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      Luis Mauro Filho

      Luis Mauro Filho é jornalista e editor do Brasil 247.

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      Ao buscar um passado oitocentista idealizado, Trump pode fazer nascer um mundo verdadeiramente multipolar

      Medidas protecionistas recentes do presidente dos EUA desafiam a realidade da economia global interconectada

      Trump faz comentários sobre tarifas na Casa Branca 02/04/2025 (Foto: REUTERS/Carlos Barria)

      Washington, capital situada na costa leste do continente norte-americano, registrava temperaturas entre 12 e 15 °C neste início de primavera no hemisfério norte, quando Donald Trump reuniu jornalistas, assessores de governo, políticos do Partido Republicano e trabalhadores apoiadores de sua plataforma para anunciar o pacote tarifário mais impactante ao comércio mundial já imposto por uma potência hegemônica no último século.

      Trump anunciou o início de uma nova era — uma golden era — da economia norte-americana, a ser financiada por uma política tarifária agressiva contra toda sorte de países: parceiros, concorrentes e desafetos do império.

      Ele impôs uma taxa base de 10% sobre todas as importações provenientes de mais de 150 países e territórios. Também estabeleceu tarifas adicionais calculadas com base numa espécie de reciprocidade, que incluíram, por exemplo, 34% sobre todos os produtos chineses e 20% sobre os oriundos da União Europeia. Batizou este dia como o “Dia da Libertação”, proclamando-o como um marco na política comercial americana.

      Os mercados internacionais reagiram de maneira imediata e severa. Bolsas de valores ao redor do mundo registraram quedas acentuadas, refletindo o temor de uma guerra comercial prolongada. O índice Dow Jones caiu mais de 1.100 pontos, enquanto a Nasdaq entrou em território de mercado baixista. Empresas com grande exposição ao mercado chinês, como a Tesla, viram suas ações despencarem mais de 5%.

      Esse pacote representa uma ruptura significativa com a ordem comercial global vigente desde os Acordos de Bretton Woods, de 1944, que estabeleceram o dólar como moeda padrão da economia mundial, instituíram bancos centrais nos países do chamado “mundo livre” com a missão de regular a agenda econômica dos parceiros, medidas que impulsionaram a liberalização do comércio internacional.

      Trump, no entanto, parece querer restituir uma relação de poder anterior ao próprio século XX. Desde que tomou posse para seu segundo mandato em janeiro, o presidente de extrema-direita tem feito constantes referências elogiosas aos governos norte-americanos do final do século XIX: um período ainda marcado por forte protecionismo e distante das complexas cadeias globais de produção instituídas ao longo dos últimos cem anos.

      E é justamente por desconsiderar o desenvolvimento histórico dessas relações econômicas internacionais que seu plano tarifário soa tão caricato e ingênuo.

      Ao tentar reviver políticas econômicas de uma era passada, Trump ignora as transformações que moldaram a economia global nas últimas décadas. A globalização e a revolução tecnológica criaram um ambiente em que o isolacionismo econômico não é apenas impraticável, mas também potencialmente prejudicial à própria economia americana.

      Empresas dependem de mercados estrangeiros tanto para a obtenção de insumos quanto para a venda de seus produtos. Além disso, a inovação tecnológica frequentemente nasce da colaboração transnacional, e barreiras comerciais arbitrárias podem sufocar o fluxo de ideias e tecnologias.

      Dessa forma, as ações recentes do governo Trump podem, paradoxalmente, acelerar a formação de uma nova ordem comercial multilateral, em que os Estados Unidos ocupem um papel menos central do que no passado, por perda de relevância tanto no comércio quanto na inovação.

      Países afetados pelas tarifas podem fortalecer laços comerciais entre si, reduzindo sua dependência do mercado americano e do dólar. Essa reorganização de alianças econômicas pode diminuir a influência geopolítica dos EUA, contrariando os objetivos declarados de Trump de fortalecer a posição americana no cenário mundial.

      A abordagem protecionista adotada por Trump reflete uma visão anacrônica, retrógrada e desconectada da realidade da economia global. Ao tentar ressuscitar políticas do século XIX num mundo profundamente interconectado, o governo dos Estados Unidos arrisca não apenas comprometer sua própria economia, mas também minar a estabilidade e a prosperidade do comércio internacional como um todo.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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