Entenda as diferenças entre as vacinas de covid-19 em desenvolvimento
Mais de 200 vacinas de covid-19 estão em desenvolvimento. Algumas em estágio mais avançado, duas delas em testes no Brasil. Conheça o processo de pesquisa desses imunizantes
Da Redação da Rede Brasil Atual – Os estudos sobre vacinas contra a covid-19 avançam em uma investida inédita da ciência mundial. Diferentes laboratórios estão próximos à obtenção de fármacos seguros, em tempo recorde. A velocidade tem relação com a necessidade. A pandemia é a crise sanitária mais séria do mundo em mais de 100 anos, e já deixa mais de 1.350.000 mortos e 56 milhões de casos de covid-19.
São mais de 200 vacinas de covid-19 em estudo, sendo que 11 estão em fase final de testes. São quatro fases que compreendem o protocolo científico de desenvolvimento dos imunizantes. Trata-se de um caminho para averiguar eficácia do produto, segurança em humanos, efeitos colaterais, porcentagem de eficácia, entre outras.
As fases são: ‘Pré-clínica’, testes in vitro com estratégias e ideias. Ainda nesta fase, realizam-se testes em animais; ‘Fase 1’, verificação se as vacinas de covid-19 são seguras em humanos, com aplicação em número muito reduzido de voluntários; ‘Fase 2’, testes com algumas centenas de pessoas para averiguação se o fármaco estimula a produção de anticorpos. Também nesta fase se verificam dosagem e efeitos colaterais; ‘Fase 3’, são vacinadas milhares de pessoas para atestar a segurança e eficácia no mundo real. Testam em paralelo um grupo de controle que toma placebo, para atestar a eficácia das vacinas de covid-19.
As vacinas
No Brasil, existem acordos de parcerias com duas vacinas de covid-19. O estado de São Paulo, por meio do Instituto Butantan, participa dos testes da Coronavac, elaborada em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac. Existe uma parceria para transferência de tecnologia entre os países. Atualmente já existem resultados das fases 1 e 2 que apontam para 97% de impacto positivo na produção de anticorpos. A fase 3 caminha com grande expectativa de sucesso. A qualquer momento podem sair os resultados de eficácia.
A outra vacina de covid-19 promissora e em testes no Brasil é produzida pela farmacêutica Astrazeneca, em parceria com a Universidade de Oxford e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Também deve ser produzida no país. A Fiocruz já prepara as fábricas para produção do medicamento em grande escala. Após resultados positivos nas fases 1 e 2, o veredicto final da fase 3 é esperado até o Natal.
Outras vacinas de covid-19 já demonstraram sucesso, mas não existe expectativa da distribuição no Brasil (pelo menos nos primeiros lotes). Entre elas, é possível citar as das norte-americanas Moderna e Pfizer. São medicamentos com tecnologia avançada que já mostram resultado positivo. A expectativa é de iniciar a aplicação massiva até o final do ano na Europa e Estados Unidos.
Diferenças
Essas vacinas são essencialmente diferentes. As diferenças vão para além do país de origem dos estudos. A composição delas e processo de produção é diferente, como explica a neurocientista Mellanie Fontes-Dutra, em uma publicação para a Rede Análise Covid-19; um coletivo multidisciplinar dedicado à coleta, análise, modelagem e divulgação de dados sobre o novo coronavírus. Confira os principais imunizantes, conforme publicado pela cientista:
Coronavac
Tecnologia: vírus (SARS-CoV-2) inativado (CoronaVac)
Estudos pré-clínicos: Foi uma das primeiras candidatas à vacina a demonstrar proteção em primatas não-humanos contra o SARS-CoV-2. Os animais que receberam a dose mais alta, tiveram a melhor resposta. 7 dias após receber a vacina, o SARS-CoV-2 já não era mais detectado na faringe ou nos pulmões.
Estudos clínicos de fase 1/2: A CoronaVac foi bem tolerada, demonstrando um perfil de segurança adequado. A maioria das reações adversas enquadrou-se como leve. Além disso, a CoronaVac mostrou boa imunogenicidade, induzindo 92,4% de soroconversão no esquema do Dia 0-14 (2 doses) e 97,4% no esquema do Dia 0-28. A segurança e imunogenicidade favoráveis de CoronaVac foram demonstradas em ambos os esquemas. Em 16 de setembro, eles registraram um ensaio de Fase 1/2 da vacina para crianças. O artigo de fase 1/2 foi publicado em 17 de Novembro corroborando os dados do preprint e reunindo as informações obtidas anteriormente. Em 18 de Novembro, a AstraZeneca/Univ. Oxford publicou na The Lancet seus dados de fase 2/3, apresentando dados em três grupos: 18-55 anos, 56-69 anos e acima de 70 anos. Uma boa imunogenicidade foi observada entre os três grupos (bons títulos de anticorpos IgG, dos quais a presença de anticorpos neutralizantes), bem como de células T). Eventos adversos leves foram observados naque naqueles que receberam a ChAdOx1 nCoV-19, e de natureza semelhante às relatadas anteriormente (dor no local da injeção, sensação de febre, dores musculares, dor de cabeça). A ChAdOx1 nCoV-19 parece ser melhor tolerada em adultos mais velhos do que em adultos mais jovens (mas no geral ela é bem tolerada por todo mundo analisado) e tem imunogenicidade semelhante em todos os grupos de idade após uma dose de reforço.
