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      Oliveiros Marques

      Sociólogo pela Universidade de Brasília, onde também cursou disciplinas do mestrado em Sociologia Política. Atuou por 18 anos como assessor junto ao Congresso Nacional. Publicitário e associado ao Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (CAMP), realizou dezenas de campanhas no Brasil para prefeituras, governos estaduais, Senado e casas legislativas

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      A realpolitik não é lugar de justiça

      A acusação é, por si só, reveladora do absurdo: Glauber reagiu à presença de um integrante de um movimento neofascista

      Glauber Braga (Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados)

      A votação no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, que aprovou o parecer pela cassação do mandato do deputado Glauber Braga (PSOL/RJ), é mais uma demonstração de que, na política como vista e praticada pela extrema-direita, não há espaço para a justiça. Ali, o que prevalece é a lógica da realpolitik: um conceito emprestado das relações internacionais, que define a política como movida por interesses próprios, muitas vezes mesquinhos, e não por valores éticos ou morais. Assim como nas guerras.

      Uma leitura atenta de Maquiavel revela essa concepção bélica da política. No capítulo XIV de O Príncipe, intitulado “Dos deveres do Príncipe para com suas tropas”, o filósofo italiano escreve: “Um Príncipe não deve ter outro objetivo ou pensamento, ou manter qualquer outra coisa como prática, a não ser a guerra, seu regulamento e sua disciplina.” A extrema-direita assimilou bem essa lição. Enquanto isso, setores da esquerda ainda parecem viver num mundo encantado, onde todos supostamente compartilham valores comuns, compromissos republicanos e o desejo de construir um país melhor — apenas com visões diferentes sobre como fazê-lo.

      O lavajatismo foi Maquiavel em estado bruto: interesses particulares lançados na arena pública com o objetivo de aniquilar o adversário e tomar o poder. Nada ali foi movido por princípios morais ou valores republicanos. Cada ação era pautada pela crueldade — esse traço essencial da guerra.

      O que foram, afinal, as “pedaladas” da presidenta Dilma, senão a aplicação da política real, nua, crua e cruel? Criaram um contorcionismo jurídico-discursivo para remover do cargo uma mulher eleita democraticamente, unicamente com o objetivo de encurtar o caminho rumo ao poder.

      Foi com a mesma lógica que se encaminhou o processo contra Glauber Braga no Conselho de Ética: eliminar um adversário político. Pode-se concordar ou não com seu conteúdo e com o estilo combativo de sua atuação parlamentar. Mas cassá-lo por isso é um escárnio, sobretudo quando tantos casos realmente dignos de punição são ignorados ou varridos para debaixo do tapete — tratados com olhos vendados e ouvidos moucos.

      A acusação é, por si só, reveladora do absurdo: Glauber reagiu à presença de um integrante de um movimento neofascista — sustentado por financiamentos de origem duvidosa — que invadia o espaço da Câmara dos Deputados para provocar, intimidar e constranger parlamentares com seu celular em punho, sempre buscando um vídeo que viralize. Neste caso, o provocador teria até mesmo mencionado a mãe do deputado. E ainda assim, Glauber é o punido.

      A realpolitik não comporta o que Hannah Arendt chamou de “a dignidade da política”: a capacidade humana de agir em conjunto, de construir um mundo comum. A política da extrema-direita não se sustenta na liberdade ou na responsabilidade. Enquanto a centro-esquerda e a esquerda não reconhecerem essa realidade e não enfrentarem seus adversários com a clareza e a dureza que esse quadro exige, continuarão acumulando derrotas.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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