Lula: "Sou um cara com possibilidade de ganhar no primeiro turno e tinha consciência que seria mira para todo mundo atirar"
Ex-presidente viu com naturalidade as agressões que recebeu no último debate antes das eleições
(Reuters) - Embates acalorados entre o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) marcaram o debate entre os presidenciáveis na TV Globo, na noite de quinta-feira, com troca de acusações de corrupção e ofensas, a três dias do primeiro turno da votação.
Em pouco mais de 40 minutos ao longo do primeiro bloco, Lula e Bolsonaro dominaram as falas, com as trocas de acusações e, consequentemente, os direitos de respostas em que mais acusações eram feitas. Lula recebeu quatro direitos de resposta e, Bolsonaro, três, o que levou ambos a ocupar a maior parte do tempo no bloco.
Foi o ponto mais tenso do programa que adentrou a madrugada nos estúdios da TV Globo no Rio, apontado como potencialmente decisivo na reta final da campanha e que marcou 30 pontos de audiência na Grande São Paulo -- o dobro do que a emissora obteve no mesmo horário há uma semana, segundo a Folha de S.Paulo.
"Mentiroso, ex-presidiário, traidor da pátria", disse Bolsonaro em um dos ataques diretos a Lula. "Nós não podemos continuar em um país das roubalheiras", acrescentou, depois de enfileirar uma série de referências a casos de corrupção do PT e acusações a Lula.
Em seu direito de resposta, Lula citou os escândalos de corrupção que vieram à tona no governo de Bolsonaro, como as acusações de que há esquema de rachadinha nos gabinetes de seus filhos, a investigação sobre a cobrança de propinas no Ministério da Educação e a revelação da compra de 51 imóveis com pagamentos em dinheiro vivo por sua família.
"O mínimo que se espera num debate é que o atual presidente tivesse seriedade e honestidade. Ele vem falar que eu montei quadrilha quando ele montou rachadinha. Ele precisava se olhar no espelho e saber o que está acontecendo no governo dele", disse Lula.
Depois do debate, Lula disse que ficou incomodado de parecer o "chato de galocha" por pedir seguidos direitos de resposta, mas disse que fez uso da medida porque tinha consciência de que seria alvo predileto dos adversário.
"Eu sabia que como sou um cara com possibilidade de ganhar no primeiro turno eu tinha consciência que seria mira para todo mundo atirar", afirmou.
O ex-presidente seguiu à risca a estratégia de sua campanha de não deixar acusações sem respostas, em um tom muito mais duro do que usou no debate da Band, onde a estratégia --criticada depois-- foi de não mostrar agressividade.
Já Bolsonaro chegou ao debate decidido a partir para o ataque, em um esforço para tentar garantir a realização do segundo turno. O presidente levantou até mesmo acusações infundadas de envolvimento de Lula no assassinato em 2002 do petista Celso Daniel, prefeito de Campinas.
O embate contra o ex-presidente fazia parte da estratégia de Bolsonaro para buscar uma arrancada final, segundo fontes da campanha do candidato à reeleição. O evento era tido como a última chance para Bolsonaro tentar ampliar o seu eleitorado e falar para fora da bolha bolsonarista, uma vez que ocorreu na emissora de maior audiência da TV aberta do país.
No entanto, quando Bolsonaro teve chance de fazer uma pergunta diretamente para Lula, ele optou por fugir do embate direto e escolheu Felipe D´Avila (Novo) para responder sobre consequências para a economia caso a esquerda volte ao poder.
A campanha do presidente avaliou após o debate que a estratégia de atacar Lula foi bem-sucedida e levou o petista a perder a cabeça, de acordo com uma fonte.
"PADRE DE FESTA JUNINA"
Na meta de centrar ataques em Lula, de toda maneira, Bolsonaro foi auxiliado pela dobradinha que fez com o candidato Padre Kelmon (PTB), que é do mesmo partido do ex-deputado Roberto Jefferson, aliado do presidente.
Além de permitir que o atual mandatário falasse de suas iniciativas no governo, Kelmon protagonizou um embate com o petista que derivou para um bate-boca -- o que levou a organização do debate a cortar os microfones.
Kelmon perguntou sobre corrupção a Lula, que, por sua vez, questionou se o candidato do PTB era padre ou se estava fantasiado. Em réplica, Kelmon disse que o petista é um "descondenado" e que não deveria ser candidato.
Lula afirmou após o debate que era preciso "alguém dizer alguma coisa" para Kelmon, a quem chamou de "candidato-laranja". A campanha do petista avaliou que, apesar do bate-boca, o desempenho de Lula foi positivo, com base em pesquisas qualitativas feitas pelo PT durante o debate com eleitores indecisos.
Kelmon, que não é padre da Igreja Católica, travou ainda embate com a senadora Soraya Thronicke (União Brasil), que tem se destacado ao longo da campanha, em especial nos debates, por lançar mão de frases de efeito. Em certo momento, a candidata disse que o adversário era "padre de festa junina". Funcionou: segundo levantamento da Quaest, o termo ficou entre os campeões de menções na internet.
Soraya também travou embate com Bolsonaro e perguntou se o presidente aceitará o resultado das urnas em caso de derrota, mas o candidato à reeleição não respondeu.
Analistas apontavam o debate da Globo como um marco decisivo da reta final da campanha num momento em que segue matematicamente possível a possibilidade de a disputa eleitoral pela Presidência ser definida já no primeiro turno, no domingo. Uma performance expressiva de um dos candidatos na TV Globo poderia, em tese, inclinar a balança.
Segundo pesquisa Datafolha desta quinta, Lula soma 50% dos votos válidos, contra 36% de Bolsonaro. Na segunda-feira, pesquisa Ipec havia apontado Lula com 52% dos votos válidos, contra 34% de Bolsonaro. Para ganhar no primeiro turno o candidato precisa de mais da metade dos votos válidos.
De acordo com monitoramento feito pela Quaest da repercussão do debate nas redes sociais, Lula e Bolsonaro lideraram as menções durante o debate, com 40% e 39%, respectivamente. Mas foi Ciro Gomes (PDT) quem teve o maior percentual de menções positivas, com 49,2%. Bolsonaro veio a seguir, com 49%, à frente de Tebet (45,2%) e Lula (43,5%).
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