Estudos clínicos de fase 3: No mês de julho a Sinovac então lançou um teste de Fase 3 no Brasil,seguido por outros testes realizados na Indonésia e na Turquia. O governo chinês aprovou a CoronaVac para uso emergencial na China para pessoas em empregos de risco relativamente alto, incluindo trabalhadores da área da saúde, inspetores de portos e funcionários do serviço público. Em 9 de novembro, a ANVISA anunciou a suspensão temporária do estudo clínico da Sinovac para investigar um evento adverso observado. Dois dias após o anúncio, o ensaio foi retomado por constatação de não haver relação do evento com o imunizante.
Desafios e próximas etapas: Sinovac se prepara para fabricar a vacina para distribuição global, chegando a um acordo para fornecer à Indonésia pelo menos 40 milhões de doses até março de 2021. Em setembro, o CEO da Sinovac disse que a empresa planeja a distribuição mundial do vacina no início de 2021 – incluindo os Estados Unidos. Vacinas inativadas, em geral, devem ser mantidas entre 2ºC a 8ºC para manterem-se estáveis.
E o Brasil? O instituto Butantan solicitou a importação de 6 milhões de doses da CoronaVac, no entanto, a distribuição das doses, ainda sem registro, depende de autorização da própria Anvisa. Além disso, também foi autorizada a importação de matéria-prima para a produção da vacina. Há acordos de compra e transferência com a CoronaVac, além da AstraZeneca, por parte do Brasil, totalizando 256,4 milhões de doses das 2 vacinas.
AstraZeneca/Oxford
Tecnologia: Vacina baseada em adenovírus (ChAdOx1)
Estudos pré-clínicos: A ChAdOx1 apresentou perfil imunogênico em camundongos e mostrou uma resposta humoral robusta e mediada por células. Dados similares também foram observados em primatas não-humanos. Ainda, foi demonstrada uma neutralização viral no trato respiratório inferior, mas não foram percebidas diferenças no trato respiratório superior, em relação ao grupo controle.
Estudos clínicos de fase 1/2: ChAdOx1 apresentou perfis de segurança e imunogenicidade adequados, com a indução de respostas imunes humorais e celulares.
Estudos clínicos de fase 3: A vacina iniciou os testes de Fase 2/3 na Inglaterra e na Índia, bem como no Brasil, África do Sul e nos Estados Unidos. Em 6 de setembro, a AstraZeneca interrompeu os testes globais da vacina para investigar um participante que desenvolveu uma forma de inflamação chamada mielite transversa. Em uma semana, o evento foi investigado e a Astrazeneca emitiu nota dizendo que esse acontecimento era improvável de estar relacionado à vacina, e os testes retomaram em todos os países, exceto nos Estados Unidos. Enquanto isso, um jornal no Brasil noticiou, em 21 de outubro, que um participante morreu de COVID-19, no entanto, ele havia recebido o placebo, sem envolvimento do ocorrido com o imunizante. Atualmente, o ensaio está em andamento.
Desafios e próximas etapas: Segundo a desenvolvedora, no início de 2021, a farmacêutica terá prontos 3 bilhões de doses de vacinas e acredita que terá autorização para comercializá-las. Ainda não houve manifestações formais em relação à necessidade de de que haja algum tipo de refrigeração, mas essa necessidade é prevista. Essa vacina requer a aplicação de duas doses.
E o Brasil? No Brasil, acordos com a AstraZeneca para a compra e transferência de tecnologia para produção local estão em andamento. Se espera que sejam produzidas 30,4 milhões de doses da vacina pela Bio-Manguinhos, laboratório da Fiocruz ligada ao Ministério da Saúde.
Moderna
Tecnologia: Vacina de RNA mensageiro
Estudos pré-clínicos: Permitiram a identificação de anticorpos neutralizantes contra o SARS-CoV-2 em primatas não-humanos, protegendo as vias aéreas superiores e inferiores da infecção viral.
Estudos clínicos de fase 1/2: Resultados demonstraram bom perfil de segurança entre os participantes analisados, sendo capaz de induzir respostas imunológicas contra o SARS-CoV-2 na forma de regime de duas doses (após a segunda dose, maior resposta).
