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    Caitlin Johnstone

    Jornalista independente da Austrália

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    'Por que eu deveria me importar com Gaza'?

    Não podemos continuar no caminho ecocida e omnicida que nossos pequenos círculos de compaixão tornaram possível, ou então seremos extintos

    Palestinos deslocam-se na Faixa de Gaza (Foto: Hatem Khaled/Reuters)

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    Publicado originalmente no Substack da autora em 8 de setembro de 2024

    Outro dia, alguém no Twitter me perguntou por que ele deveria se importar com o que está acontecendo em Gaza, dizendo: "Por que eu deveria me importar com qualquer pessoa que não esteja num raio de 30 quilômetros de onde eu moro?"

    Fiquei um pouco surpresa com isso. Devo confessar que vivo numa espécie de bolha quando se trata de me importar com o mundo; a maioria das pessoas com quem interajo no dia-a-dia concorda comigo ou discorda sobre a natureza abusiva do império, quais são os nossos problemas e o que deve ser feito, mas todos têm em comum o fato de se importarem. Fora da minha pequena bolha, suspeito que essa atitude de "por que eu deveria me importar?" seja bastante comum.

    Há um artigo do Huffington Post de 2017 escrito por Kayla Chadwick [https://www.huffpost.com/entry/i-dont-know-how-to-explain-to-you-that-you-should_b_59519811e4b0f078efd98440] intitulado "Não sei como explicar para você que você deve se importar com outras pessoas", que expressa frustração com esse tipo de atitude, pois é muito difícil argumentar contra ela. Se você não é o tipo de pessoa que naturalmente se importa com a morte e o sofrimento em Gaza, vai ser difícil convencê-lo de por que você deveria se importar. Se lhe falta a parte de si mesmo que dói ao ver crianças despedaçadas por bombas israelenses, será difícil entender o valor dessa parte.

    Mas eu gosto de desafios. Então, pensei um pouco sobre isso e elaborei a resposta mais honesta e completa para essa questão que sou capaz de produzir no momento. Pode não convencer ninguém, mas é uma resposta bem fundamentada.

    Por que você deveria se importar com Gaza? Porque não podemos continuar vivendo assim. Nossa espécie não pode continuar vivendo neste planeta como se o que acontece com outras pessoas e outros organismos ao redor do mundo não tivesse nada a ver conosco. Não vivemos mais nesse tipo de mundo.

    Para o bem ou para o mal, agora vivemos num planeta com oito bilhões de humanos que não estão mais separados pela distância como costumavam estar. Essa espécie, que passou tanto do seu desenvolvimento se relacionando em unidades de pequenas tribos, agora é uma comunidade global intimamente conectada, cujo comportamento está literalmente alterando a face deste planeta. Precisamos começar a agir de acordo. Precisamos começar a fazer o que Einstein chamou de "ampliar nosso círculo de compaixão" além de nossas pequenas unidades tribais de pessoas que conhecemos e gostamos, ou simplesmente não seremos capazes de sobreviver e prosperar neste planeta.

    A incapacidade das pessoas comuns de pensar globalmente está afetando diretamente as nossas vidas aqui e agora.

    A capacidade dos plutocratas de explorar mão-de-obra barata no exterior afeta diretamente o quanto você e seus vizinhos podem ganhar para sustentar a si mesmos e suas famílias. Se tivéssemos verdadeira solidariedade de classe internacional, eles não conseguiriam mais fazer isso.

    A capacidade das corporações de alimentar a nossa biosfera na máquina capitalista e repassar os custos de produção para o ecossistema para maximizar os lucros afeta diretamente o tipo de ambiente em que viveremos nos próximos anos. Os executivos corporativos só conseguem fazer isso porque a cidadania, que os supera em número, foi manipulada para aceitar o seu comportamento cancerígeno.

