Por que só agora pegaram o filho do prefeito?
“A direita sempre recebe tratamento especial, para que não tenha seus crimes expostos durante a disputa eleitoral”, escreve o colunista Moisés Mendes
O prefeito reeleito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), sustentou sua campanha eleitoral em mensagens moralistas, sempre dentro do modelo bolsonarista que exalta Deus, a pátria e a família.
Menos de um mês depois da eleição, seu filho, o vereador Pablo Melo, teve a casa e o gabinete visitados pela polícia. Fizeram busca e apreensão nos endereços do vereador nessa quarta-feira.
Estavam atrás de provas do envolvimento dele na intermediação de operações de desvio de verbas na Secretaria de Educação do município. O filho do prefeito seria o contato da estrutura criminosa da secretaria com fornecedores de material didático para as escolas.
São crimes que envolvem uma facção organizada de servidores públicos e mais de 10 empresários. As investigações levaram, no início do ano, à prisão da então secretária Sonia Rosa. As fraudes na compra de material passam de R$ 100 milhões.
É natural que se pergunte se essa seria uma pauta gaúcha, que interessaria apenas a Porto Alegre ou aos moradores do Rio Grande do Sul. Não é.
É a pauta sobre como, em todo o Brasil, o tempo da caçada a criminosos é contaminado pelo tempo da política. Desde que os investigados sejam da direita.
Por que o filho do prefeito, agora afastado do mandato por 180 dias por ordem da Justiça, não foi alcançado bem antes do início da campanha, se esse caso é investigado há um ano e meio e envolve suspeitas de licitação fraudulenta, lavagem de dinheiro, associação criminosa e corrupção ativa e passiva? Por que só agora?
Por que, como acontece com o caso da máfia das creches de São Paulo, nada evolui no sistema de Justiça às vésperas das disputas políticas de uma eleição, se os investigados forem de direita?
Por que outros casos sob investigação na prefeitura de Porto Alegre, na área da saúde e no Departamento Municipal de Águas e Esgotos (Dmae), hibernam durante disputas eleitorais?
Outra pergunta: por que sumiram, durante meses, as informações sobre o pagamento de propinas por fornecedores a diretores do Dmae? Há provas, pelos próprios pagadores, de que prestavam serviços em troca de caixinha mensal e sistemática.
Por que um caso escabroso, denunciado por gente de dentro da prefeitura, envolvendo a tentativa de repasse de R$ 1,7 milhão do Dmae a uma loja da Havan, na zona norte de Porto Alegre, deixou de ser pauta?
É um caso escondido e quase nunca abordado pela grande imprensa, mesmo que existam sindicâncias há pelo menos dois anos no Tribunal de Contas do Estado e no Ministério Público sobre o plano de liberação do dinheiro do Dmae. O mesmo Dmae que dizia não ter recursos para reduzir os danos da cheia desse ano.
Um dinheiro que seria liberado para a Havan a pretexto de mitigação de danos ambientais, no entorno da obra da própria empresa. Um caso único em que o município pagaria pelos danos ao redor de obras de uma empresa privada. O silêncio sobre o caso seria causado pelo temor de abordar questões envolvendo o nome do autoproclamado véio da Havan?
É um cenário de suspeitas de crimes por todos os lados. Parece improvável que alguém diga agora por que Pablo Melo foi poupado da busca e apreensão antes da eleição e por que as pedaladas na casa e no gabinete aconteceram só agora, 17 dias depois do segundo turno.
Mas a pergunta deve ser feita, para que o momento e as circunstâncias das buscas da polícia nas moradias e nos locais de trabalho de alguns investigados, só depois da eleição, não sejam vistos como normais.
Os paulistanos podem fazer a mesma interrogação: por que as polícias, mesmo a Federal, que investiga os vampiros das creches, e o Ministério Público seguram decisões, muito antes das eleições, sempre que os casos envolvem gente da direita?
Operações policiais e inquéritos que dependem de deliberação do Ministério Público terão de ser desovados. Passada a eleição, que funcionou como escudo para gente ligada ao bolsonarismo, que investigações e processos sigam em frente.
Que deixem de ser represados e avancem, em nome não da pátria e de Deus, mas do nosso direito de ver julgamentos, condenações e reparações.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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