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    Paulo Amaro Ferreira

    Historiador e professor da rede pública de ensino do Rio Grande do Sul

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    Tarso Genro e o golpismo disfarçado de republicanismo

    Tarso Genro é um legítimo representante da esquerda classe média

    Tarso Genro (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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    No último domingo, dia 5 de dezembro, Tarso Genro postou em suas redes sociais a seguinte mensagem: “Estarei com Ciro, sem a menor dúvida, se Lula não for para o segundo turno ou se for impedido de concorrer por um golpe institucional”. Antes de aprofundarmos sobre quem é Tarso Genro e quais são historicamente as suas posições políticas, analisemos o absurdo em si dessa declaração. Em primeiro lugar, se Lula não for para o segundo turno, já significa que houve algum golpe ou uma série de manipulações, fraudes e falsificações, que tenham sido capazes de tirar do segundo turno o líder absoluto de todas as pesquisas. Portanto, cogitar que Lula não vá ao segundo turno como algo normal, como se isso pudesse ocorrer sem nenhuma fraude, já é em si um absurdo completo. Mas ainda há algo mais grotesco que isso nessa pequena frase do ex-governador do Rio Grande do Sul e ex-ministro dos governos Lula, que é o fato de que ele concebe que, se houver de fato um golpe que impeça Lula de concorrer, ele faria campanha para Ciro Gomes. Ou seja, ao invés de combater o golpe, de denunciar a fraude, de lutar contra a perpetuação do golpe de estado no Brasil, ele simplesmente trocaria de candidato como se nada tivesse acontecido. É um não é uma pérola essa declaração de Tarso Genro?

    Acontece que não nos surpreendemos mais com as declarações da família Genro. A cada dia fica mais evidente que o golpismo explícito de Luciana Genro, filha de Tarso, em grande parte é uma herança do pai. Tarso Genro sempre foi um grande entusiasta do que ele chama de republicanismo. Para ele, existiria uma possibilidade de que o Estado servisse aos interesses gerais da nação, não importando a natureza de classe do próprio Estado. Ele é sem dúvida um dos responsáveis pela disseminação dessa ideologia dentro do PT, que ao fim e ao cabo fez com que o partido não conseguisse perceber os movimentos golpistas que germinavam dentro do “republicanismo” idealizado pelos governos petistas. Vale lembrar também que Tarso foi um dos grandes entusiastas da chamada frente ampla, assinando com a direita o primeiro manifesto que reunia algumas figuras da esquerda, como o próprio Tarso e Guilherme Boulos, a todo o chorume golpista, sob o pretexto de combater Bolsonaro. 

    Tarso Genro é um legítimo representante da esquerda classe média. E sendo um dos seus representantes legítimos, ele expressa fielmente a covardia desta classe, aquela já explicada por Marx no 18 do Brumário. A classe média, sendo uma classe intermediária no capitalismo, não pode expressar um programa político genuíno para a sociedade, se limitando a oscilar entre posições de esquerda bastante moderadas e posições tradicionais da direita, conforme a luta política vai também oscilando de acordo com a correlação de forças na sociedade. Quando a classe média se vê na eminência de ser destruída pelos grandes capitalistas, ela tende a adotar posições de apoio aos setores mais à esquerda da sociedade. Porém, quando a luta de classes se acirra, e evidencia a polarização entre operários e burgueses, a classe média atua para sabotar a luta dos operários e tenta, desesperadamente, manter as suas posições econômicas de privilégio em relação à maioria da população. Ou ainda, em alguns casos, quando a esquerda apresenta-se vacilante na luta de classes, a classe média pode também apoiar a extrema direita. São raros os casos na história em que a classe média, em conjunto, coloca-se ao lado dos operários em momentos de radicalização da luta, mas abundam os exemplos em que a classe média passa por completo para o lado da direita e apoia inclusive as ações mais reacionárias possíveis contra os operários e os setores mais oprimidos da população. Sempre que os seus privilégios são colocados em risco, a classe média tenta defender as suas posições, custe o que custar. 

    É por isso inclusive que a classe média procura também organizar os seus próprios partidos, que podem se apresentar tanto como partidos de direita, de centro e inclusive até de esquerda, como no caso do PSOL. Contudo, esses partidos atuam para conservar os privilégios de uma classe que, como já dissemos, não é a classe dos capitalistas, mas tampouco é a classe dos operários e dos setores mais oprimidos da população. 

    A posição de Tarso Genro significa que a esquerda pequeno burguesa, como representante de diversos setores da classe média (como profissionais liberais, professores universitários, pequenos e médios proprietários, etc), não está disposta a ir até o fim na luta contra o golpe. E isso por que ir até o fim na luta contra o golpe pode gerar uma situação de extrema instabilidade política que, na visão da classe média, poderia colocar em risco os seus privilégios. Por exemplo, os parlamentares da esquerda, sejam eles do PSOL, do PCdoB ou até alguns do PT, que já consideram-se reeleitos na próxima eleição, por terem estrutura financeira para a campanha, acreditam que uma radicalização da luta pode colocar em risco essa reeleição. Dessa forma, preferem manter a própria estrutura do golpe do que colocar a perder os seus cargos e os seus privilégios apoiando uma luta contra o golpe até o fim. Os boicotes e as sabotagens contra a candidatura de Lula, vindos não só do PSOL e do PCdoB, como também de setores de dentro do próprio PT, encontram a sua base material nessa parcela da esquerda que não tem absolutamente nenhuma correspondência com os interesses da classe trabalhadora brasileira. 

    De fato, uma verdadeira luta contra o golpe em seu conjunto, contra todos os golpistas e não somente contra Bolsonaro, poderá levar a uma verdadeira instabilidade da situação política no país. Disso não resta dúvida alguma. Porém, o que tem a perder a classe trabalhadora e as dezenas de milhões de pessoas que foram jogadas na pobreza ou na miséria após o golpe de 2016? Para a imensa maioria da população brasileira, o maior risco que pode haver é a continuidade do golpe, seja com Bolsonaro ou seja com qualquer outro candidato da direita golpista, como alguém do PSDB ou até do PDT, no caso Ciro Gomes. Se alguém desses partidos for eleito, ou se Bolsonaro for reeleito, isso causará a completa destruição das condições mínimas de vida da população brasileira, e jogará o Brasil no rol de países miseráveis, como o Haiti ou como diversos países africanos, por exemplo. 

    A sabotagem da esquerda classe média contra a candidatura de Lula tem ocorrido através de muitos expedientes. Seja na articulação da frente ampla, que desde o início reveleou-se uma frente contra Lula e não contra Bolsonaro, seja na tentativa de relacionar Lula com os setores mais podres da direita brasileira, como no recente caso da suposta aliança entre Lula e Alckmin, ou então, preparando o terreno para um novo golpe contra Lula, como é o caso da declaração de Tarso Genro. A esquerda que realmente deseja vencer os golpistas e livrar o país da atual situação, precisa também combater esses setores pequeno burgueses, que buscam sabotar qualquer tentativa de modificar verdadeiramente a situação no país. Somente uma candidatura que realmente polarize com todos os setores golpistas poderá criar um movimento com chances de devolver a dignidade para o povo brasileiro e abrir caminho para a verdadeira transformação social no país.  

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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