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    CPMI do Golpe amedronta a oposição, afirma Rogério Correia

    Na avaliação do parlamentar, os ataques de 8 de janeiro são mais um capítulo da trama de Bolsonaro e aliados para viabilizar a tomada do poder

    Rogério Correia (Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados | Reprodução/Twitter)

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    PT na Câmara -  O deputado federal Rogério Correia (PT-MG), integrante da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que vai investigar a tentativa de golpe em 8 de janeiro, afirma que mais sigilos bancários e eletrônicos virão à tona e devem levantar provas do envolvimento na trama golpista dos derrotados nas eleições de 2022. Vice-líder do Governo na Câmara, Correia avalia que o resultado pode tornar o ex-capitão e ex-presidente Bolsonaro inelegível. “Acho que ele não pode é sair como inocente nessa história, porque ele não foi”, frisa o deputado, em entrevista à revista eletrônica Focus Brasil, da Fundação Perseu Abramo.

    Na avaliação do parlamentar, os ataques de 8 de janeiro são mais um capítulo da trama de Bolsonaro e aliados para viabilizar a tomada do poder. Ele lembra que, em 7 de setembro de 2021 e no dia da diplomação de Lula, em novembro de 2022, ocorreram “ensaios” do golpismo. Por isso, ressalta a importância da punição ao ex-capitão, para evitar que  na próxima eleição o movimento antidemocrático tenha ainda mais força no Brasil.

    A expectativa é que a CPMI vai autorizar mais quebras de sigilos bancários e telemáticos que permitirão levantar novas provas incriminadoras contra Bolsonaro e seus mais diletos colaboradores.

    A CPMI sobre os ataques contra as sedes dos Poderes da República em 8 de janeiro está próxima de começar e a conjuntura atual parece ser oposta àquela imaginada pela oposição, que tentou atribuir ao PT e outras forças de esquerda o vandalismo terrorista. Agora, diante das investigações conduzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, o que está evidente é que os ataques foram feitos por seguidores de Jair Bolsonaro e que integrantes do seu governo e o próprio ex-presidente são suspeitos de envolvimento direto na tentativa de golpe de Estado.

    A seguir, os principais trechos da entrevista:

    Focus Brasil — A CPI sobre os ataques de 8 de janeiro já foi tratada como se representasse um risco para o governo. E, agora, a sensação, inclusive na imprensa, é de que essa situação se inverteu e o alvo é Bolsonaro. Como o senhor vê a situação?

    Rogério Correia — A oposição está tremendo igual vara verde, morrendo de medo da CPI. Olha, a justiça é feita. Quando foi em janeiro, dia 9, apresentei junto com o Joseildo [Ramos], deputado petista da Bahia e com o [senador] Paulo Paim [PT-RS], um pedido para instalar a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito. Isso em 9 de janeiro, um dia depois dos acontecimentos, da quebradeira aqui.

    A avaliação do governo e da maioria do PT foi no sentido de que não devíamos fazer a CPI. Não por medo. Você sabe como que é início de governo, vamos ter que mirar primeiro na formação de base do governo na Câmara. E a Polícia Federal, o Ministério Público, o Supremo Tribunal Federal vão investigar e vamos centrar em governar. Então, este era o pensamento normal de qualquer governo, principalmente, de um governo de esquerda.

    “Nós vamos ter problema na Câmara, temos minoria, então, vamos governar. Cem dias de governo, estabelece primeiro as nossas metas nos programas sociais, refazer os ministérios, recriar políticas públicas. Esse era o pensamento do governo, também do presidente Lula, que chegou a dizer “olha, CPI agora não é bom para a gente”. Então, concordamos. Se o governo acha que não deve, tudo bem. Na época, não me convenci disso, mas foi a voz majoritária do PT e do governo. Então, não criei confusão em relação a isso.

    Ainda viria a discussão das metas fiscais, a reforma tributária. Optou-se por deixar que as outras instituições fizessem a investigação e, aliás, fizeram muito bem, com o Ministério da Justiça também acompanhando, o ministro [Flávio] Dino e assim por diante. Então, isso esfriou do nosso ponto de vista, mas a oposição achou que era um receio do governo em relação à CPI e foi para cima, querendo realizar essa comissão de inquérito com uma narrativa completamente absurda, que é a narrativa de que o governo teria contribuído para que isso acontecesse, no sentido de fazer com que quanto pior, melhor.

     

    — Uma mentira deslavada.

