Entenda por que a PEC emergencial arroxa salários de servidores públicos até 2036
Fica claro que o governo federal jogou de forma suja e sorrateira, agindo de forma rápida para prejudicar os servidores públicos, sem debater tecnicamente e aproveitando-se da sensibilidade da PEC emergencial
A PEC emergencial aprovada pelo Congresso Nacional neste mês de março surge em virtude de algumas medidas que serão adotadas pelo poder público para o enfretamento da crise provocada pela pandemia do coronavírus, entre elas, a instituição do novo auxílio emergencial. Porém, também surgem algumas polêmicas que envolvem a obrigatoriedade do congelamento de salários dos servidores públicos caso a despesa obrigatória primária de cada poder atinja 95% em relação à despesa primária total.
De toda forma, para entender a limitação da nova PEC emergencial, é preciso compreender a diferença entre despesa obrigatória primária e despesa primária total. A despesa obrigatória primária é aquela que o poder público usa para pagar custos mensais obrigatórios para a manutenção da Administração Pública, saúde, educação e servidores públicos, já a despesa primária total engloba também os investimentos públicos facultativos.
A primeira jogada sorrateira é que a inserção na PEC emergencial de normas que tratam de servidores públicos foi feita de forma desnecessária, uma vez que são normas restritivas dotadas de caráter duradouro, não excepcional e que podem durar até 2036, instituindo arrochos que pouco tem a ver com o enfrentamento da pandemia. Adicione-se que essa possibilidade de congelamento de salários de servidores poderia ser feita em outra PEC sem a rapidez da PEC emergencial, até porque, o dinheiro do auxílio emergencial não pertence a mesma parte orçamentária de onde sai o dinheiro para o pagamento do servidor público. O dinheiro do auxílio emergencial ficou fora do teto de gastos.
Assim, a nova conjuntura, além de desnecessária, também é injusta porque torna praticamente impossível qualquer reajuste salarial dos servidores públicos por 15 anos, uma vez que a nova PEC emergencial impôs o congelamento dos reajustes caso a despesa obrigatória primária de cada poder atinja os 95%, percentual que está prestes a ser atingido em muitos órgãos em virtude do arroxo que já havia sido imposto pela Emenda Constitucional nº 95 do Teto dos Gastos aprovada em 2016 e que tem validade até 2036 (art. 107 e a nova redação do 109 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias).
É preciso também compreender a injustiça provocada pela PEC do teto de gastos de 2016, que, ao invés de limitar o montante da despesa primária total de forma proporcional à receita estatal, amarrou o crescimento desse orçamento ao índice de inflação do ano anterior, situação que vai durar 20 anos contados a partir de 2016. É por isso que, mesmo que a receita orçamentária cresça, a despesa primária total não pode crescer de forma proporcional, pois está amarrada ao índice de inflação do ano anterior. Aí veio o pior com essa PEC emergencial, pois dentro desse orçamento da despesa primária total já amarrado desde 2016, surgiu uma nova limitação, uma vez que atingidos 95% da despesa primária obrigatória, fica vedado o reajuste salarial dos servidores. Lembrando que, pelas projeções, o índice de 95% poderá ser atingido no poder executivo federal em 2025.
Essas restrições também são aplicáveis aos Estados e Municípios, pois, uma vez atingido o índice de 95% e caso não congelem os salários de seus servidores públicos, esses entes ficam proibidos de tomar operação de crédito e outras garantias perante o governo federal (ART. 167-G, § 3º com o art. 167-A, § 7º).
Por tudo isso, fica claro que o governo federal jogou de forma suja e sorrateira, agindo de forma rápida para prejudicar os servidores públicos, sem debater tecnicamente e aproveitando-se da sensibilidade da PEC emergencial.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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