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    Gilvandro Filho

    Jornalista e compositor/letrista, tendo passado por veículos como Jornal do Commercio, O Globo e Jornal do Brasil, pela revista Veja e pela TV Globo, onde foi comentarista político. Ganhou três Prêmios Esso. Possui dois livros publicados: Bodas de Frevo e “Onde Está meu filho?”

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    Questionar Lula pode. Só não pode fazer o jogo da direita

    "É legítimo criticar o governo e apontar caminhos. Como é legítimo se decepcionar e dizer o porquê", diz Gilvandro Filho

    (Foto: Foto: Ricardo Stuckert / PR )

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    Só mesmo inocentes para acreditar que sairia das urnas de 2022 um governo revolucionário. A força adquirida pela extrema direita, nos últimos anos, antevia a eleição de uma bancada bolsonarista forte e barulhenta, como, de fato, ocorreu. Daí, o esforço brutal do presidente eleito para formar uma base política que lhe permita o mínimo de governabilidade.

    A saída foi a negociação com a direita não propriamente bolsonarista. Cedeu-se demais? Talvez. Pode-se discutir o poder excessivo do Centrão e dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado. Deve-se. Que se faça de tudo, menos entregar os pontos.

    É legítimo criticar o governo e apontar caminhos. Como é legítimo se decepcionar e dizer o porquê. O Governo Lula é de reconstrução democrática.

    Há setores em que a coisa podia estar melhor. Exemplo, a relação aparentemente submissa com os militares, ditada pelo ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. A impressão é de que temos um presidente demasiadamente cauteloso, mesmo diante das provas incontestes de que parte das Forças Armadas apoiavam o golpe bolsonarista.

    Este "pisar em ovos" de Lula em relação aos militares ficou mais delicado com a decisão do governo de desestimular eventos de protesto pelos 60 anos do golpe ditatorial de 1964. 

    A militância de esquerda e as entidades que atuam na questão dos mortos e desaparecidos políticos sentiram o golpe. Ainda mais após uma polêmica entrevista na qual Lula sugeriu olhar para frente e não "remoer" o passado. O verbo "remoer" foi o "x" do problema. Seja qual foi o intento, pegou muito mal.

    A lista de mortos e desaparecidos da ditadura militar tem, hoje, 434 nomes. Só de desaparecidos são 141. Esta matemática enluta famílias como a do pernambucano Fernando Santa Cruz, preso em 23 de fevereiro de 1973, no Rio de Janeiro, junto com o amigo Eduardo Collier. Apurar casos como este é "remoer" problemas? 

    Porque esse cuidado todo somente ocorre no Brasil? Em outros países da América Latina saídos de ditaduras, como Argentina e Chile, ninguém insinuou vingança. Apenas buscou-se justiça.

    O desaparecimento de Fernando (e de Eduardo) dura até hoje, posto que não houve ainda qualquer notícia confirmada sobre o paradeiro dos dois. A saga da família de Dona Elzita Santa vem contada nas duas edições (1984 e 2014) do livro "Onde Está Meu Filho?".

    Agora, vá dizer à família Santa Cruz, como a centenas de famílias de drama semelhante, para não "remoer" o assunto.

    Ao mesmo tempo, e do outro lado, a oposição bolsonarista, em conluio com a imprensa corporativa, vive à caça de falhas do governo Lula e de dissonâncias entre o presidente e seus aliados. O noticiário da grande mídia corre atrás desses erros, sejam eles reais ou não.

    Mestres em fake news, os integrantes das bancadas bolsonaristas no Congresso Nacional são muitos e incansáveis. A partir de agora, então, no comando de comissões fundamentais da Câmara dos Deputados, como a CCJ, a de Educação e a da Segurança, essa turma nefasta exige cuidado redobrado. Para eles, 2026 já está de cima. E começou numa ferocidade que faz a suja campanha de 2018 parecer coisa de grêmio estudantil.

    Qual que é o rumo da prosa? É não arredar pé da luta contra a extrema direita e, ao mesmo tempo, ter muito cuidado com o peso e o direcionamento da crítica ao governo ora em construção. Ter cuidado com essas críticas ao Governo Lula, sabendo, ou procurando saber, de onde elas partem e com que propósito. Com o bolsonarismo fascista não se brinca.

    De outro lado, não dá para negar que o comportamento de Lula, muito receoso com os militares e generoso demais com o Centrão, pode custar caro a Lula e ao País. Não creio que a queda de popularidade nas últimas pesquisas seja apenas jogada da mídia. A discussão, contudo, deve ser cautelosa e nos foros adequados. É a maneira de não ceder à manipulação fascista nem fazer o seu jogo imundo.

    De minha parte, reservo-me o direito de discordar e de criticar. O governo de um líder político da estatura de Lula não merece ser tratado na base do "jogo do contente". Mas, há que se ter todo cuidado, até para não se perder a noção do lado em que se está. 

    A reconstrução democrática, com atenção e coragem. Este deve ser o lado.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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