    — Sim. Como se o governo tivesse deixado que se quebrasse o todo, que se expandisse a quebradeira, porque isso daria um aval ao governo e “queimaria o filme” da oposição. Um negócio absurdo. Ou seja, tentaram um golpe de Estado, não conseguiram e ainda querem apurar o golpe de Estado dizendo que o governo estava ganhando com a tentativa de golpe. Essa é a narrativa deles.

    E aí vieram aquelas imagens onde o general G. [Gonçalves] Dias [então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República] aparece lá, atordoado, no meio daquilo. E eles dizem: “está vendo, é o governo que queria”.

    Mentira, claro. As imagens depois revelaram inclusive o contrário. E aí começam a aparecer outras provas de que o golpe não era apenas uma narrativa nossa, mas um acontecimento histórico. E aí o negacionismo histórico deles levou a que cometessem esse erro. É isso que a  CPI, a CPMI — porque é mista —, vai ver, uma trajetória histórica do que aconteceu.

    A conclusão será, evidentemente, que houve no Brasil uma tentativa de golpe e que essa tentativa tinha um autor intelectual principal, que é Jair Bolsonaro. E por autoria intelectual, ele já tem um processo no Supremo averiguando esses indícios fortes que o colocam no centro disso. A única divergência que tem entre nós sobre isso é se ele pode ser chamado de autor intelectual. Acho muito dizer que o Bolsonaro é autor intelectual de alguma coisa. Prefiro chamar de mandante, mas que ele é o mandante deste golpe e que esteve por trás disso o tempo inteiro junto com o general [Augusto] Heleno [ex-ministro-chefe do GSI], com mais meia dúzia de generais tresloucados, golpistas, que é o general Heleno, o Braga Netto, o [ex-comandante do Exército Eduardo] Villas Boas. Essa turma, evidentemente, sonhava com esse golpe e arquitetou isso durante muito tempo.

     

    — Golpismo como projeto político.

    — O bolsonarismo é isso. Além de abraçar o ultraliberalismo, tem uma visão totalitária, neofascista. E, durante todo o procedimento, foi isso que eles buscaram durante todo o período que governaram, desde que o filho dele [Eduardo Bolsonaro], antes das eleições disse que o Supremo não seria problema porque bastava fechá-lo com um jipe, um cabo e dois soldados. E durante todo o governo foi isso: “pau no Supremo”.

    Depois, brigam com o Congresso Nacional. Depois, fizeram o orçamento secreto e fizeram as pazes. Mas o Supremo era sempre tensionado. E aquele fatídico 7 de setembro de 2021, quando a tentativa de golpe foi explícita. Ali, Brasília teve aquela noite tensa. A ideia deles era fazer uma grande concentração, fechar as estradas e o Bolsonaro depois chamaria a ordem no Brasil através da Constituição, do artigo [142], que eles interpretam erradamente. E que a partir dali ele iria para São Paulo onde tinha uma outra manifestação marcada na qual Bolsonaro iria dizer que para o bem do Brasil e de todos, com o caos instituído, estradas ocupadas, Brasília ocupada, ele proclamaria então o auto golpe. Falhou porque não tinha tanta gente e o Congresso não caiu nessa, o Supremo resistiu e as Forças Armadas não foram na jogada que ele achou que fosse impor aquele dia. Então, ali já tinha sido uma tentativa explícita de golpe do Bolsonaro.

     

    — Era sempre um ensaio…

    — E ele não desistiu disso, continuou dizendo que as urnas não eram confiáveis e preparando a próxima etapa golpista. Aí são muitos os indícios disso, fortíssimos. Talvez o principal deles seja a minuta do golpe que estava com Anderson Torres. A minuta do golpe é uma carta explicita de como funcionaria. E recentemente sai uma matéria também dizendo que ele se reuniu secretamente com ministros do TSE que votavam com ele. Então, Bolsonaro procurava até por dentro do TSE ter também ali as condições, que é o que dizia a minuta, de fazer uma intervenção na Justiça Eleitoral e proclamar outro resultado eleitoral porque as urnas tinham sido falsificadas.

    E, com o caos gerado em Brasília que já vinha desde a diplomação do Lula e as concentrações nas portas dos quartéis, no dia 8, viria uma tropa lá de Goiânia de 1.500 pessoas, como agora o major Ailton [Barros] confessou junto ao ajudante de ordem do Bolsonaro [tenente- -coronel Mauro Cid], e ao coronel Élcio Franco, que era o segundo homem forte deles na saúde. Então, com isso, eles tinham um amplo esquema de projetar esse golpe. Bolsonaro sairia do Brasil e de lá continuaria com a intentona golpista. Ele também precisaria de um cartão falso de vacina. Disse que não precisava do cartão falso para entrar nos Estados Unidos. Mas para sair, precisaria. E a intentona golpista poderia levá-lo a sair dos Estados Unidos, como levantou várias vezes a hipótese.

