo das perseguições a pessoas, empresas e símbolos políticos e sociais, a principal história a ser contada é a dos trabalhadores', diz Carol Proner
Após sair do BNDES, onde trabalhei por um ano como Assessora para assuntos internacionais, expliquei ao Presidente Aloizio Mercadante, por quem tenho imensa admiração, que precisava de tempo para fazer algumas coisas que ficaram pendentes, como registrar o delírio vivido por setores do sistema de justiça e da mídia brasileira na farsa da Operação Lava Jato. Lembrando que em 2024 a Operação completou 10 anos do que chamamos no título “A desestabilização do Brasil”.
Telefonei para a Professora Gisele Cittadino, com quem tenho amizade e parceria de longa data, e perguntei se ela toparia mais uma empreitada. Desta vez, registrar os 10 anos da Lava Jato em uma coletânea que pudesse reunir alguns intelectuais, jornalistas, economistas, cientistas políticos e os principais nomes do direito dispostos a rememorar a fatídica década.
Gisele topou imediatamente, o que significaria ao menos dois meses de nossas vidas dedicados completamente, um árduo trabalho para conceber a proposta, convidar autores, receber artigos e revisá-los, tratar junto à editora e planejar os lançamentos. É bem verdade que nós já estamos acostumadas a convocar coletâneas de livros de resistência. Assim fizemos com a “Resistência ao Golpe de 2016” e com o livro “Comentários a uma Sentença Anunciada”, ambos livros com mais de uma centena de autores. Mas este livro surpreendeu porque, em poucos dias, passamos a receber mensagens entusiasmadas de pessoas desejando registrar algum episódio, um fato específico, alguma indignação e muitos desabafos.
Percebemos que o livro serviria para registrar episódios marcantes da maior farsa jurídica do país, mas também para desafogar mágoas, episódios sumamente revoltantes, casos escandalosos, enfim, em último caso para servir de alerta a respeito do que pode ocorrer quando o próprio sistema de justiça perde o rumo e se corrompe.
E percebemos que, no resumo das perseguições emblemáticas a pessoas, empresas e símbolos políticos e sociais, a principal história a ser contada era a dos trabalhadores. Eis que entram as Centrais Sindicais, por meio da articulação do Clemente Ganz Lúcio, que imediatamente aceitam apresentar o livro. Este é o fato mais impressionante deste livro, ser apresentado pelas 6 maiores Centrais Sindicais do país – nomeadamente a Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Força Sindical, a Nova Central (NCST), e a União Geral dos Trabalhadores (UGT) – em uma carta de abertura que tem como título “Lava Jato, a devastação do Brasil: o combate à corrupção não pode destruir a economia e a democracia”.
Isso foi realmente surpreendente. Eu não sei se, mesmo no nosso campo, nós temos a dimensão do que significa uma mensagem como essa unificada pela representação sindical brasileira. Nossa recomendação, se alguém estiver muito ocupado para ler as 560 páginas e artigos de mais de 100 autores, recomendamos que leiam apenas a apresentação das Centrais, pois resume em duas páginas um aprendizado coletivo: “o combate à corrupção tem por objetivo proteger o Estado, o sistema produtivo, a capacidade empreendedora, os empregos e a renda do trabalho, fortalecer a democracia e suas instituições”.
Desde o início da Operação Lava Jato, em 2014, os sindicalistas alertavam que esta deveria se concentrar em investigar as denúncias e punir os culpados, sem, com isso, destruir as empresas e, consequentemente, os empregos e a economia. Estratégia largamente utilizada com sucesso pelos países que têm política de combate à corrupção.
As trágicas consequências foram em parte mensuradas pelos levantamentos do DIEESE que, em 2021, revelaram crise sem precedente na cadeia produtiva do petróleo e gás, desinvestimento de bilhões e milhares de empregos perdidos. Aliás, fizemos questão de abrir o livro com o artigo do Fausto Augusto Júnior, diretor técnico do Dieese, e do Leandro Horie, economista e assessor da direção nacional da CUT, no qual atualizam as consequências não apenas imediatas, mas também aspectos que nem sempre ficaram evidentes nos estudos de natureza mais quantitativa, mas que afetam até hoje a economia, a sociedade e as localidades brasileiras.
Como dizem os presidentes das Centrais Sindicais, talvez um dia a história revele quais foram todos os interesses escusos que presidiram as estratégias dessa Operação e a quem interessava destruir nosso sistema produtivo, os empregos e a renda do trabalho, partidos políticos e lideranças.
Enquanto isso, convidamos à leitura do que pode ser considerada uma reação coletiva para que prevaleça a memória e a verdade diante da inercial vontade de esquecimento que permanece em setores do poder judiciário brasileiro.
Boa leitura!
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