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    Copom define Selic enquanto gasto do governo com juros da dívida pública bate maior valor mensal em dois anos

    Taxa básica de juros influencia gasto estatal com a dívida brasileira, que comprime investimentos essenciais por estar diretamente relacionada à Selic

    Banco Central, Roberto Campos Neto e Lula (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil | Geraldo Magela/Agência Senado | REUTERS/Ricardo Moraes)

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    Vinicius Konchinski, Brasil de Fato - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) define no final da tarde desta quarta-feira (31) o patamar da taxa básica de juros da economia nacional, a Selic. Em sua última reunião, em junho, o comitê decidiu manter a taxa em 10,5% ao ano. Naquele mesmo mês, o setor público brasileiro gastou R$ 94,9 bilhões só com os serviços financeiros de sua dívida, que está diretamente relacionada à Selic.

    O gasto, divulgado pelo próprio BC na segunda-feira (29), é o maior já registrado em um mês desde junho de 2022. É também mais que o dobro do registrado em junho do ano passado (R$ 40,7 bilhões) e 27% maior do que o verificado em maio (R$ 74,4 bilhões).

    Com o valor empregado para custear somente os juros mensais da dívida pública, o governo federal poderia pagar os R$ 1.412 de Benefício de Prestação Continuada (BPC) durante um ano a quase todos os 5,9 milhões de idosos beneficiários do programa.

    O Orçamento previa um gasto de R$ 103,4 bilhões com o BPC neste ano. Neste mês, ele atualizou suas estimativas e elevou esse gasto para R$ 111,4 bilhões. Considerando isso, decidiu bloquear R$ 15 bilhões em despesas para conseguir cumprir com suas metas fiscais de 2024.

    Enquanto o governo corta gastos, segundo o BC, uma queda de 1 ponto percentual na Selic mantida por um ano reduziria a dívida líquida do setor público em R$ 51 bilhões. Uma queda de 0,5 ponto teria um efeito proporcional, reduzindo a dívida em cerca de R$ 25 bilhões.

    Peso da Selic - A Selic é uma taxa de referência para economia nacional e para os títulos da dívida que o governo emite para financiar suas atividades. Isso significa que, quando ela sobe ou desce, isso também influencia no gasto com juros e até no valor total da dívida brasileira.

    Desde de que assumiu a Presidência, em janeiro de 2023, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reivindica a queda da Selic. Naquela época, a taxa estava em 13,75% ao ano. Em agosto, começou a cair paulatinamente até chegar a 10,5% ao ano em maio.

    Ainda assim, o gasto do Brasil com juros da dívida pública ainda é crescente. Isso porque boa parte dos títulos têm longos prazos de vencimento. Um investidor que compra um título prefixado do governo remunerado por 13,75% ao ano passará todo o período de validade do título sendo remunerado por este índice, mesmo que a Selic venha a cair.

    Em junho, o gasto acumulado de 12 meses do governo com juros chegou a R$ 835 bilhões. Isso é o maior valor já registrado pelo BC desde 2002, desconsiderada a correção monetária. Na comparação com os 12 meses anteriores, houve um crescimento de 30%.

    "O gasto com juros está intimamente ligado à taxa", explicou Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento. "Além disso, com maior taxa de juros, você tende a aumentar também o valor total da dívida."

    Em junho, a dívida bruta do governo alcançou o equivalente a 77,84% do PIB (Produto Interno Bruto) do país. Este é o maior nível desde novembro de 2021, quando ela atingiu chegou a 78,2%. Em 2020, durante a pandemia, ela chegou a 87,7%.

    Paradoxo - Cantelmo acrescentou que tal situação cria um paradoxo. Enquanto o Copom e o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sinalizam que a Selic não pode cair por conta da alta de gastos do governo e os riscos de descumprimento da meta fiscal, a manutenção da taxa aumenta o gasto com juros e cria mais riscos para as contas.

    "É no mínimo curioso. O discurso corrente pede corte de gastos para redução da dívida. Mas aquilo que afeta mais diretamente a dívida é o custo dela, é a taxa de juros", ironizou.

    Maurício Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), acrescenta ainda mais contradições a essa situação.

    Ele lembrou que a Selic serve como referência para as taxas dos títulos da dívida pública. A taxa efetiva é definida no mercado, por oferta e demanda. Se investidores dispostos a emprestar dinheiro ao governo estão mais confiantes quanto à capacidade de pagamento do Brasil, aceitam uma remuneração menor. Caso a confiança seja menor, exigem uma remuneração maior, cobrando juros mais altos.

    Weiss afirmou que, recentemente, Campos Neto tem, ele mesmo, levantando desconfianças sobre a sustentabilidade das contas públicas em conversas com agentes do mercado financeiro. Ele, portanto, pressiona pelo aumento do gasto do Brasil com juros.

    Weiss acrescentou que fatores externos também pressionaram os juros por aqui. "Há a manutenção da taxa de juros dos Estados Unidos, tem toda essa incerteza eleitoral por lá. Os países emergentes estão sentindo isso", disse ele. "Mas isso foi reforçado por declarações do Campos Neto."

    Críticas e protestos - Nesta terça-feira (30), Campos Neto foi alvo de protestos realizados por centrais sindicais em 11 capitais do país pedindo um corte da Selic.

    O presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes, disse que Campos Neto, que foi nomeado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tem adotado uma postura política em frente ao BC. Também reclamou dos juros.

    "Ele optou pessoalmente por um posicionamento político. Se acabarem com a autonomia do Banco Central, o 'mérito' vai ser todo do Campos Neto", disse Gomes, lembrando que o presidente do BC votou em 2022 vestindo uma camisa da seleção brasileira.

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