    E, além disso, precisava provisionar recursos para isso. Então, agora a gente vê uma conta de R$ 600 mil e as joias que tentava reaver de milhões e milhões, algumas no sítio do Nelson Piquet e outras que tentou reaver da Receita Federal para ter aquilo como provisionamento de receita para a sua intentona golpista no exterior. Houve um planejamento evidente disso. Eu acho que a CPMI vai se debruçar sobre isso.

     

    Por isso essa narrativa deles de que o dia 8 de janeiro foi apenas um fato onde “patriotários” vieram para cá e ganharam facilidade para quebrar tudo e ponto final. Ora, não é uma narrativa historicamente condizente com a realidade dos fatos. Há aí também um negacionismo histórico. Acho que eles estão encrencados. Agora, com tudo isso que aparece, ficam na defensiva. Mais as contas da Michelle, as dele [Bolsonaro]. Por isso digo que estão “tremendo mais que vara verde”. Tenho dito aqui no governo que agora não é hora de a gente recuar de novo. Vamos com a CPMI, doa em quem doer e vai doer no Bolsonaro, com toda certeza.

     

    — As pessoas ficam dizendo e parte da mídia também, esses próprios golpistas, que o ministro Alexandre Moraes está tendo um protagonismo excessivo. Qual é a sua opinião? Está havendo uma certa leniência do Ministério Público Federal, que era quem tinha que estar encaminhando essas investigações? Isso também dificulta o restabelecimento da ordem democrática no Brasil?

    — Concordo, mas diria o seguinte: é claro, a gente não quer uma Justiça que extrapole os seus limites. A Lava Jato foi um péssimo exemplo. Hoje, estamos vendo que [Sergio] Moro e [Deltan] Dallagnol fizeram manobras usando o Judiciário para poder prender o presidente Lula e fazer uma interferência no sistema democrático. Fizeram, portanto, de forma autoritária. Foram desmascarados e a Lava Jato hoje está desmoralizada.

    E até tenho uma notícia para vocês, o Tacla Duran vai vir aqui para “botar uma pá de cal” no lavajatismo. Ele já aceitou o convite, consegui aprovar um requerimento na Comissão de Administração Pública com apoio da bancada do PT, e ele já disse que virá aqui e trará as provas contra Rosângela Moro, contra o Sergio Moro e contra o Deltan Dallagnol.

    Mas enfim, a Lava Jato foi um desserviço ao Poder Judiciário e ao Ministério Público. Foram eles agindo contra a democracia na política. Agora, você tem um outro lado da história, onde o Executivo, o Bolsonaro queria, evidentemente, dar um golpe.

    O Supremo, nesse caso, foi resistência. É preciso entender o papel do Alexandre Moraes nesse sentido. Ele agiu dentro das prerrogativas do Poder Judiciário para garantir o sistema democrático, completamente distinto. E houve, sim, tanto uma não ação do Ministério Público, essa de forma absurda, o procurador [Augusto] Aras, no mínimo, omisso quando não agiu para sepultar ações que deveriam ter sido feitas, como o próprio Poder Legislativo que, com o orçamento secreto e etc, deixou de colocar o impeachment para ser votado e várias CPIs que poderiam ter sido feitas contra o Bolsonaro.

    Então, o Alexandre Moraes e o Supremo tiveram, vamos dizer assim, que ter um protagonismo maior diante da omissão de outros poderes. E o fez no sentido da defesa da democracia. Hoje, acho que isso é reconhecido e não fosse isso, tínhamos corrido realmente o risco de as Forças Armadas gostarem da ideia e aplicarem um golpe. Acho que devemos, sim, ao Supremo essa ação enérgica na defesa da democracia no Brasil.

     

    — Quais são os mecanismos que a CPI pode ter para realizar a investigação? Já existe uma estratégia com relação a qual caminho seguir?

     

    — Nossa estratégia é seguir os passos do que já foi apurado. Estamos com uma CPI em que grande parte já foi feita por ação, já temos cerca de 800 réus que fizeram depredação aqui em Brasília, todos bolsonaristas. Não foi encontrado um infiltrado. Então, a tese do infiltramento já era. Essa [tese] eles não têm condições de defender. Há 800 pessoas que são rés e todas bolsonaristas. A PF tem em relação a esses réus muito mais elementos que já foram colocados.

