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Pedro Maciel

Advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007

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Um bilhete para meus filhos e minhas netas

Não se deixe escravizar por nada que não tenha de fato significo, não se submeta a regras estúpidas e, principalmente, olhe o céu algumas vezes por dia.

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“Tu que existes exposto ao que os dias te trazem, o que é ser,

Alguém? O que é não ser Ninguém? 

O humano é o sonho de uma sombra.

Mas quando chega o esplendor dispensado por um deus, há

uma luz brilhante entre os homens e a vida torna-se doce.” PÍNDARO - Odes.

Os sábios da antiga Roma diziam que “o maior dos luxos é o tempo” e “quanto mais feliz, mais breve é o tempo”. Como os meus dias têm sido repetitivos, lembrei do filme "O feitiço do tempo".

No filme Phil (Bill Murray), um apresentador de meteorologia enviado à pacata Punxsutawney, na Pennsylvania, para fazer a reportagem sobre o popular dia 2 de fevereiro, o “Dia da Marmota”, mas o dia não termina e o filme se desenvolve com o personagem de Murray acordando sempre no mesmo dia. 

Para quem não lembra do filme: Phil Connors é um jornalista arrogante, insensível, convencido, esnobe e sua companhia não é agradável àqueles aqueles quem com ele convive e, por alguma razão mágica, não explicada no filme, acorda todos os dias no dia 2 de fevereiro, por volta das seis da manhã.

O tempo e as repetições são incômodos, tediosos, tanto que ele chega a suicidar-se, mas nem a morte é capaz de libertá-lo da situação de prisioneiro do tempo e de tudo que acontece da mesma forma no eterno 2 de fevereiro, mas, quando se vê preso no mesmo dia, e obrigado a vive o mesmo dia novamente, ele começa a perceber pessoas, fatos e detalhes das vidas ao seu redor, a humanidade começa a brotar no coração de Phil.

O desespero de não poder libertar-se do aprisionamento - metáfora daquilo que a rotina alienada e acrítica pode fazer conosco -, na medida em que Phil percebe “o outro”, transforma-se em alegria do conviver, e os dias passam a ter significado para além da fronteira do egoísmo.

Uma vida com rotinas não é propriamente um problema, pois, há muitas formas, muitos modos, muitas maneiras de estar na vida e relacionar-se com a realidade, mas o caminhar precisa de sentido e significado, sem eles a confiança na vida se quebra e a esperança vira-se para a própria morte. 

O desespero do personagem de Murray, que chegou a buscar a morte, transformou-se esperança; não vou contar como Phil supera o dia 2 de fevereiro, o fato é que a mensagem e que podemos, diante do mal extremo e inevitável, ter várias atitudes; dando sentido aos detalhes poderemos tomar a nossa vida e sermos donos do próprio destino, pois a vida é preciosa e temos o dever de tornar cada instante o melhor que podia ser. 

Precisamos fazer coisas para as pessoas; fazer coisas boas pelos outros, até para quem sequer conhecemos, no filme Phil salva pelo menos uma vida.

Bill Murray está brilhante da pele de Phil. 

O que Phil compreendeu foi que, apesar de estar inevitavelmente exposto ao que a vida lhe trazia, o que interessava era a identificação e a constituição de uma postura perante a vida que lhe permitisse não ser dominado por isso e que, resignando-se ao inevitável, não fugisse disso, mas abraçasse com todas as forças o projeto de fazer da sua vida o melhor possível.

Phil tornou-se assim um ser humano consciente das suas decisões – já não passivamente exposto à procura do prazer e à fuga do sofrimento, mas ativamente empenhado em viver na justa medida da sua excelência. 

O que aconteceu a Phil representa o que acontece com todos nós: só em casos extremos paramos para pensar sobre o sentido da vida, pois, a correria do dia a dia consome o nosso precioso tempo, não nos deixando espaço para pensar no que significa de fato viver.

Phil foi confrontado com algo que não acontece conosco: viver diversas vezes a mesma situação até acertar. É que conosco, como diz Pitágoras: a oportunidade é estreita”, não temos segundas chances: vivemos uma vida curta que nos impele a correr nela, a corrê-la, a consumi-la, e em cada trago vai-se um momento irrecuperável aonde jamais voltaremos para tentarmos outra vez.

O que todos nós somos capazes de perceber que a compreensão final de Phil é a mais correta, provavelmente a mais adequada. Mas também percebemos que essa maneira de ter a vida só é possível mediante uma decisão nossa, uma decisão que, precisamente, é difícil de tomar. A autenticidade é difícil.

Por isso, não se deixe escravizar por nada que não tenha de fato significo, não se submeta a regras estúpidas e, principalmente, olhe o céu algumas vezes por dia.

Essas são as reflexões, modestas e talvez primárias, que compartilho com Lucas, Caio, Mateus, Isabela e Clarice e com o paciente leitor.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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