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    Marcos Coimbra

    Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi

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    Receita simples para restaurar a democracia

    "Independente de preferências por candidatos, o Brasil precisa fazer uma eleição de verdade em 2022. Sem milicos metendo mão, sem juízes achando que devem guiar o povo, sem empresários pagando para ter o presidente, sem bispos leiloando seus rebanhos. Uma eleição que respeite o direito do povo votar em quem quiser", escreve Marcos Coimbra, presidente do Instituto Vox Populi

    (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil | Isac Nóbrega/PR)

    É impossível que alguém normal esteja satisfeito com o Brasil. Excluídos, é claro, oportunistas e picaretas, como o núcleo bolsonarista e os pelotões de brucutus, que se dão bem no horror em que os demais vivemos. No espaço de dois anos, retrocedemos em praticamente tudo, o suficiente para deixarmos de ser um país simpático aos olhos do mundo e nos tornarmos párias, assolados pela doença e a miséria. 

    Só há uma saída, com a qual todos capazes de enxergar um palmo à frente do nariz deveriam concordar: independentemente do que cada um quer, independente de preferências por candidatos, o Brasil precisa fazer uma eleição de verdade em 2022. Sem milicos metendo mão, sem juízes achando que devem guiar o povo, sem empresários pagando para ter o presidente, sem bispos leiloando seus rebanhos. Sem artimanhas e mentiradas que desvirtuem o processo de escolha, sem manchetes fabricadas na última hora. Uma eleição que respeite o direito do povo votar em quem quiser. 

    Nossa democracia está no fundo de um buraco. Tão mal ou pior que nos piores momentos de nossa história. E lembremos que a experiência brasileira é especialmente ruim no que se refere à saúde das instituições democráticas. De golpe em golpe, ditadura em ditadura, restrições em restrições à expressão da vontade da maioria, a democracia sempre foi exceção e não regra no Brasil.

    De 1964 em diante, foram vinte anos de ditadura. Cinco generais se sucederam na presidência, o suficiente para alinhar o País com qualquer republiqueta do Terceiro Mundo. Os militares gostavam de fingir respeito às leis, preservando arremedos de normalidade, mas era só para enganar quem queria ser enganado. Fizemos até “eleições” para escolher o general seguinte, sempre, é claro, de maneira indireta, através de Congressos expurgados de parlamentares inconvenientes. 

    Comparando a situação de hoje com a que tivemos depois do golpe de 64, estamos melhor em alguns aspectos, mas conseguimos piorar em, pelo menos, três. 

    Em primeiro lugar, chegamos aonde estamos através de eleições aparentemente normais e não de um quartelada, como em abril de 1964, com soldados atacando a população a cassetete. Aquele foi um golpe às claras, o que, de um lado, ampliou a autonomia dos golpistas para impor-se, mas, de outro, facilitou a compreensão coletiva do que estava ocorrendo, escancarando a ditadura. 

    O caminho através do qual desembocamos no militarismo de agora foi mais velado. Sem colocar tanques na rua, com um mero tuite prontamente atendido pelo Supremo Tribunal Federal, o Exército desfigurou o processo eleitoral de 2018. Sem alarde, os generais reassumiram um protagonismo incompatível com a democracia, embora consentâneo com seu golpismo atávico. Mostraram que o único que aprenderam com a redemocratização foi a ser dissimulados.  

    Hoje, esse golpe militar discreto fornece uma tintura de legitimidade aos descalabros do capitão Bolsonaro, como se ele fosse expressão da “vontade popular” (o que não deixa de ser semelhante ao que diziam os generais de 64 da ditadura que implantaram). Entre outras coisas, faz com que pensemos que seu mandato é análogo ao dos antecessores, esquecendo da história real da eleição de 2018, desmoralizada por intervenções e trapaças.  

    A segunda piora, em relação à situação pós-1964, é a ausência de projeto nacional no militarismo atual. Um anticomunismo de opereta e abundantes irracionalidades terraplanistas somente disfarçam o apetite dos generais por cargos e vantagens. Em termos de competência administrativa, são de chorar. 

    A terceira piora é no material humano: até Costa e Silva, com sua burrice asinina  e João Figueiredo, com sua grossura equina, parecem titãs frente ao ridículo Bolsonaro. 

    No resto, em muitas coisas, estamos parecidos com o que fomos depois do golpe de 1964. A mesma turma controla a vida politica, a Arena de ontem como o Centrão de hoje, igualmente mancomunada com militares metidos a espertos. A mesma elite econômica, com os projetos e o imediatismo de sempre, quer o mesmo: suprimir as melhorias estendidas aos trabalhadores durante a democracia, apossar-se do patrimônio público e perfilar-se diante do capitalismo global. A mesma grande imprensa continua a pretender ser a única voz, calando qualquer outra. As corporações do Estado não mudaram: sua verdadeira intenção é manter poder e privilégios, vantagens e mutretas, as pensões vitalícias para filhas solteiras. 

    Ou fazemos uma eleição de verdade em novembro de 2022 ou nos condenamos a permanecer na última fila do desenvolvimento global. Presos ao passado e motivo de piada no mundo inteiro. 

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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