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Pepe Escobar

Pepe Escobar é jornalista e correspondente de várias publicações internacionais

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Rússia e China estão fartas

"Ambas estão fartas de serem "corteses". Vocês querem confrontação? É confrontação o que vocês vão ter", escreve Pepe Escobar

O Presidente da China, Xi Jinping, e o presidente da Rússia, Vladimir Putin. (Foto: Sputnik/Sergei Bobylev/Pool via REUTERS)

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Algo de muito importante ocorreu no início desta semana em Astana, durante a reunião do Conselho de Ministros de Relações Exteriores da Organização de Cooperação de Xangai (OCX).

O Chanceler chinês Wang Yi foi direto ao ponto: ele conclamou os membros da OCX a "manterem sua autonomia estratégica", e "jamais permitir que forças externas " transformem a Eurásia em uma "arena geopolítica".

Wang Yi descreveu em detalhes de que forma "alguns países estão buscando hegemonia e poder, formando pequenas cliques, formulando regras ocultas, engajando-se em interferência e cancelamento, "desacoplando e cortando laços", chegando até mesmo a auxiliar as 'três forças' da região", na tentativa de assim suprimir a autonomia estratégica do Sul Global.

As "três forças" é código chinês para terrorismo, separatismo e extremismo religioso – de fato as três principais razões para a fundação da OCX ainda em 2001, pouco tempo antes do 11 de  setembro.

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A tradução direita da mensagem de Wang aponta para o fato de Pequim estar plenamente ciente da miríade de táticas de Guerra Híbrida  do Hegêmona, hoje empregadas por todo o Heartland. Mesmo assim, Pequim usa de perfeita polidez, conclamando por uma cooperação de segurança" ampla, solidária e sustentável, e por trabalho conjunto com a "comunidade internacional".

O problema é que a "comunidade  internacional" é refém da "ordem internacional baseada em regras".

A redefinição das "três forças "

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A próxima reunião dos chefes de estado da OCX será um julho, em Astana – apenas um mês após a uma importantíssima reunião ministerial realizada na Rússia. Há dois meses, o Presidente do Cazaquistão Kassym-Jomart Tokayev, em um encontro em Boao, na província de Hainan, na China, deixou claro que nenhum dirigente dos estados-membros da OCX pode faltar a essa reunião.

Mais cedo do que mais tarde, talvez já em inícios do próximo ano, os BRICS e a OCX talvez estejam operando não apenas em conjunto mas, possivelmente, sentados à mesma mesa.

A cúpula da OCX deste ano é de importância crucial, não apenas em termos da reorganização de uma verdadeira guerra ao terror contra as táticas coordenadas pelo Hegêmona – mas também da expansão e do aperfeiçoamento da cooperação econômica e comercial no âmbito da OCX.

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Belarus irá se tornar membro pleno da OCX em julho – o que já foi confirmado pelo Presidente Lukashenko. E, no ano passado, o gabinete da Arábia Saudita também aprovou a decisão de filiação à OCX.

Há apenas três meses em Pequim, durante as celebrações do 20º aniversário do Secretariado da OCX, Wang ecoou a fala do Presidente  Xi ao final de sua decisiva reunião cara-a-cara com Putin em Moscou, em 2023: "Mudanças jamais vistas em um século" vêm ocorrendo. Daí a renovada importância da OCX  – a maior organização multilateral não-ocidental  focada na cooperação nas áreas políticas e de segurança, e um dos pilares da multipolaridade.

É desnecessário apontar mais uma vez que a OCX é ou ignorada, desprezada ou mal compreendida pelo Ocidente Coletivo – por não se basear em uma infindável expansão militar ao estilo da OTAN. A OCX trata unicamente da integração Sul-Sul.  Não é pouca coisa ter China, Paquistão e Irã à mesma mesa, discutindo em pé de igualdade – e respeitando as prioridades de seus parceiros da Ásia Central/Heartland.

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Ao longo dos anos, questões de todo tipo acabaram sendo discutidas na OCX, indo muito além do foco inicial nas "três forças", e passando a abranger diplomacia, defesa nacional, segurança, economia, comércio, cultura, educação, transportes, tecnologia e agricultura.

Tanto quanto a OCX está no cerne da parceria multimodal Rússia-China, ela também vem impulsionando a interconexão econômica da China com os "istãos" da Ásia Central.

No ano da Grande  Decisão – quando a presidência russa dos BRICS deve traçar o mapa de percurso privilegiado para um sistema mais igualitário de relações internacionais – os atores da OCX parecem ter plena consciência de que não é por acidente que as "três forças" se constituem nas táticas preferidas da Guerra Híbrida empregadas pelo Império do Caos para Dividir e Governar.