Estudos clínicos de fase 3: Etapa com 30.000 pessoas vacinadas para o imunizante ou placebo. Dados da análise interina mostram uma eficácia de 94.5% analisando 95 eventos (casos de infecção pelo SARS-CoV-2 nos participantes). Desses 95 eventos, 90 receberam placebo e 5 receberam a vacina. É necessário contabilizar o restante de eventos necessários para completar a análise (em torno de 150 eventos). Todos os indivíduos que apresentaram quadros graves de infecção (11) foram no grupo placebo, mostrando que a vacina também pode proteger contra o agravamento da doença. Os resultados apresentam bons indicativos de segurança, nenhum evento adverso, incluindo participantes de idade superior a 65 anos e pessoas com comorbidades.
Desafios e próximas etapas: Distribuição das vacinas: necessita de baixas temperaturas para manter a estabilidade da vacina, que pode ser conservada por 30 dias em refrigeração (abaixo de 5ºC), e 6 meses caso seja congelada (-20ºC). A Moderna também entrará com um pedido de Aprovação para Uso Emergencial nas próximas semanas. A vacina requer aplicação de duas doses.
E o Brasil? Há acordos em andamento, tendo em vista a participação do Brasil no Covax (Fundo de Acesso Global à Vacina para COVID-19). Desafios na distribuição dessa vacina em território nacional, bem como na aquisição de doses suficientes também entrarão em pauta.
Pfizer + BioNTech
Tecnologia: vacina de RNA mensageiro
Estudos pré-clínicos: Estudos com primatas não-humanos mostraram-se promissores, com fortes efeitos antivirais contra a infecção de SARS-CoV-2. A vacina foi capaz de prevenir a infecção pulmonar e nas vias aéreas superiores e inferiores dentro de 3 dias após a infecção. Também foi capaz de induzir anticorpos neutralizantes e células T CD4+ e CD8+ específicas para elementos do SARS-CoV-2.
Estudos clínicos de fase 1/2: São 2 propostas de vacinas de covid-19 analisadas (BNT162b2 e BNT162b1), a primeira associada a uma menor incidência e gravidade de reações adversas, especialmente em adultos mais velhos. Ambas apresentaram boas quantidades de anticorpos neutralizantes, bem como a presença de células T CD4+ e T CD8+. A BNT162b2 foi a escolhida para dar seguimento à fase 3.
Estudos clínicos de fase 3: Inicialmente foram 30.000 voluntários nos Estados Unidos e em outros países (incluindo Argentina, Brasil e Alemanha). Em um estudo preliminar, foram reportados efeitos colaterais leves a médios após a primeira dose nos participantes. O estudo hoje expandiu-se para 43.000 participantes, incluindo crianças a partir dos 12 anos. A Pfizer+BioNTech foi a primeira empresa a anunciar dados da análise interina de sua vacina de covid-19 candidata, apontando para uma eficácia de 90%, analisando 94 eventos. Para confirmar sua taxa de eficácia, a Pfizer continuará o estudo até que haja 164 eventos contabilizados entre os participantes. Em 18 de Novembro, a Pfizer anunciou que sua candidata à vacina para o SARS-CoV-2 apresentou 95% (162 de 170) de eficácia, em uma análise de 170 eventos entre os participantes do estudo. Além de conferir eficácia, a vacina também foi capaz de prevenir o agravamento da covid-19, em que dos 10 eventos graves de covid-19, 9 foram no grupo placebo. Em idosos (acima de 65 anos, compreendendo 41% dos participantes), a eficácia observada foi de 94%. Essa análise contou com participantes de idade entre 56 e 85 anos, com uma diversidade étnica de 42%. O pedido de aprovação deve ser enviado ao FDA nos próximos dias, podendo se tornar a nossa primeira vacina aprovada para a covid-19.
Desafios e próximas etapas: Distribuição: a vacina de covid-19 precisa estar em temperaturas muito baixas (-70ºC) para seu transporte e armazenamento e a empresa estará testando formas de distribuição e melhorias em 4 estados dos EUA ainda neste mês. A vacina requer de duas doses.
E o Brasil? Em um primeiro momento, a produção vacinas de covid-19 vai se concentrar em três fábricas nos Estados Unidos e duas na Alemanha e, posteriormente, poderá haver transferência de tecnologia para produção em outros países, como o Brasil, em que já ocorreram contatos iniciais com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Em relação ao preço da vacina de covid-19, é possível que haja três faixas diferentes de preços, que irão depender do desenvolvimento de cada país. Desafios na distribuição dessa vacina em território nacional, bem como na aquisição de doses suficientes também devem entrar em pauta.
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