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    Paulo Moreira Leite

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    Wanderley Guilherme dos Santos deixa legado gigantesco

    "A morte de Wanderley Guiherme dos Santos ocorre num momento especialmente difícil da vida do país. Ao deixar uma obra sólida como legado, ele fez sua parte para iluminar a consciência que irá acompanhar brasileiros e brasileiras neste periodo", diz o colunista Paulo Moreira Leite

    (Foto: Divulgação)

    Capaz de denunciar o golpe de 64 com dois anos de antecedência, Wanderley Guilherme dos Santos também deixou registrado, em livro, que o único objetivo político capaz de unir a elite brasileira era destruição da CLT, assumida por Temer-Collor escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

    Num país de sonhadores de várias famílias, Wanderley Guilherme dos Santos (1935-2019) devotou sua imensa energia intelectual a um raro esforço de conhecimento da realidade brasileira.  

    Com uma formação científica de gabarito, refinada em Stanford, Wanderley produziu uma obra gigantesca pelo volume de livros publicados, exemplar pela lucidez de suas análises   e pela independência intelectual.   

    Sem  abrir mão das próprias opiniões, nem de uma visão de mundo democrática e socialmente  progressista, ele tinha a humildade de  submeter as próprias idéias à prova dos fatos, recusando-se a misturar conhecimento e propaganda.

    Quando tinha 27 anos de idade, cidadão de um país encantado com ilusões em torno do regime democrático nascido com a Constituição de 1946, em fevereiro de 1962  Wanderley  publicou um artigo fundamental, à quente, para debater o que se passava naquela conjuntura. Foi o hoje clássico "Quem Dará o Golpe no Brasil," que antecipava o movimento cívico-militar que derrubou João Goulart dois anos mais tarde.

    Mais do que um pensador de conceitos abstratos e alinhamentos automáticos, Wanderley fazia questão de apurar dados, conhecer números, comparar situações e investigar  a realidade bruta para entender como os países se tornam aquilo que são.

    Sem receio de identificar os interesses em disputa na nossa história política, foi um dos primeiros a  reconhecer a herança de Getúlio Vargas -- postura rara num meio acadêmico onde a força da Universidade de São Paulo apresentava o varguismo através dos olhos da elite paulista.

    Num diagnóstico sociológico irretocável, muito antes da aparição de conversas da última década sobre "reforma trabalhista",  registrou em livro uma verdade fundamental sobre o Brasil contemporâneo.

    Mostrou  que, em sua eterna luta para revogar as conquistas do povo, a destruição da CLT era o único projeto político que unificava a elite brasileira -- como o país inteiro pode confirmar pelo frenezi produzido pelas reformas combinadas Temer-Collor-Paulo Guedes.

    Um dos primeiros a celebrar os avanços trazidos pela Constituinte em matéria de bem-estar social, tinha gosto especial em desmontar chavões  e lugares comuns que frequentam os meios políticos.   

    Era um defensor irredutível do regime democrático e um crítico servero das frequenetes tentativas de criminalização do sistema político. Estava concencido de que o objetivo real das campanhas contra o voto obrigatório  era criar novas dificuldades para a participação política das grandes maiorias.

    Wanderley Guilherme também proporcionou alegrias raras a este jornalista. Perdi a conta de entrevistas concedidas, ao longo de décadas, verdadeiras aulas  que tive a felicidade de partilhar com milhares de leitores.  Diretor de redação da Época, pude contar com seu conhecimento como colunista regular da revista.

    A morte de Wanderley Guiherme dos Santos ocorre num momento especialmente difícil da vida do país. Ao deixar uma obra sólida como legado, ele fez sua parte para iluminar a consciência que irá acompanhar brasileiros e brasileiras neste periodo.   

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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