Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica: uma nova era para a clínica periférica
A iniciativa propõe uma clínica que rompe com os paradigmas tradicionais e se compromete politicamente com os contextos sociais
No dia do nascimento de Abdias do Nascimento, um dos maiores intelectuais negros do Brasil, foi lançado pelo Coletivo de Pesquisa Ativista em Psicanálise, Educação e Cultura uma nova escola. O evento contou com a presença de figuras como Jairo Carioca, Ronald Lopes e Hudson A. R. Bonomo, que apresentaram a proposta do coletivo e reafirmaram a necessidade de transformar a psicanálise a partir das realidades periféricas e racializadas.
Durante o lançamento, o psicanalista e filósofo, professor Érico Andrade, da UFPE, ressaltou a importância de repensar os conceitos psicanalíticos a partir dos corpos historicamente marginalizados. "Os corpos submissos são também aqueles que trazem questões para a psicanálise", afirmou, citando autores como Paul B. Preciado, Nelsa Santos Souza entre outras pessoas marginalizadas ao longo, que racializam e subvertem os conceitos tradicionais da psicanálise. Andrade destacou ainda que a proposta do coletivo se insere nessa transformação ao construir uma escola psicanalítica com base na horizontalidade e na decisão coletiva.
A criação da escola emerge de uma necessidade urgente: reinventar a psicanálise fora dos moldes eurocentrados e hierárquicos que historicamente pautaram a formação e a prática analítica. "Posso falar de macumba aqui?", questiona uma analisante na primeira sessão. Essa pergunta, tão simples e potente, ecoa a urgência de uma psicanálise que dialogue com a periferia e suas realidades. O Coletivo, através de sua nova escola não busca reproduzir Freud ou Lacan como dogmas, mas sim ressignificar conceitos para acolher desejos e subjetividades que escapam à lógica colonial e capitalista.
A iniciativa propõe uma clínica que rompe com os paradigmas tradicionais e se compromete politicamente com os contextos sociais. Sem democracia, não há psicanálise, afirmam os coordenadores, defendendo que o ato clínico é também um ato de resistência contra o fascismo, o racismo e o capitalismo. Nesse espaço, o cuidado é voltado a corpos marginalizados: travestis, mães solo negras, profissionais do sexo e outros sujeitos que, historicamente, estiveram à margem da prática psicanalítica.
Jairo Carioca e Ronald Lopes, coordenadores do coletivo, reforçam a ideia de circularidade como elemento essencial da proposta. "Entrar na roda, circular, é quebrar as hierarquias", afirmam. O coletivo se propõe a funcionar com base em decisões colegiadas, reconhecendo as diferenças sem transformá-las em estruturas de poder excludentes. A psicanálise periférica se coloca, assim, como um dispositivo de emancipação e resistência, co-construído por analisantes e analistas.
A criação dessa Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica, a primeira do Brasil com mais de 50% de pessoas negras e indígenas, pelo coletivo marca um momento histórico na psicanálise brasileira, rompendo com uma tradição que, por muito tempo, ignorou os sujeitos periféricos e racializados. Como destacou Erico Andrade, a psicanálise precisa se comprometer com uma revolução material, política e epistêmica. O Coletivo de Pesquisa Ativista em Psicanálise, Educação e Cultura realiza um passo fundamental nessa direção, e agora se compromete ainda mais ao lançar sua escola.
O lançamento foi on-line e foi finalizado com a fala das professoras Maria Tereza Ferreira e Vitailma Conceição que reforçaram a urgência do trabalho ecoado pelos e dos espaços periféricos.
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