Sóstenes Cavalcante e as meninas do job da anistia
"O que não podemos fazer é ficar esperando Jesus voltar, nem para nos salvar da extrema-direita, nem para ser morto novamente por ela", afirma Ricardo Nêggo Tom
Quem chega pelo aeroporto de Brasília está sendo surpreendido pela presença de um grupo de moças simpáticas e sorridentes, cuja missão é recepcionar parlamentares e solicitar a eles que perdoem criminosos. Vestindo uma camisa com os dizeres “Anistia já!”, as meninas foram contratadas pelo deputado Sóstenes Cavalcante, o “aspone” de Silas Malafaia na Câmara dos Deputados, para coletar assinaturas favoráveis ao projeto de anistia para os golpistas presos pelo 8 de janeiro.
Selecionadas seguindo o padrão de beleza que a extrema-direita entende que mulheres devam ter, ou seja, brancas, as modelos estão sendo usadas como objetos para, quem sabe, seduzir parlamentares que porventura ainda estejam indecisos sobre conceder anistia aos golpistas. Não quero dar uma de homem santo aqui, até porque eu não sou pastor evangélico, mas é, no mínimo, estranho que um deputado cristão e defensor da família tradicional brasileira se utilize de um expediente tão ultrapassado para alcançar os seus propósitos políticos.
O líder do PL na Câmara não poderia ter colocado uns rapazes no seu casting apócrifo parlamentar? Talvez. Mas, para os conservadores, o papel da mulher na sociedade, quando não é de submissão, é o de agradar aos homens com sua beleza e sensualidade. Desde que não sejam mulheres de esquerda, que para eles não são bonitas. Talvez por não serem submissas o suficiente. Na minha adolescência e juventude, as mulheres que trabalhavam como frentistas em boa parte dos postos de gasolina usavam um shortinho curto e um top que as deixavam com a barriguinha de fora. Objetivo: atrair clientes para o estabelecimento. Alguns na esperança de trocar o óleo, além de encherem o tanque.
As meninas do job da anistia de Sóstenes Cavalcante não usam roupa curta, mas foram colocadas nesta condição de chamariz de parlamentares, para nos mostrar de todas as formas possíveis que a extrema-direita representa o atraso da nossa sociedade, um retrocesso social e civilizatório que vem sendo naturalizado por muita gente, inclusive por aqueles que são críticos, mas não reagem a tudo isso. As jovens não têm culpa e estão ali a trabalho. Mas essa marmota quase meretrícia, no conceito, está sendo paga com o dinheiro público. Pior do que isso, estamos pagando pela anistia de criminosos que atentaram contra a democracia.
Silas Malafaia, o verdadeiro deputado que exerce o mandato de Sóstenes, já publicou nas suas redes sociais um agradecimento especial ao seu “médium político”, por ele já ter conseguido as 257 assinaturas exigíveis para pautar o projeto da anistia na Câmara. Mal comparando, vale lembrar que os nazistas utilizaram mulheres como objetos sexuais nos campos de concentração, com o objetivo de aumentar a produtividade dos prisioneiros do Reich. Elas também serviram como “iscas” para capturar judeus durante o regime. No caso do PL, vimos uma pauta parlamentar, por mais absurda que seja, ser publicizada como um comercial de cerveja, onde mulheres bonitas vendem o produto.
Sóstenes e Malafaia podem estar blefando, algo que eles fazem com muita propriedade, uma vez que não mostram a tal lista com as assinaturas necessárias. O deputado diz que só vai apresentar a lista quando tiver bem mais que as 257 assinaturas, o que, segundo ele, será mais fácil do que possam imaginar os opositores ao projeto. Reforçando que o PL da anistia não visa favorecer Bolsonaro, o evangélico agradece ao apoio do centrão, sobretudo do ex-desafeto Gilberto Kassab, que anda acenando a Bolsonaro. Hugo Motta, presidente da Câmara, não vê com bons olhos a pauta da anistia e já teria sinalizado que só pretende falar sobre o assunto após a Páscoa. Por isso, virou o mais novo alvo de Silas Malafaia.
Eu venho dizendo há tempos que o que ainda sustenta o bolsonarismo é a igreja evangélica. Uma prova disso são os principais artífices do projeto de anistia para os golpistas bolsonaristas. Os dois pastores evangélicos aqui citados, Sóstenes e Malafaia, com a força da grana que ergue belos templos e destrói a nossa democracia. Graças à isenção tributária para suas empresas da fé, lhes sobra dinheiro para organizar e patrocinar manifestações de cunho golpista e financiar o perdão aos criminosos envolvidos. O job evangélico usa Jesus como objeto de sedução, o que coloca as igrejas na condição de casas de lupanar onde milhões de fiéis pagam para que Cristo satisfaça os seus desejos, sem que eles tenham qualquer tipo de identificação com o seu evangelho e com o sofrimento que ele experimentou em vida.
Essas pessoas não anistiariam Jesus se ele voltasse nos dias de hoje e repetisse o mesmo discurso que fez contra os poderosos e os líderes religiosos de seu tempo. Assim como outrora, eles iriam pedir a soltura de qualquer um Barrabás que tenha ido a Brasília apoiar um golpe de Estado, e a crucificação daquele homem simples e honesto que lhes ensinou o amor ao próximo. O “harém” de Sóstenes Cavalcante é só o começo das nossas dores com o atual Congresso Nacional. Eles são capazes de coisas bem piores, e não terão o menor pudor em colocá-las em prática. O que não podemos fazer é ficar esperando Jesus voltar, nem para nos salvar da extrema-direita, nem para ser morto novamente por ela. Precisamos reagir e já! Sem anistia!
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