    E já tem também em andamento o processo dos financiadores. Eles já têm elementos para isso e que a CPI terá que utilizá-los. E há um processo contra o próprio Bolsonaro, aberto pela PGR. Uma das poucas coisas que o procurador-geral da República fez. Não foi o [Augusto] Aras, mas outros fizeram e abriram o processo para ver de quem é a responsabilidade intelectual da tentativa de golpe.

    Diria que a nossa estratégia, portanto, é seguir os passos do que foi feito, em especial pelo Supremo, pela Polícia Federal e até pelo Ministério Público. E temos também a CPI de Brasília, que é aqui com os deputados distritais, que também ouviram várias pessoas, alguns depoimentos importantes, outros não, mas todos consolidam a tese da tentativa de golpe. Então, acho que esse vai ser o nosso caminho.

    Temos mais poderes que podem também ajudar: quebra de sigilo fiscal, bancário e telemático de várias dessas pessoas: o general Heleno, general Braga Neto, o próprio Bolsonaro, Michelle Bolsonaro, os que estão envolvidos nisso podem ter sigilos quebrados pela Comissão Parlamentar de Inquérito, que pode ajudar também no processo investigativo da Polícia Federal e do Supremo Tribunal. Temos poderes importantes nesse aspecto e também do ponto de vista de dar à sociedade uma visão completa do que aconteceu.

    Não podemos chegar ao final desse período histórico depois da tentativa de golpe, como os Estados Unidos chegaram hoje. O [Donald] Trump está lá, livre, leve e solto, com alguns processos contra ele e outras coisas. Agora, recentemente, o Trump deu uma declaração absurda dizendo que o que aconteceu no Capitólio foi espetacular, que foi um processo de demonstração de vigor da democracia dos Estados Unidos, que estavam contestando o resultado eleitoral que tinha sido fraudado. Ou seja, o sujeito tentou um golpe, se voltou contra o processo democrático, denunciou fraudes eleitorais que não existiam nos Estados Unidos e agora, no final do processo, ele quer sair de herói, enaltecendo o processo golpista que ele na época incentivou.

    Você imagina se nós não colocarmos o Bolsonaro na cadeia e se essa CPI não colocar no relatório que ele foi o culpado por isso? Ele vai voltar daqui a quatro anos exatamente com o mesmo discurso de golpe, atentando contra a democracia. Então, às vezes me pergunto será que não sai como mártir? Acho que ele não pode sair é como inocente nessa história porque ele não foi. Acho que esse é um trabalho que temos que fazer, não só a CPMI, mas em especial o Supremo e a Justiça brasileira como um todo.

     

    — O senhor citou o Trump, o Bolsonaro se inspira no Trump, mas o Trump no processo eleitoral americano nunca foi acusado de fraudar o processo eleitoral. O Bolsonaro usou desbragadamente a máquina pública. Caco Barcelos, na Globo, logo depois da eleição, mostrou que Bolsonaro usou os programas sociais para captação de sufrágio. Se o Bolsonaro não se tornar inelegível, pela quantidade de crimes que cometeu no processo eleitoral, seria uma espécie de desmoralização para o Judiciário, não acha?

    — Com certeza. Outro aspecto que você colocou muito bem é o aspecto eleitoral, o aspecto do TSE e das urnas eletrônicas, porque se Bolsonaro não ficar inelegível, então aquilo que ele disse era a verdade. As urnas não são confiáveis, o processo democrático não é confiável. O que ele fez lá com os embaixadores falando que a nossa democracia era falha, que o voto não valia nada. Se não for punido por isso é evidente que a nossa democracia, o TSE, estará desmoralizado. Acho que tem os dois lados. Aquilo que eu disse, do ponto de vista do atentado contra a democracia, do autoritarismo, o fortalecimento do neofascismo de um lado e, do outro, o aspecto eleitoral que é a desmoralização das instituições de voto no Brasil, incluindo as urnas eletrônicas. Ele não pode, além de tudo, permanecer elegível. A elegibilidade dele seria uma vergonha e uma desmoralização das instituições democráticas das eleições no Brasil.

     

    — Existe uma questão que é próxima de tudo isso que é o PL das Fake News. Qual é a importância de se regular as plataformas digitais nesse momento tendo em vista tudo o que aconteceu e ainda acontece?