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Isso se aplica não apenas aos suspeitíssimos grupos jihadistas como o ISIS-Khorasan, mas também ao controle imperial sobre as gangues internacionais de drogas, tráfico de pessoas e de órgãos.

De forma lenta mas segura, estamos subindo de patamar: a OCX vem desencadeando todos os esforços, como organização multilateral, contra as táticas de terror de um Hegêmona que é cúmplice até mesmo de genocídios.

O Chanceler russo Sergey Lavrov não poderia ser mais explícito do que foi no encerramento da cúpula de Astana:

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"A tarefa de desenvolver abordagens em comum a fim de assegurar a segurança e a cooperação eurasianas por parte dos estados deste continente é da maior urgência. Ressaltamos que a OCX talvez venha a desempenhar o papel de catalizador nesses processos, envolvendo outros parceiros da região".

Na prática, Lavrov mencionou um novo ímpeto para a Comissão Executiva  da Estrutura Regional Antiterrorista (RATS). Tradução: a RATS irá ampliar seu mandato para abranger segurança das informações, combatendo o crime organizado e explorando mais a fundo as conexões entre tráfico de drogas e financiamento do terrorismo.

Vocês estão prontos para a confrontação que tanto querem?

Agora, associe-se tudo o que foi dito acima ao diretor do FSB, Alexander Bortnikov, sendo mais do que explícito na cúpula da Comunidade de Estados Independentes (CIS), em Bishkek, no Quirguistão, quanto ao que serão os próximos passos do Império do Caos.

As quatro principais conclusões:

1. Os Estados Unidos, o Reino Unido, e a OTAN estão agora em modo Guerra Híbrida Total conta a Rússia.

2. A OTAN vem facilitando a transferência maciça de terroristas jihadistas de diversas latitudes para a Ucrânia, alguns deles combatentes do ISIS-K especialmente treinados, instrumentalizando-os por todo o Heartland. Pode-se chamar a isso de Legião Estrangeira do Terror  – que deve ser vista como o inimigo número 1 da OCX. Bortnikov se referiu à "constante rotatividade de militantes nas áreas Síria-Iraque e Afeganistão-Paquistão, e ao surgimento de novos campos de treinamento de militantes próximo à fronteira sul da Commonwealth".

3. A Ucrânia lançou-se ao Terror Total – com incessantes ataques de sabotagem em território russo.

4. Em um tom mais positivo, a Maioria Global está em marcha: a Rússia, cada vez mais, vem cooperando estreitamente com dezenas de países do Oeste Asiático, da Ásia em geral, da África e da América Latina America.

Após uma série de "coincidências" extraordinárias ocorridas nestas últimas semanas, desde tentativas de assassinato por "atiradores solitários" até golpes arquitetados, ameaças explícitas e desaparecimentos misteriosos, todo o ecossistema BRICS-SCO tem que se colocar em estado de alerta máximo.

Após a épica cúpula Putin-Xi em Pequim, e o drama do helicóptero de Raisi mais estranho que a ficção, a renovada solidez das parcerias estratégicas Rússia-China-Irã indica que Rússia e China estão prestes a despir suas luvas de pelica.

Putin e Xi, cada um a seu modo, já advertiram o coletivamente imbecilizado Ocidente: se vocês querem confrontação, vocês terão confrontação. De sobra. E correndo  grandes riscos.

A Mãe de Todos os Testes que se anuncia para o próximo verão é saber até onde a OTAN irá quando se tratar de atacar diretamente a Federação Russa . O primeiro-ministro húngaro Viktor Orban avisa que "a Europa está se preparando para entrar em guerra com a Rússia".

As incultas e ignorantes elites político-militares do Eurolixo são totalmente incapazes  de entender a realidade externa à sua bolha. Além do mais, elas interpretam como fraqueza a paciência e a abordagem legalista russas.  Bem, as fontes de inteligência de Moscou, não-oficialmente, deixam agora bem claro: a resposta, caso a Europa tente alguma estupidez,  será devastadora.

No nível dos BRICS, há uma espécie de tentativa de último minuto para desativar a incandescência. Wang Yi e o principal assessor de política externa do Presidente Lula, Celso Amorim, lançaram uma declaração traçando as linhas gerais de um "acordo consensual" sobre o fim do jogo na Ucrânia.

Em essência, a declaração diz que a China e o Brasil apoiam a realização de uma conferência internacional de paz em data conveniente, reconhecida tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia, com participação igualitária de todas as partes e discussão justa sobre os planos de paz".  O Império do Caos, obviamente, irá rejeitar a proposta.

Pequim tem toda a sua atenção focada nas provocações do Império do Caos em Taiwan, enquanto a Rússia se concentra nas provocações da OTAN na Ucrânia.  Ambas estão fartas de serem "corteses". Vocês querem confrontação? É confrontação que vocês vão ter.

*Tradução de Patricia Zimbres

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