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    José Reinaldo Carvalho

    Jornalista, editor internacional do Brasil 247 e da página Resistência: http://www.resistencia.cc

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    Venezuela é alvo de intentona golpista e ameaça de intervenção externa

    Um país independente encontra-se sob ataque. Se houver guerra, a responsabilidade é dos EUA e de seus cúmplices, alerta o editor internacional do Brasil 247

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    Por José Reinaldo Carvalho - A Venezuela está mais uma vez no alvo  de um furioso ataque antidemocrático, uma ofensiva intervencionista, um golpe multifacetado, expressão de uma guerra já prolongada, orquestrada pelo imperialismo estadunidense em conluio com a extrema direita local. A rigor, esta guerra foi desencadeada desde que o país, sob a direção de Hugo Chávez, em finais da década de 1990, decidiu pôr fim ao neocolonialismo, à brutal exploração de suas riquezas.

    A decisão soberana e revolucionária do povo venezuelano de se tornar dono absoluto das maiores reservas de petróleo e gás natural do mundo e a opção pelo socialismo com características latino-americanas e nacionais despertaram a ira do imperialismo estadunidense e das classes dominantes locais, submissas àquela potência.

    Há um quarto de século, o povo venezuelano, sob a lúcida e firme direção de Chávez, contando com a sólida aliança das forças patrióticas e revolucionárias do Grande Polo Patriótico, avançou aceleradamente pelo caminho da emancipação nacional e social, proclamou a Revolução Bolivariana, soergueu por meio da Constituinte um sistema político profundamente democrático, tornou-se um Estado de Direito, com uma Constituição avançada, fomentou o progresso social através de políticas públicas realizadas pelo Estado com a participação da sociedade - as “misiones”. 

    No plano externo, içou a bandeira internacionalista do anti-imperialismo, da integração soberana dos povos, com prioridade para a América Latina e o Caribe. O país tornou-se um dos protagonistas da construção do mundo multipolar, abraçou o Sul Global, estabeleceu parcerias estratégicas com as grandes forças do multilateralismo genuíno, da democratização das relações internacionais, da busca incessante da paz. Tornou-se força solidária com os países socialistas, as nações sedentas de autodeterminação e independência plena. Inspirou lutas memoráveis, acolheu movimentos progressistas, promoveu ao lado de outros países de orientação progressista os mecanismos de integração, como Unasul, Alba e Celac. O Miraflores e a Casa Amarela (*) se tornaram faróis a iluminar os caminhos da resistência, da luta e da libertação. Dali e das imensas avenidas de Caracas, Chávez lançou o brado que para sempre ecoam: “Unidade-Luta-Batalha-Vitória!”

    O continuador de tudo isso é Nicolás Maduro, o presidente reeleito com toda a legitimidade em 28 de Julho último.

    Foi contra esta  obra gigantesca e gloriosa que se insurgiram as forças da reação, manipuladas desde Washington. Os fatos dramáticos de hoje se somam a tantos outros ocorridos nas últimas duas décadas e meia. “Paro Petrolero” (2002-2003), cerco ao Palácio presidencial por militares, golpe de 11 de abril de 2022, movimentos de rua violentos, como ocorreu em 2014 e 2017, tentativas de invasão do país (2019), autoproclamação no mesmo ano de um obscuro marionete do império como presidente interino, assédio internacional por meio de grupos “diplomáticos” hostis, imposição de sanções econômicas unilaterais, tentativas de magnicídio. Estas se tornaram ações rotineiras dos inimigos da Pátria de Bolívar e Chávez.

    Agora, sob a alegação de falta de transparência e fraude eleitoral, a Venezuela enfrenta novo ciclo de desestabilização, que se agrava com a decisão de deslegitimar os resultados eleitorais por parte do imperialismo estadunidense, seus cúmplices de extrema direita e algumas vozes altissonantes travestidas de “esquerda”,”centro-esquerda”, “centro”, “frente ampla” e outros rótulos enganosos. De novo repete-se o roteiro de ópera bufa de 2019 - cantar fraude eleitoral para designar arbitrariamente um vencedor e nomear um falso presidente. Para isto serve o mantra “mostrem as atas”, chave de palha com a qual pretendem abrir a porta do caos, provocando uma recontagem dos votos - algo que nenhum, absolutamente nenhum governo de respeito se dispõe a proceder. Contam nesse mister com uma mídia que, em seu papel de usina de mentiras, criminaliza líderes, fomenta confusão, intoxica mentes, corrompe consciências.  

    Os que hoje clamam por transparência eleitoral, respeito à soberania popular, ignorando que esta foi plenamente exercida durante todo o processo eleitoral recente, defesa intransigente da democracia, que está inteiramente preservada, são os mesmos que apoiaram a autoproclamação de Juan Guaidó em 2019, uma ação que não contou com nenhum respaldo eleitoral nem qualquer tipo de decisão democrática. 

    O respeito à soberania popular e a defesa intransigente da democracia na Venezuela tem como premissa a aceitação do resultado proclamado pelo Poder constitucional soberano da Venezuela. Nicolás Maduro ganhou a eleição, foi reeleito. O não reconhecimento disto viola a soberania popular, a democracia e a autodeterminação do país.

    O verdadeiro objetivo desses ataques é claro: impedir que um modelo alternativo de governança popular e soberana prospere. Esse modelo ameaça diretamente a hegemonia do imperialismo estadunidense. A tentativa de recolonização da Venezuela faz parte de uma estratégia mais ampla de manter o controle sobre recursos naturais estratégicos e suprimir qualquer movimento de independência e autodeterminação na América Latina.