    — Muito importante. O [José] Guimarães pediu que eu, como vice- -líder, acompanhasse esse debate entre o relator Orlando [Silva] e também as posições do governo. E chegamos ali a um relatório bem avançado. Claro que dentro das possibilidades do que é o Congresso. E vocês têm acompanhado as dificuldades da aprovação. De um lado, temos os bolsonaristas que fazem da internet “terra de ninguém” e junto com as plataformas que acham que o lucro está acima de tudo e tudo pode ser feito. Partimos de outro pressuposto, de que o que é crime na vida real é também na vida virtual, então precisa de regulação. Os bolsonaristas não querem que se regule nada do ponto de vista de processo democrático. Eles proclamam uma falsa liberdade individual onde o indivíduo se sobrepõe ao coletivo. Mas isso não é democracia. Tudo tem regulação no processo de sociedade, quando se vive em sociedade. A humanidade tem que ter regulação para ter convivência. Então, cito o exemplo simples: quem gosta de um bom queijo mineiro, para ser produzido tem lá as suas regras sanitárias. E para se vender o queijo, idem. Ninguém pode sair no meio da rua vendendo queijo estragado. Isto é regulação. Se você está dentro de um bairro, de moradias e tem ali um restaurante, você pode tocar música ao vivo numa determinada altura, até às vinte e duas horas, depois não pode mais propalar aquele som, propagar aquele som altíssimo num bairro de moradia. Então, ali tem uma regulação.

     

    — A regulação é uma necessidade.

    — Ora, se as coisas mais simples têm regulação, vender um cachorro quente, por que as plataformas não têm que ser reguladas? Elas que vão envolver milhões e milhões de pessoas no Brasil e pelo mundo afora e bilhões e bilhões de recursos no Brasil e trilhões de recursos pelo mundo afora? Por que essas plataformas não têm que ser reguladas? Lá vale tudo? Esta regulação é necessária e esse é um debate que está tendo no mundo todo. A Europa, os principais países já discutem a regulação, muitos já têm e a própria União Europeia fez essa discussão no parlamento e fez orientações, restrições e normas. Isso foi discutido inclusive com as plataformas. Agora, aqui no Brasil não querem sequer fazer um debate do que pode ou não pode ser feito.

    Então, estamos trabalhando numa regulação que não tem nada de censura. Ninguém, por postar alguma coisa, é censurado. Ninguém. Então, o usuário do serviço da internet não está sujeito a nada, ser retirado por causa de censura. A plataforma, se propagar assuntos que são crimes, e nós vamos listar os principais, aí sim, e se negar a retirar, vai ter punição. Por exemplo, violência nas escolas para crianças e adolescentes ou ainda mutilações de menores, incentivo a suicídio. Quem propagar isso na internet e for instada a retirar por ser crime e não o fizer, vai ganhar multa podendo até ser fechada se não respeitar a legislação. A mesma coisa em relação a discursos de ódio e de racismo, preconceito de gênero, com relação à saúde pública, ficar dizendo que vacina causa Aids, incentivar a não vacinar no período de pandemia… Ora, essa plataforma não pode continuar fazendo isso ou propagar discurso de ódio e atentar contra o sistema democrático, golpe militar, a intervenção das Forças Armadas… Isso tem que ser retirado.

    É nesse sentido que estamos fazendo a regulação e muito dela através de auto-regulação, as próprias plataformas participam do processo, daquilo que deve ser feito e retirado. E o indivíduo que utiliza a internet, vai ter também o direito de fazer sua defesa. Se a plataforma não retornar e começar a fazer censura, também será multada. Então, há aí a defesa também do direito de dar suas opiniões. O projeto de lei é, nesse sentido, muito correto. A aprovação aqui cria dificuldades. E para os bolsonaristas. Esses querem fazer dali “terra de ninguém”, publicar o ódio, a violência, etc. E as plataformas ganham dinheiro com isso.

    Colocamos um ponto importante: se está recebendo para divulgar notícias de compartilhamento é também responsável por aquele conteúdo e será punida. Não há nada contra a crença religiosa no projeto, nada disso. Mas disseminaram isso por uma parte de pastores, deputados evangélicos se proclamarem contra, sem razão. Já discutimos com a bancada evangélica. Mas estamos esperançosos e querendo muito que isso volte à votação e que a gente consiga fazer a regulação da internet. Isso é bom para a democracia, para o sistema eleitoral brasileiro também e para segurança de quem quer usar a internet. Não dá para a gente deixar nossos filhos, netos, a juventude, sem uma defesa, sem regulação. É uma discussão mundial. •

     

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