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    Florestan Fernandes Jr

    Florestan Fernandes Júnior é jornalista, escritor e Diretor de Redação do Brasil 247

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    Trump e o salto para o abismo

    "Basta um arroubo de fúria de um dos líderes fascistas para pôr a humanidade a perder", escreve Florestan Fernandes Jr.

    Donald Trump em Michigan, EUA, 1/11/2024 (Foto: REUTERS/Brian Snyder)

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    As semelhanças entre Hitler e Donald Trump vão além da ideologia de extrema-direita. As estratégias políticas e de comunicação são as mesmas.

    Em novembro de 1923, portanto há cem anos, Adolf Hitler liderou uma marcha malsucedida para derrubar o governo do Estado da Baviera.

    Pelo crime de alta traição, Hitler foi condenado a cinco anos de prisão, mas cumpriu apenas um.

    Resultado: livre para organizar o partido nazista, Hitler chegou ao poder como Chanceler em 1933 e ditador no ano seguinte.

    Já Donald Trump sequer chegou a ser julgado por sua atuação na invasão do Capitólio, em janeiro de 2021.

    Livre, com muito dinheiro e o apoio do dono do X, Elon Musk, Trump continuou sua cruzada de extrema-direita e agora consegue o feito de ser reeleito nos EUA, com uma votação robusta. Se será um ditador nos moldes de Hitler, só o tempo dirá.

    O que me parece mais temeroso é que Trump, aos 78 anos, é um homem bilionário, poderoso, narcisista (portanto egocêntrico) que pode e provavelmente trará prejuízos irremediáveis ao futuro das democracias e do meio ambiente. Ou seja, os danos, em escala global, são existenciais.

    Infelizmente, esse é o espírito do tempo que vivemos e, diante desse fato, além do lamento, nos cabe a reflexão.

    Penso que algo de muito caro nos sonhos e nas mentes das pessoas foi quebrado nas últimas décadas. Culpar as redes sociais, as fake news, é uma tentação simplista, na qual quem realmente deseja compreender os fatos não pode incorrer. As democracias falharam em algum ponto nevrálgico. É indispensável uma reflexão séria, responsável, sem terceirização de responsabilidades.

    Dito isso, há outro ponto muito importante no contexto que discuto aqui: a impunidade daqueles que corroem abertamente o estado democrático de direito. Como bem me lembrou Alfredo Attié durante a apuração dos votos nos EUA: “O grande responsável pela reeleição de Trump é a Justiça norte-americana, em sua omissão e lentidão de responsabilizá-lo pela tentativa de golpe. O mesmo pode acontecer aqui, com uma Justiça que é ainda menos independente.” Attié tem toda razão.

    Aqui em nossas bandas, dois anos após a descoberta da minuta do golpe e dos atos terroristas em Brasília, ninguém da alta cúpula do governo Bolsonaro foi sequer indiciado. A punição só veio para aqueles desvairados que destruíram as sedes dos três poderes. Ou seja, no mar de golpistas, os tubarões seguem nadando livremente.

    Igualmente livres estão Bolsonaro e sua trupe quanto aos crimes de falsificação da caderneta de vacinação e a venda das joias sauditas.

    Isso sem falar no processo que investigava a responsabilidade de Bolsonaro durante a pandemia de Covid-19. Esse crime de proporções gigantescas, que ceifou a vida de tantos brasileiros, não pode cair no esquecimento.

    Lembro aqui que, em janeiro de 2024, Gilmar Mendes determinou que o procurador-geral da República, Paulo Gonet, reavaliasse a conduta e as omissões de Bolsonaro durante a pandemia. Até agora, nada.

    Fomos deixando passar tudo, desde a carnificina que foi a Covid, até as ameaças abertas e sistemáticas de golpes de Estado com a participação de militares.

    É certo que teremos pressão do novo-velho governo dos EUA contra as democracias comandadas por progressistas. O fortalecimento dos regimes autocráticos de extrema-direita está no horizonte, só que agora em um mundo muito mais complexo e destrutivo que o do século passado.

    Basta um arroubo de fúria de um dos líderes fascistas para pôr a humanidade a perder. Tamanha é nossa distopia cotidiana, que me ponho a pensar que talvez, até nessa fatídica hora, pipocarão influencers anunciando e exibindo, em tempo real, nas redes, o mundo se despedaçando, o fim dos tempos.

    Na minha ressaca reflexiva, pós-eleição estadunidense, parafraseio o astronauta Neil Armstrong: os eleitores nos Estados Unidos deram um pequeno passo em direção ao passado, mas um grande salto para o abismo.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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