Adolescência sequestrada por telas ganha voz na Netflix
Adolescência não é só uma série; é um alerta. Enquanto jovens giram na roda viva da modernidade, cabe aos adultos estender a mão para que não se percam no vazio
Lançada na Netflix, em 13 de março de 2025, a minissérie britânica Adolescência (título original: Adolescence) chega como um soco no estômago, um espelho incômodo da juventude contemporânea. Criada por Jack Thorne e Stephen Graham, e dirigida por Philip Barantini, a trama acompanha Jamie Miller, um garoto de 13 anos acusado de assassinar uma colega de escola. Filmada em quatro episódios em plano-sequência, a série não é apenas um drama policial, mas uma radiografia visceral dos desafios enfrentados por adolescentes em um mundo fragmentado, onde o real é sequestrado pelo virtual e o amadurecimento saudável parece uma utopia distante.
A adolescência hoje é um campo minado. Os jovens entre 12 e 16 anos navegam por uma roda viva de competições — sejam elas por popularidade nas redes sociais, sucesso acadêmico ou aceitação entre pares.
São como pássaros presos em gaiolas de espelhos, refletindo imagens distorcidas de si mesmos, moldadas por um consumismo agressivo que vende a ilusão de que a felicidade está na próxima compra, no próximo “like”.
Estatísticas alarmantes mostram o impacto desse ambiente nas famílias: no Brasil, segundo o IBGE, a taxa de divórcios subiu 75% entre 2000 e 2020, com cerca de 40% dos casais com filhos menores de idade se separando. Nos EUA, o Pew Research Center aponta que 50% das crianças crescerão em lares monoparentais.
Essas rupturas familiares frequentemente relegam os adolescentes a um plano secundário, enquanto pais lidam com suas próprias crises, deixando a guia e a educação dos filhos à mercê de telas e algoritmos.
O mundo virtual, com suas promessas de conexão instantânea, sequestra mentes imaturas que buscam preencher o vazio de pertencimento. É como se os jovens fossem náufragos agarrados a tábuas frágeis num mar de notificações, onde a validação vem em forma de curtidas e a solidão é mascarada por filtros.
Um estudo da Lancet Child & Adolescent Health (2025) revelou que, na Inglaterra, internações por automutilação entre adolescentes aumentaram 112,8% entre 2012 e 2022, muitas vezes ligadas à pressão das redes sociais.
Esse mal-estar é um grito mudo, um diálogo surdo entre gerações que não se entendem, abafado pelo ruído de expectativas inalcançáveis.
A série ‘Adolescência’ captura essa angústia com maestria. Jamie, interpretado por Owen Cooper, é um adolescente comum que se radicaliza em espaços tóxicos online, como fóruns incel, após ser humilhado por colegas. A série não romantiza nem condena; ela expõe.
A ausência de cortes na filmagem amplifica a sensação de urgência e desespero, como se estivéssemos presos na mente de Jamie, testemunhando sua queda. Os pais, vividos por Stephen Graham e Christine Tremarco, são figuras dilaceradas pela culpa e impotência, refletindo a realidade de tantas famílias que, entre fragilidades financeiras e prioridades desencontradas, perdem o fio da conexão com os filhos.
É um retrato cru de como políticas de Estado e dinâmicas sociais frequentemente ignoram essa faixa etária, deixando-a vulnerável a predadores virtuais e à competição desenfreada por status.
Para os que não se encaixam nos padrões — os impopulares, os de baixa autoestima —, o custo emocional é devastador. A série mostra isso ao explorar o bullying e a misoginia que corroem Jamie, um eco do que muitos enfrentam em silêncio. Mas há caminhos para apoiar esses jovens. Aqui estão cinco estratégias práticas:
- Ouvir sem julgar: Crie espaços seguros para que eles expressem inseguranças e ansiedades, mesmo que pareçam triviais.
- Limitar o virtual, fortalecer o real: Reduza o tempo de tela e incentive atividades presenciais, como esportes ou hobbies em grupo.
- Ensinar regulação emocional: Apresente técnicas simples, como respiração profunda, para lidar com a ansiedade.
- Ter mais tempo com eles: Reserve tempo diário para conversar, mostrando que eles são prioridade, não um peso.
- Criar uma agenda familiar: Reserve um ou dois dias por semana para os pais e filhos passarem tempo juntos — ir ao cinema, jantar em um restaurante, visitar uma livraria ou simplesmente tomar um sorvete, fortalecendo laços familiares não só entre os pais e os filhos, mas também entre os irmãos.
Adolescência não é só uma série; é um alerta. Enquanto os jovens giram na roda viva da modernidade, cabe a nós, adultos, estender a mão para que não se percam no vazio. A escola transmite conhecimentos, mas educar é a grande responsabilidade dos pais.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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