Youtubers bolsonaristas faturam mais de R$ 100 mil com informações do governo
Inquérito dos atos antidemocráticos, conduzido pelo STF, revela elos do “gabinete do ódio” com assessores da Secom. Entre os blogueiros abastecidos com informações privilegiadas, está o bolsonarista Allan dos Santos
Rede Brasil Atual - O governo de Jair Bolsonaro transformou os atos fascistas e pró-ditadura, do início deste ano, em uma indústria lucrativa para seus apoiadores e um canal, quase que oficial, contra as instituições democráticas. É o que mostra reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, divulgada nesta sexta-feira (4). De acordo com a publicação, youtubers bolsonaristas, investigados por promover essas manifestações contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso, usam de informações privilegiadas, saídas de dentro do Palácio do Planalto, para alimentar seus canais. O tráfico de informações garantiu a eles um faturamento superior a R$ 100 mil por mês.
A “convivência harmoniosa”, que expôs essas ligações entre youtubers bolsonaristas e o governo, é parte da conclusão do inquérito sigiloso – no qual o Estadão teve acesso – sobre os atos antidemocráticos. Aberto em abril pelo STF, o inquérito investiga a organização e o financiamento dessas manifestações. O documento sustenta que assessores da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) são interlocutores de youtubers que disseminam os discursos do “gabinete do ódio”.
Em depoimento à Polícia Federal, o assessor especial da Presidência Tércio Arnaud Tomaz, que tem acesso privilegiado a Bolsonaro, contou, por exemplo, que é o responsável por repassar vídeos do presidente a youtubers bolsonaristas. Ele também participa de um grupo no WhatsApp com influenciadores para “discutir questões do governo”. O nome de Tércio é ligado ao chamado “gabinete de ódio”, ala parlamentar acusada de estar por trás das chamadas fake news, discursos de ódio e ameaças nas redes. As investigações apontam o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) como o comandante da ala.
O lucro da militância digital
O também assessor especial Coronel Mauro Cesar Barbosa Cid admitiu ainda à Polícia Federal que, como “mensageiro de Bolsonaro”, ele leva e traz recados dos youtubers. O jornal o descreve como um “representante das demandas dos demais canais”.
Entre os blogueiros abastecidos com informações privilegiadas, está o bolsonarista Allan dos Santos, responsável pelo canal Terça Livre. Assim como o criador do canal Foco do Brasil, Anderson Azevedo Rossi, e o Folha Política, de Ernani Fernandes Barbosa e Thaís Raposo.
Rossi confirmou, em depoimento, que recebe ajuda de Tércio Tomaz para abastecer a página. Segundo o Estadão, entre março de 2019 a maio de 2020, ele faturou US$ 330.887,08. O equivalente a R$ 1,7 milhão. Na condição de “sócio”, Allan dos Santos disse receber R$ 12 mil por mês com o canal. Enquanto a Folha Política informou que o rendimento fica em torno dos R$ 50 mil a R$ 100 mil por mês. Ao todo, 11 canais são investigados pela disseminação de conteúdos contra as instituições.
Ainda segundo o Estadão, entre o período de manifestações antidemocráticas, de 1º de março e 30 de junho, os 11 canais aumentaram seus números de inscritos em 27%. Passando de 6,7 milhões para 8,5 milhões. Enquanto que de julho até o fim de novembro, quando já não havia mais protestos, os canais cresceram apenas 6%.
Em relatório de 9 de julho, a Polícia Federal constatou que “a propaganda de conteúdo extremista no campo digital culmina, de fato, em ações subsequentes: as manifestações reais contra o Estado Democrático de Direito, criando um ciclo que se realimenta, com a difusão das manifestações pelos canais de internet dos produtores, que, por sua vez, são alardeados e replicados em perfis pessoais de redes sociais de agentes do Estado, gerando mais visualizações (difusores)”, reproduziu o jornal.
Uso do dinheiro público
Para a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), a investigação “revela como funciona o lucrativo esquema da disseminação de fake news, ódio e ameaças na rede”, afirmou em seu Twitter. O senador Jean Paul Prates (PT-RN) anunciou também em suas redes que irá cobrar a apuração de “mais esse escândalo” na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News.
A deputada estadual Renata Souza (Psol-RJ) avaliou que há um “aparelhamento da Secom”, que chama de “absurdo”. A antropóloga e professora da Universidade de Brasília (UnB), Debora Diniz, ironizou que os “youtubers monetizam nos canais, ganham mais dinheiro e promovem mais ódio. O investimento inicial? Nossos impostos”. “O gabinete do ódio financia Youtubers odiosos com dinheiro público”, comentou também pelo Twitter.
No bastidores, as investigações estariam “atormentando” o presidente Bolsonaro, por “fechar o cerco à sua militância digital”. O inquérito ainda segue aberto.
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