Tudo sobre a história do bloqueio dos EUA contra Cuba
Fundador de Opera Mundi, jornalista Breno Altman relata a origem das sanções, sua escalada e as consequências sobre a ilha socialista
Opera Mundi - No programa 20 MINUTOS HISTÓRIA desta terça-feira (20/07), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, discorreu sobre o nascimento e funcionamento do bloqueio praticado há quase 60 anos pelos Estados Unidos contra Cuba.
Ele relembrou que, quando a Revolução Cubana triunfou, em 1º de janeiro de 1959, “ironicamente, o país se encontrava já sob um embargo parcial, decretado pelo governo Dwight Eisenhower contra a ditadura de Fulgencio Batista”.
Por aquele então, a Casa Branca queria se livrar do tirano que controlava Cuba com mão de ferro aliado à máfia ítalo-americana.
O embargo foi estabelecido em 1958, em plena insurgência guerrilheira, quando parte da elite político-militar dos EUA acreditava poder cooptar o movimento liderado por Fidel Castro para seus propósitos de “civilizar” o Estado cubano.
“Durante os primeiros meses de governo revolucionário, eram razoáveis as relações com a Casa Branca, mas Eisenhower não revogou o embargo de armas, o que levou Havana a seus primeiros contatos comerciais com o bloco socialista, então comandado pela União Soviética”, contou.
Assim, no final do primeiro ano da revolução, a situação começou a mudar com a decretação e a implementação da reforma agrária, que confiscou terras de vários empresários e latifundiários estadunidenses, e terras da família do próprio Fidel Castro.
“O governo Eisenhower reagiu com muita irritação, reverberando o ódio dos setores burgueses atingidos por aquelas medidas. A partir de abril de 1960, além do embargo de armas, fica claro que a intenção da superpotência capitalista era derrubar o governo revolucionário a qualquer custo”, argumentou Altman.
Os EUA então soltaram um comunicado recomendando sanções para impedir que recursos financeiros e mercadorias ingressassem em Cuba, com o objetivo de gerar uma situação de fome e desespero que levasse à derrubada do governo. “Estava desenhada, assim, a estratégia do bloqueio”, ressaltou.
Reação cubana ao embargo
Cientes da mudança de postura da Casa Branca, os cubanos passaram a comprar armas da URSS. Em represália, os EUA reduziram drasticamente, em somente dois meses, a importação do açúcar cubano, produto responsável por mais de 70% das receitas internacionais da ilha.
“A União Soviética respondeu a essa medida dando mais um passo na sua aliança com o governo de Fidel Castro, assumindo a compra do saldo que havia sido interditado por ordem executiva de Eisenhower, com base no Ato do Açúcar, de 1948”, agregou o jornalista.
Outras medidas foram sendo tomadas pela Casa Branca e ações militares começavam a ser estudadas, como afirmou Altman. Para ele, a decisão mais severa daquele período foi a proibição de exportação de petróleo para Cuba, “que passou a importar também esse item da União Soviética, pagando com a própria produção de açúcar”.
“O governo norte-americano retaliou novamente, por baixo dos panos, fazendo com que as três companhias petrolíferas estadunidenses sediadas na ilha se recusassem a refinar o petróleo soviético. O governo revolucionário não deixou barato: nacionalizou essas empresas, sem indenizações, incorporando-as a uma companhia estatal”, relatou.
A resposta de Eisenhower foi proibir a venda de quaisquer produtos norte-americanos a Cuba, com exceção de comida e remédios: “estava começando o bloqueio”.
Às vésperas de encerrar seu mandato, em janeiro de 1961, Eisenhower rompeu relações diplomáticas com a ilha e intensificou as sanções econômicas, além de deixar planejada o que viria ser conhecida, em abril de 1961, como a Invasão da Baía dos Porcos, uma ação militar dos grupos contrarrevolucionários com treinamento, financiamento e apoio logístico dos EUA, “fragorosamente derrotada pelos revolucionários cubanos”.
“Logo em seguida a essa importante vitória militar, Fidel declara o caráter socialista da revolução e oficializa seu alinhamento com a União Soviética”, narrou o jornalista.
“Humilhada”, a Casa Branca, governada já por John Kennedy, aprovou o Ato de Assistência Internacional, proibindo qualquer ajuda ou financiamento a Cuba e autorizando o presidente a impor bloqueio total contra o regime revolucionário.
Consolidação do bloqueio
“Além da proibição da exportação de bens e serviços a Cuba, com o Ato ficava proibida também a importação de quaisquer produtos cubanos ou mesmo de mercadorias provenientes de outros países que tivessem matéria-prima ou peças de origem cubana”, enfatizou Altman.
