Tarcísio e a impunidade: acusar Boulos sem provas é fácil para quem se elegeu com ajuda de fake news
Em 2022, morador de Paraisópolis foi morto quando Tarcísio fazia campanha. Não foi atentado ao candidato, como divulgou assessoria. Crime continua impune
Juristas ouvidos pela imprensa são unânimes ao apontar que Tarcísio de Freitas cometeu abuso de poder político quando, em entrevista coletiva, disse que a facção criminosa PCC recomendou voto no candidato a prefeito Guilherme Boulos. O governador não apresentou provas e deu a declaração depois de votar ao lado de seu candidato, Ricardo Nunes.
Para os especialistas, resta à Justiça Eleitoral decidir que tipo de punição aplicar. Uma possibilidade é a cassação da chapa de Ricardo Nunes e a inelegibilidade dele e de Tarcísio de Freitas.
“Entendo como um absurdo do ponto de vista eleitoral, fazer uma acusação agora, aparentemente sem provas, com finalidade de produzir/influenciar o voto. Já existe ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) que apura eventual abuso do poder político, dos meios de comunicação social. E pode acarretar como punição a cassação do registro/diploma de quem for eleito, e a inelegibilidade dos responsáveis, candidatos ou não”, afirmou ao UOL o advogado Alberto Rollo, professor de Direito Eleitoral.
Outra questão que se coloca é por que o governador disse algo tão grave aparentemente sem se importar com as consequências. Uma resposta plausível é a certeza da impunidade. Em 2022, Tarcísio de Freitas se elegeu governador com a ajuda de fake news, e não houve punição.
Alguns dias antes do comparecimento do eleitor às urnas, um morador de Paraisópolis, Felipe Silva de Lima, foi morto com um tiro nas costas, disparado por policiais ou seguranças da campanha do então candidato a governador. E seus assessores divulgaram a versão de que Tarcísio tinha sido alvo de um atentado do PCC.
Essa narrativa foi contestada pela Secretaria de Segurança Pública, na época sob a condução do governo do PSDB. Para os policiais, houve tiroteio, mas não um atentado ao então candidato a governador.
Tarcísio se elegeu, houve mudanças na Secretaria de Segurança, troca de comando no inquérito policial, e a investigação foi concluída sem apontar o autor do disparo. O Ministério Público concordou com a conclusão, e a Justiça arquivou o inquérito.
A família nem sequer recebeu de volta o celular que Felipe usava ou a moto que era dele e conduzia no momento do crime. Por pouco não sobra para a imprensa. Um promotor eleitoral tentou me punir e a um repórter da Folha de S. Paulo, por conta das respectivas coberturas jornalísticas.
A denúncia desse promotor só não foi adiante porque a equipe do advogado Fernando Fernandes conseguiu um habeas corpus.
Desta vez, a campanha de Guilherme Boulos pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) punição a Tarcísio e punição também a Ricardo Nunes, beneficiário do abuso do poder político.
O relator é o ministro Kássio Nunes Marques, que acumula a vaga no TSE com a cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF), que ocupa por indicação de Jair Bolsonaro, op adrinho também de Tarcísio.
Nova impunidade à vista?
Para o desembargador Alfredo Attié, em princípio, não.
Para ele, o caso é tão grave que será difícil varrer para debaixo do tapete.
“A lei eleitoral pune fake news e abuso de poder político. O ato do governador aponta o cometimento de ato ilícito eleitoral e pode custar o mandato não apenas de Nunes, mas do próprio Governador”, afirmou Attié, que é presidente da Academia Paulista de Direito.
“Cidadãs e cidadãos de São Paulo, que prezam a Constituição e a Democracia e desejam que o liame de representação seja legítimo, como exige o Estado Democrático de Direito, agora devem prestar atenção no que fará o Ministério Público Eleitoral e a Justiça Eleitoral, para resgatar a dignidade da eleição paulistana e da representação política estadual”, acrescentou.
O governador de São Paulo é declaradamente a aposta da elite financeira e de seus porta-vozes na imprensa corporativa em eleições presidenciais. Tarcísio tem poder e prestígio, portanto, mas ninguém está acima da lei.
E é preciso lembrar: o que o governador de São Paulo fez neste domingo é crime e deixá-lo impune é para o Judiciário a repetição do erro que já beneficiou, em outras ocasiões, Aécio Neves e Jair Bolsonaro. Deu no que deu. Não foi bom para o País.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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