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    Aposta do Brasil no agronegócio é um desastre econômico e ambiental, diz Ladislau Dowbor

    Em entrevista ao programa Ecologizando 247, o economista, professor e escritor Ladislau Dowbor discorre sobre a economia brasileira, sua relação com o meio ambiente e o impacto do agronegócio na descapitalização do país. Assista

    Ladislou Dowbor / agronegócio (Foto: Felipe L. Gonçalves/Brasil247 | ABr)

    Por Victor Castanho –  Em entrevista ao programa Ecologizando 247 da TV 247 no último domingo (06/06), o economista Ladislau Dowbor, professor titular de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, consultor de diversas agências das Nações Unidas, enfrentou com coragem um problema central da economia brasileira: a sua dependência em relação ao agronegócio voltado para a exportação nos moldes atuais. “A orientação do Brasil à agroexportação é um desastre ambiental, que não rende nada para o País e entrega a política para o interesse global de multinacionais de commodities”, diz o economista.

     

    Circuito do agronegócio e interesses de grandes empresas

    O também professor titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo aponta que o agronegócio atualmente depende de um circuito insustentável que se perpetua nas bordas da Amazônia. O professor detalha o passo-a-passo:

    1. “Inicialmente o garimpo se instaura em um local e promove a desagregação do sistema legal abrindo as portas para o desmatamento”, diz Ladislau. Nessa etapa, o professor afirma que a grilagem e o garimpo forçam a expansão ilegal dentro de áreas protegidas.
    2. A segunda etapa consiste na retirada de madeira e queimada da floresta: “Depois da extração ilegal da madeira, realiza-se uma queimada para que as cinzas sejam incorporadas ao solo, permitindo algumas safras muito boas de soja”, diz Ladislau. “Isso interessa aos grupos do agro e da comercialização da commodity de grãos internacional porque é um processo barato mas que esteriliza o solo pois se tem erosão hídrica, erosão eólica e erosão química e a formação dos solos amazônicos é frágil”, afirma Ladislau.
    3. Após as colheitas, recomeça-se o ciclo com o garimpo e “vai-se desmatando e queimando mais e mais”, diz o economista. 

    Os danos ambientais são claros e o crescimento do PIB é ínfimo. Por quê? “No Brasil existe a lei Kandir, [que faz com que] a agroexportação não gere impostos”, responde o professor. Ainda acrescenta: “Você precisa de 200 hectares de soja para gerar um emprego. Ou seja, geram-se pouquíssimos empregos. Porém, são gerados desastres ambientais, tanto pelo desmatamento quanto pela contaminação por agrotóxicos”. Além disso, essa ênfase na primarização da economia previne um projeto de industrialização que poderia ocorrer no próprio agronegócio.

    O professor aponta os maiores beneficiados por esse processo: “São 16 grupos que controlam no mundo o sistema de comercialização de commodities”. Entre eles está o grupo BlackRock que vem investindo fortemente no Brasil nos últimos anos. “Os ativos [desse grupo] totalizam 8,7 trilhões de dólares, segundo dados de 2021. Isso é 5 vezes o PIB do Brasil em uma empresa!”, aponta Ladislau.

    Nesse contexto de exploração insustentável, o economista, que já orientou setores da ONU, afirma: “Em termos propriamente econômicos, o que a gente está fazendo é uma descapitalização”. 

     

    Descapitalização do Brasil e os moldes atuais do agronegócio
    “Quando perdemos, só nas regiões do semiárido, 73 mil quilômetros quadrados de solo por ano, o está se perdendo? O capital. Estamos reduzindo nossa capacidade de produção”, cauciona. Ao tratar da economia como subsistema de um todo ecológico, o economista demonstra que é impensável falar do campo econômico sem levar em conta a capacidade do meio ambiente de recuperação. Como exemplo cita a sobrepesca: “quando liquidamos a vida nos mares (os recursos haliêuticos) pescando mais do que a capacidade de reprodução das espécies, estamos descapitalizando, deixando de produzir no futuro”. Se continuarmos nesse ritmo, o professor afirma que estaremos “comendo nosso futuro”. O economista cita o livro Killing the Host: how financial parasites and debt destroy the global economy de Michael Hudson e traça um paralelo com a situação ambiental do País. Embora o livro trate sobretudo da financeirização da economia, a ideia the “killing the host”, ou seja, de morte do hospedeiro através de sua exploração insustentável, exemplifica o processo insustentável do agronegócio: estamos matando o solo, nossa maior fonte de capital tentando extrair seus recursos.Segundo um estudo publicado no periódico científico Science por pesquisadores da Universidade de Cornell, cerca de 12 milhões de hectares são destruídos e abandonados anualmente por causa de práticas agrícolas insustentáveis. A esterilização do solo em escala frenética previne o crescimento de lavouras, florestas e outros sistemas bióticos e descapitaliza o território. Ainda, segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, a produção per capita de grãos, que é responsável pela alimentação de 80% do mundo, vem diminuindo desde 1984 devido à erosão insustentável do solo e, segundo o livro Land Degradation de Christopher J. Barrow, só na América do Sul, entre 30 e 40 toneladas de solo por hectare são erodidas por ano. Ladislau denuncia esse processo e afirma: “isso aqui está indo para o brejo. É uma catástrofe para os nossos filhos e nossos netos”.

    “A agroexportação em si não é ruim”

    Apesar das duras críticas ao atual modus operandi do agronegócio, o economista sustenta: “A agroexportação em si não é ruim”. “[No mundo], estamos saindo da era da agroindústria nos moldes da Revolução Verde e entrando na era da agricultura de precisão que leva em conta os impactos sobre a água, os impactos ambientais e coisa do gênero”, acrescenta o professor. A Revolução Verde a qual o professor se refere é o conjunto de inovações científicas dos anos 1960 que permitiram o aumento na produtividade agrícola através do uso intensivo de produtos químicos, modificação genética de sementes e massificação de lavouras. Embora tenha permitido a diminuição do preço de muitos alimentos, esse modelo causa uma exacerbada degradação ambiental e desgasta exageradamente recursos hídricos.

    “Os agricultores estão buscando outros rumos. Vale a pena refletir sobre essa discussão que está se dando no planeta a respeito dos sistemas de produção” diz Ladislau. Otimista, ainda diz: “Há, nesse setor, a consciência de que nós estamos destruindo a principal base da economia”.

    Ladislau pontua a alternativa para o circuito insustentável: “Uma coisa é você produzir soja e exportar soja. Agora outra coisa é você produzir soja [e] internalizar, substituindo importações, todos os insumos da produção da soja para que sejam produzidos aqui”. O professor enxerga a agroindústria ecológica como o futuro econômico desse setor: “Ao invés de se exportar soja, podemos exportar óleo de soja, farelo de soja, enfim, produtos derivados desse bem primário. É uma forma de nos industrializarmos”.

    O professor ainda cita a lei Kandir e demonstra que, embora vários países se interessem por nossos grãos, “esse dinheiro não volta para desenvolver o país, porque se transforma em lucros financeiros que se podem transformar em mais desmatamento da Amazônia revestindo esse sistema admnistrativo”.  Dando nome aos bois, o professor diz que “são 16 empresas grupos que controlam no mundo o sistema de comercialização de commodities” e aponta a BlackRock como um desses. “Os ativos [desse grupo] totalizam 8,7 trilhões de dólares, dados de 2021. Isso é 5 vezes o PIB do Brasil em uma empresa”, diz Ladislau.

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