    A capacidade dos mercadores da guerra e dos gerentes do império de promover mais guerra e militarismo ao redor do mundo afeta diretamente o quanto da riqueza e dos recursos de nossa nação são destinados a apoiar as necessidades das pessoas comuns em casa, e nos ameaça com a possibilidade iminente de um armagedom nuclear. A máquina de propaganda imperial trabalha tanto para fabricar consentimento para essa loucura porque, de outra forma, ninguém consentiria com isso.

    Os oligarcas e agências governamentais que comandam o império centralizado nos EUA são capazes de explorar a nossa tendência de nos importarmos apenas com o que está ao nosso redor para construir mecanismos globais que afetam tudo – inclusive o que está ao nosso redor. Tudo o que precisam é de um pouco de manipulação narrativa, juntamente com a nossa miopia, para nos impedir de ver o que estão fazendo.

    Eles desestabilizam regiões inteiras no sul global com guerra e extração imperialista, e quando as pessoas começam a fugir dessas condições horríveis, usam propaganda para manipular aqueles no norte global a odiar imigrantes, em vez de se concentrar no que está impulsionando os êxodos em massa.

    Eles mantêm deliberadamente um nível de desemprego para depreciar artificialmente os salários, e então propagandeiam para os pobres trabalhadores que os desempregados são parasitas que vivem de assistencialismo.

    Eles criam uma falsa dicotomia de oposição controlada entre duas facções políticas principais que servem ao império capitalista em todos os aspectos significativos, e então manipulam ambos os lados para culpar todos os problemas causados por isso no outro lado, em vez dos arquitetos desse desastre.

    Essas manipulações não funcionariam se nossos círculos de compaixão fossem suficientemente amplos. A mesma miopia moral que nos faz falhar em ver uma criança palestina como digna de nosso cuidado e atenção também nos faz falhar em reconhecer as causas subjacentes de todos os principais problemas que vemos ao nosso redor.

    É verdade que se importar com aquela criança palestina, por si só, não lhe trará nenhum ganho material pessoal. Mas ser o tipo de pessoa que se importaria com essa criança palestina ajudará a abrir o caminho do inferno na Terra para o paraíso. Um número suficiente de humanos com um círculo de compaixão suficientemente amplo para se importar com o sofrimento de outros humanos que nunca conhecerão é tudo o que será necessário para criarmos um mundo saudável.

    Nossa espécie já não pode mais se dar ao luxo de ter círculos pequenos de compaixão. Já não podemos mais nos dar ao luxo da ignorância e da apatia. Temos que começar a aprender sobre o que está acontecendo no mundo, a pensar em termos de comunidade global, e a nos importar com nossos semelhantes neste planeta da mesma forma que cuidamos de nossos amigos e vizinhos.

    Claro que essa não é a nossa tendência no momento, mas toda espécie ao final chega a um ponto em que precisa se adaptar ou seguir o caminho dos dinossauros. É aí que estamos agora. Os dias em que o "individualismo resiliente" podia ser defendido como uma visão de mundo racional já se foram, se é que algum dia foi racional.

    Este não é o século XII. Não vamos do nascimento à morte em pequenas comunidades desconectadas do resto do mundo. Seja qual for o dispositivo no qual você está lendo isso, ele tem partes de vários países estrangeiros, que passaram por inúmeras mãos estrangeiras até chegar às suas. Todos tocamos a vida uns dos outros ao redor do mundo a partir de distâncias que antes não tinham relevância para a experiência humana neste planeta.

    Precisamos começar a pensar, sentir e viver de acordo com essa nova realidade. Não podemos continuar no caminho ecocida e omnicida que nossos pequenos círculos de compaixão tornaram possível, ou então seremos extintos.

    É por isso que você deveria se importar com Gaza. Porque o fracasso coletivo da humanidade em se importar com essas coisas está empurrando a nossa espécie cada vez mais para a miséria e a distopia, e cada vez mais perto do precipício da extinção eterna.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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