PEC das Drogas é reação populista e burra de um Senado mais preocupado em peitar o STF
“Rodrigo Pacheco e seus comparsas não querem o melhor para o Brasil. Querem os votos da extrema direita”, escreve Aquiles Lins
O plenário do Senado aprovou nesta terça-feira (16) uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criminaliza a posse e o porte de droga ilícita. A PEC, de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, obteve 53 votos favoráveis, incluindo senadores da base do governo, e nove contrários no primeiro turno, e 52 favoráveis e nove contrários no segundo turno. O texto aprovado modifica o artigo 5º da Constituição Federal e torna crime a posse ou porte de qualquer quantidade de droga ou entorpecente "sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar". Sem estabelecer uma distinção entre usuário e traficante, a PEC deixa a cargo da Justiça definir, de acordo com o conjunto de provas, se quem for flagrado com droga responderá por tráfico ou será enquadrado somente como usuário. Atualmente, muitos usuários ficam à mercê da Polícia Militar e outras autoridades e acabam enquadrados como traficantes. A cor da pele e a condição financeira são determinantes na maioria dos casos.
A PEC 45/2023 foi apresentada por Rodrigo Pacheco, que se diz da base do governo Lula, após a retomada do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) de uma ação sobre o porte de drogas para consumo próprio. Em 2015, os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso votaram contra a criminalização do porte de maconha. O julgamento foi suspenso por cerca de sete anos com um pedido de vista do então ministro Teori Zavascki. Em agosto de 2023, o ministro Alexandre de Moraes também votou contra a criminalização do porte de maconha. A então presidente da Corte, ministra Rosa Weber, seguiu a mesma linha. Por outro lado, os ministros Cristiano Zanin, Nunes Marques e André Mendonça votaram a favor da validade do artigo 28 da lei. Até o momento, a maioria dos votos propõe critérios de quantidade para distinguir entre usuário e traficante. O placar atual é de 5 votos contra a criminalização do porte apenas de maconha para consumo próprio e para declarar o artigo 28 inconstitucional. Os três votos divergentes consideram válida a regra da Lei de Entorpecentes. O julgamento está suspenso e não há uma data definida para a retomada pela Suprema Corte.
Esta PEC das Drogas é um decisão populista, burra, ineficaz ao que se propõe, que pode ser considerada inconstitucional e que criminaliza o usuário no artigo da Constituição que justamente estabelece os direitos e garantias fundamentais dos brasileiros e brasileiras. A aprovação da proposta, que ainda deve ser analisada pela Câmara, outro antro de populistas e extremistas da direita, reforça a tese fracassada da “guerra às drogas”, que não reduz o consumo nem o comércio. E deverá aumentar o contingente da população prisional no Brasil. Com a Lei de Drogas, sancionada em 2006 e cuja constitucionalidade o STF está debatendo, o percentual de presos enquadrados no crime de tráfico de drogas subiu de 8,7% em 2005 para 32,6% em 2017.
Um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e publicado em 2023 concluiu que a maioria dos processos por tráfico de drogas no Brasil acontece após apreensões de quantidades pequenas das substâncias entorpecentes. Em 58,7% dos casos por tráfico de maconha, por exemplo, foram apreendidas menos de 150 gramas. O estudo analisou 5.121 processos em todos os tribunais do país. Segundo o estado, entre os processados, 72% são jovens de até 30 anos, 86% são do sexo masculino, 67% não concluiu a educação básica. Jovens negros com menos de 30 anos correspondem à metade dos réus pro tráfico de drogas, o que atesta o fracasso da política e mostra como a criminalização por tráfico recai sobre essa parcela da população.
Não há qualquer interesse de Rodrigo Pacheco em debater a questão das drogas de maneira racional, alinhada ao que já existe em vários países do mundo. Pacheco observou a situação eleitoral de seu estado, Minas Gerais, que caminha para a extrema direita ao reeleger Romeu Zema e conferir forte competitividade eleitoral ao deputado Nikolas Ferreira, o mais jovem e um dos piores parlamentares que já passaram pelo Congresso. O senador Rodrigo Pacheco tem pretensões de concorrer ao governo de Minas e optou por se alinhar à pauta moral extremista. Em nada importa se ela é a melhor decisão para a saúde pública, para a segurança pública ou para os direitos humanos. Pacheco e seus comparsas que aprovaram a PEC das Drogas não querem o melhor para o Brasil. Querem os votos da extrema direita.
O governo Lula não pode assistir passivamente ao Congresso Nacional avançar em tamanho retrocesso. Mesmo que não tenha votos suficientes para barrar a medida, é preciso disputar os corações e mentes brasileiras, mostrar que o tempo passou, que o mundo evoluiu e hoje não se trata mais a questão das drogas com medidas simplistas de proibicionismo e criminalização dos usuários. O consumo não vai reduzir nem acabar. É preciso salvar o Brasil da teocracia enquanto é tempo. E dar a resposta correta, nas urnas, para Rodrigo Pacheco e todos os parlamentares oportunistas que estão surfando no populismo penal para colher dividendos eleitorais com a extrema direita.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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