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      Leônidas Mendes

      Professor de História

      33 artigos

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      A recriação das oligarquias: do clientelismo ao gospel-fascio-bolsonarismo

      As oligarquias nordestinas, pela experiência histórica da dominação e de controle do poder público, sabem se adaptar aos ventos do fascismo

      Numa obra, hoje considerada icônica sobre o tema (“O poder oligárquico na Paraíba: descontinuidade e recriação (1889-1945)”), a professora Eliete Gurjão fez um dos mais aprofundados estudos sobre as oligarquias paraibanas, seus mecanismos e práticas de dominação e reprodução de seu poder, tendo como referência o período que vai de 1889 a 1945.  

      No trabalho, a eminente historiadora destaca a capacidade que tiveram as oligarquias paraibanas (e, por referência, nordestinas e, mesmo, as brasileiras) de se rearticularem pós-Revolução de 1930, de redesenharem em seus instrumentos sócio institucionais de dominação e serem capazes de preservar seu poder político à margem e ao mesmo tempo associado ao discurso modernizador, inclusive criando profundos vínculos políticos e ideológicos com o Governo Vargas (1930-1945).

      Faço esta referência aqui porque, nas últimas semanas, muito temos ouvido falar sobre um suposto crescimento da aprovação do desgoverno e do despresidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Nordeste, especialmente junto às camadas mais baixas da população, atribuindo esta melhora ao pagamento do auxílio emergencial, que, aliás o dito era contra, mas do qual soube se aproveitar politicamente.

      Para entendermos os motivos que explicam essa melhoria da imagem do despresidente e da avaliação do seu desgoverno aqui, no Nordeste, é preciso que olhemos para os mecanismos de dominação utilizados pelas elites nordestinas, principalmente suas oligarquias, hoje urbanas, noutras épocas rurais; compreendermos como estas conseguem se readaptar, se readequando, mudando discurso “como camaleão de cor, mas sem deixar de ser camaleão”, aos momentos políticos do Brasil.

      Se tomarmos como exemplo mais uma vez a Paraíba, um dos principais polos do domínio oligárquico da história política brasileira, veremos que, nos mais diversos momentos em que se viram ameaçadas em seu poder e dominação, as oligarquias paraibanas souberam recriar, reinstrumentalizar práticas, discursos e as falas para preservar seu controle sobre as instituições do Estado.

      Inclusive, sabendo usar mecanismos de comunicação e difusão de ideologias, notícias e falácias (diríamos, “fake news”, atualmente), além das práticas clientelistas, do apadrinhamento, pelo parentesco, pelo compradrio, pelo favor ou pelo terror, junto à população.

      Um bom exemplo ocorreu na década de 1930 quando parte das elites paraibanas, sem nenhum pudor, aderiu aos discursos e práticas nazifascistas: o governador Argemiro de Figueiredo (1935-1940), oriundo das oligarquias campinenses, mandou colocar um piso de ladrilhos com a suástica nazista no terraço do Palácio da Redenção, sede do Governo do Estado.

      Outro exemplo da época ocorreu em Campina Grande, principal cidade do interior da Paraíba, e reconhecido núcleo de simpatizantes do nazifascismo; há quem diga que perdia apenas para Blumenau (SC). Pois bem, na década de 1930, Campina Grande assistiu a destacada atuação de uma das mais proeminentes organizações fascistóides do período: a “Sociedade Beneficente dos Artistas” (SBA), que agregava diversos grupos sociais em torno de bandeiras verde e amarelas e de lemas e bordões do Integralismo (AIB), versão tupiniquim do fascismo europeu.

      Agora, em 2020, na preparação para as eleições municipais de novembro próximo, as oligarquias campinenses tentam mais uma vez sua “recriação”. Articuladas em torno da aliança entre os Rodrigues Cunha Lima e os Ribeiro, indicaram um “rostinho novo” pra “dizer o mesmo com palavras diferentes” tentando renovar os nomes para manter as práticas de sempre: clientelismo e filhotismo, a “transformação sem mudança”.

      O nome ungido para defender os interesses oligárquicos foi o do suplente de deputado federal Bruno Cunha Lima (PSD). Este, ao apresentar-se como pré-candidato à prefeitura de Campina Grande, há alguns dias, frisou: “Campina Grande odeia o PT (observação: o PT não apresentou candidato a prefeito na cidade) e que (ele) vai defender o presidente Bolsonaro e o quer no (seu) palanque, assim como defenderá os valores cristãos e da família (dele?) (...)”. (Perguntar não ofende: convidará também o Pastor Everaldo e a Pastora Flordelis, também defensores das mesmas bandeiras?).

      Como podemos ver, as oligarquias nordestinas, pela experiência histórica da dominação e de controle do poder público, sabem se adaptar aos ventos do fascismo, bolsonarismo e/ou do neomoralismo gospelfascistóide, sem esquecer da manutenção do clientelismo. Talvez aí esteja uma das explicações para crescimento para aprovação do despresidente Jair Bolsonaro mais do que no auxílio emergencial.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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