Ele enumerou outras medidas e emendas que seguiram o Ato, por exemplo proibindo que qualquer país desse ajuda ou financiasse Cuba, “terceirizando o bloqueio”. Kennedy também restringiu a venda de alimentos e medicamentos apenas àqueles que não recebessem subsídios governamentais.
As viagens de estadunidenses à ilha foram proibidas após a Crise dos Mísseis, em outubro de 1962. O governo ainda congelou todos os saldos bancários e propriedades de Cuba em território norte-americano.
“As relações comerciais e financeiras de Cuba com os EUA e os demais países capitalistas praticamente deixaram de existir, com a ilha se incorporando plenamente ao sistema socialista, através da integração ao COMECON – Conselho para Assistência Econômica Mútua -, liderado pela URSS. Sob esse modelo, Cuba iria estabilizar relativamente sua economia e encontrar fundos para desenvolver um forte estado de bem-estar social, especialmente serviços públicos e universais de qualidade em saúde e educação”, ponderou o jornalista.
Fim da URSS
Segundo Altman, durante quase 30 anos a URSS neutralizou parcialmente o bloqueio dando segurança aos cubanos, “o que fez com que dessem muito mais destaque à solução das questões sociais do que à diversificação da economia”.
“O fim da União Soviética, porém, levaria a um gravíssimo cenário nos anos 90, quando o bloqueio norte-americano volta a se fazer sentir com todas as forças”, lamentou.
Cuba teve uma queda superior a 30% de seu produto interno bruto entre 1991-1993, perdendo 70% de suas receitas em exportação e se vendo obrigada a cortar suas importações em mais de 50%, conduzindo a uma etapa de forte escassez, inclusive de produtos básicos e alimentos.
“Foi o chamado período especial, vigente até o final dos anos 90, quando Cuba abriu parcialmente sua economia para investimentos privados, especialmente em turismo, tratando de atrair os dólares e euros necessários a manter ativas suas compras internacionais, especialmente de energia e alimentos, obrigatoriamente pagos à vista, praticamente sem qualquer crédito, por conta das regras do bloqueio norte-americano”, explicou.
Para Altman, esse era o sinal de que Cuba “estava decidida a manter viva sua revolução e o sistema socialista, adaptando sua economia para esses objetivos”.
Os EUA, por sua vez, resolveram passar a uma nova ofensiva, aproveitando o cenário pós-soviético para tentar estrangular e derrotar a revolução cubana, reforçando o bloqueio.
Em 1992, George Bush aprovou duas leis que, além de transformar em normas legislativas as principais medidas do bloqueio, permitiam ao governo punir companhias estrangeiras que comercializassem ou fizessem operações financeiras com Cuba.
Relaxamento e recrudescimento do bloqueio
No entanto, “por pressão dos agricultores e fazendeiros estadunidenses, algum relaxamento foi estabelecido na comercialização de alimentos nos anos 2000, tanto no governo Clinton quanto na administração de Barack Obama, permitindo a venda de alimentos por razão humanitária, mas sempre com pagamento à vista”, ressaltou Altman.
Destacando o governo Obama, ele relembrou que as relações diplomáticas com a ilha chegaram a ser restabelecidas em 2014, inclusive com uma visita do presidente estadunidense à ilha.
“Foi um curto período de relaxamento do bloqueio, revertido quando Donald Trump chegou à Casa Branca e radicalizado durante a pandemia, sem que o governo Joe Biden tenha alterado esse comportamento”, enfatizou.
Trump adotou cerca de 250 medidas de recrudescimento do bloqueio entre 2017 e 2020.
Apesar da Assembleia Geral das Nações Unidas condenar o bloqueio, todos os anos desde 1991, com os EUA votando isolado, geralmente na companhia de Israel e alguns pequenos países, “a Casa Branca viu no novo coronavírus a oportunidade de, outra vez mais, apertar o garrote sobre a revolução cubana, seguindo a velha instrução de 1960: produzir fome e desespero para derrubar o governo revolucionário”.
Havana calcula que o bloqueio tenha custado ao país, nesses 60 anos, algo como 800 bilhões de dólares, em valores atualizados, o equivalente ao produto interno bruto cubano de três anos.
“Atualmente, representa o grande fator a explicar um novo período de escassez e dificuldades, base material para o mal-estar social que serve de base para os protestos que ocorreram e que são aproveitados pelos inimigos do governo cubano para tentar colocar um fim à revolução que teima em resistir”, concluiu.
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