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      Ramatis Jacino

      Doutor em História Econômica pela FFLCH/USP e professor da Universidade Federal do ABC

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      Povo negro vivo: pelo fim do apartheid em São Paulo

      Foi a primeira de várias manifestações que virão, pois, assim como o regime racista da África do Sul, a política da morte do governo de São Paulo será derrotada

      (Foto: Reprodução)

      Por Ramatis Jacino e Cláudio Aparecido da Silva (professor de Ensino Básico e ex-Ouvidor das Polícias do Estado de São Paulo)

      O Dia vinte e um de março foi instituído pela ONU, em 1996, como o Dia Internacional de Luta Contra a Discriminação Racial. A data faz referência ao Massacre de Sharpeville, ocorrido em 1960, quando sob o regime do apartheid, a Polícia Sul-Africana (SAP), espécie de Força Nacional local à época, assassinou 69 pessoas que se manifestavam pacificamente contra o regime segregacionista.

      Em São Paulo, o dia 21 de março desse ano ficará marcado pelo ressurgimento do movimento negro autêntico e de luta, materializado na Frente Povo Negro Vivo que protagonizou manifestação histórica em frente a Secretaria de Segurança Pública. O ato reuniu ativistas de várias gerações e comunidades, de inúmeras correntes políticas e confissões religiosas que denunciam o verdadeiro genocídio em curso no estado de São Paulo contra a juventude e a população negra e periférica em geral.

      A escolha da data não foi por acaso. A maneira como o governo do estado trata a população pobre e periférica se assemelha a política do apartheid. Segundo notícia publicada pela UOL, em 01/02/2025, policiais militares e civis de São Paulo mataram 814 pessoas em 2024, número que representa aumento de 61,51% em relação a 2023, quando foram registradas 504 mortes resultantes de ação policial. Os dados da Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo informam que quase 80% dessas pessoas são negras e aproximadamente 40% adolescentes ou crianças.

      Tarcísio de Freitas tem no seu histórico proximidade com a violência institucional contra a população civil, majoritariamente negra. Quando capitão e engenheiro do exército trabalhou sob o comando do general Augusto Heleno na Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti - Minustah, de 2003 a 2006. Heleno, que hoje é réu em processo no STF, apontado como um dos líderes da tentativa de golpe de Estado, na ocasião foi afastado do cargo pelo presidente Lula porque suas tropas mataram 63 pessoas em operação na comunidade Cité Soleil, maior favela de Porto Príncipe, capital daquele país. Guilherme Derrite, preposto de Tarcísio de Freitas na segurança pública, segundo a revista Piauí de 03/05/2024, quando tenente da ROTA foi investigado por 16 homicídios e afastado daquele batalhão por excesso de letalidade, admitida por ele próprio que em entrevista no Youtube, em 2021, admitiu sua exclusão “Porque eu matei muito ladrão”.

      Trata-se, portanto, de uma orientação política que defende a morte e o terror de Estado com evidente recorte geográfico e racial, explicitada pelo governador, quando ao ser questionado acerca dos abusos na “Operação Verão”, realizada na Baixada Santista em dezembro de 2023 e a provável denúncia aos órgãos de controle, desdenhou das dezenas de mortes declarando em alto e bom som “Pode ir na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta, que não tô nem aí”. O tratamento discriminatório com a população pobre fica evidente, ainda, na declaração de um dos seus principais aliados, o vice-prefeito da Capital, o tenente-coronel Mello Araújo, de que as abordagens da polícia nos bairros nobres deveriam ser diferentes da maneira como se aborda nas periferias.

      O aumento exponencial da letalidade e da violência sistêmica das polícias de São Paulo não é resultado de “excessos” de um ou outro agente, menos ainda se tratam de casos isolados. Significa uma exacerbação deliberada da violência histórica praticada pelo Estado brasileiro contra a população negra.

      Foi em legítima defesa, portanto, que 110 organizações representativas da população negra, com apoio do deputado Eduardo Suplicy, do PT, e da bancada Coletiva Feminista do PSOL, protocolaram nesse mesmo dia um pedido de impeachment do governador e seguem defendendo a imediata exoneração do Secretário de Segurança.

      Essa foi a primeira de várias manifestações que virão, pois, assim como o regime racista da África do Sul, a política da morte do governo de São Paulo certamente será derrotada. Inspirados nos mártires de Sharpeville, que no dia 21 celebramos, e seguindo o exemplo de Steve Biko, Desmond Tutu, Winnie e Nelson Mandela, derrotaremos o novo apartheid que foi implementado no estado de São Paulo, também em memória do pequeno Ryan, dos 84 mortos nas Operações Escudo e Verão, de Marco Aurélio Cardenas Acosta e tantos outros.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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