    A Venezuela, no entanto, não está sozinha. Países como China, Rússia, Cuba, Nicarágua e Bolívia e cinco dezenas de outros países já expressaram seu apoio ao governo venezuelano, reconhecendo a importância de defender a soberania diante das pressões imperialistas. Além disso, a possível entrada da Venezuela no Brics é vista como uma ameaça significativa ao bloco imperialista, fortalecendo a capacidade de fornecimento energético e consolidando alianças estratégicas fora da órbita de influência dos Estados Unidos.

    Os povos latino-americanos e caribenhos devem se unir em defesa da soberania e da paz. A presença militar e as intervenções estrangeiras, disfarçadas de cooperação e ajuda humanitária, representam uma ameaça constante à estabilidade e ao desenvolvimento da região. É essencial erguer a voz contra essas agressões e apoiar incondicionalmente aqueles que lutam por um mundo mais justo e independente.

    A Venezuela Bolivariana, com sua resiliência e determinação, continua a ser um fator de esperança para todos que acreditam em um outro mundo, de multipolaridade e multilateralismo genuíno, em que a dignidade e a autodeterminação dos povos sejam respeitadas como valores incontornáveis e obrigações estritas. 

    A exigência pelas “atas” nunca foi justa. Agora se tornou inócua. Com a proclamação pelos EUA da “vitória” do candidato da extrema direita e a autoproclamação deste como “presidente eleito”, as atas saem de foco. Para os democratas e anti-imperialistas passa ao primeiro plano a condenação à intentona golpista. 

    Em meio às agressões da extrema direita, das ameaças e pressões da Casa Branca e do Departamento de Estado, com respaldo do Pentágono e seu Comando Sul sediado em Miami, com armas apontadas para o lado de cá e as belonaves prontas para singrar os verdes mares da Nossa América, estão em curso também algumas demarches diplomáticas que, independentemente das boas intenções, carregam um vício de origem, estão impregnadas de vãs ilusões e perseguem um objetivo antagônico à vontade do povo venezuelano. 

    Ninguém de boa fé pode criticar as propostas de diálogo das chancelarias do Brasil, México e Colômbia, nem rechaçar liminarmente seus bons ofícios. O presidente reeleito da Venezuela agradeceu o empenho, enquanto espera, firme em seu posto, uma conversa com os presidentes desses países que sempre se comportaram como seus bons amigos.  Mas o vício de origem da manobra é que se trata de algo coordenado com os Estados Unidos, país hostil à Venezuela e umbilicalmente ligado à oposição direitista, tanto que sua maior autoridade em política externa proclamou vencedor o candidato dessa facção. 

    As vãs ilusões consistem na busca de uma conciliação impossível com uma extrema direita que só fala a linguagem da violência, é inimiga do povo e apátrida. 

    O objetivo, antagônico com as aspirações do povo venezuelano, é a "transição democrática", que seria a resultante de uma negociação entre o governo de Nicolás Maduro e a oposição representada por Corina Machado e Edmundo González Urrutia. 

    Este empenho, que a princípio poderia parecer uma ação diplomática louvável, desconsidera um fator crucial: Maduro foi reeleito. Ignorar este fato essencial é voltar as costas à realidade política venezuelana. O que seria uma “transição democrática”? Anular a eleição de 28 de julho e realizar outra em prazo a ser fixado? Dar posse a Edmundo González Urrutia, proclamado vencedor pelos EUA? Convencer Maduro à renúncia depois de legitimado pela terceira vez nas urnas e pela vontade soberana do povo? Entregar o poder a um tertius?  

    Qualquer tentativa de negociação que não reconheça a legitimidade do governo de Maduro ofende a democracia e a soberania nacional venezuelana. Está fadada ao fracasso. A insistência de governos estrangeiros em forçar uma negociação, sem aceitar a continuidade de Maduro no poder, demonstra um desconhecimento profundo das dinâmicas internas do país e uma subestimação do apoio popular à Revolução Bolivariana e seu líder. 

    Além disso, a proposta de uma "transição democrática" soa vazia quando analisada no contexto venezuelano atual. Maduro tem repetidamente deixado claro que não renunciará e que qualquer negociação deve partir do pressuposto de sua permanência no poder. Esta posição não é mera teimosia, mas sim uma estratégia política baseada na realidade de um governo que tem capacidade de gestão, sabe o que quer e está decidido a cumprir sua missão. 

    A intervenção de potências estrangeiras, especialmente dos Estados Unidos, historicamente tem sido maléfica na América Latina. A memória de intervenções passadas, que muitas vezes resultaram em maior instabilidade e sofrimento para os povos da região, alimenta uma resistência natural a qualquer tentativa de imposição externa. Neste contexto, a aliança dos EUA com Brasil, México e Colômbia, longe de fortalecer a democracia, representa na verdade uma defraudação desta e uma afronta à soberania nacional. 

    Por fim, a dupla Corina-Edmundo, embora represente uma parcela significativa da oposição, não possui legitimidade suficiente para conduzir uma negociação em nome de toda a sociedade venezuelana. A oposição na Venezuela é fragmentada e carece de uma liderança unificada, o que torna qualquer tentativa de negociação ainda mais complexa e propensa ao fracasso. 

    Em suma, a manobra dos governos de Brasil, México, Colômbia e Estados Unidos para promover uma "transição democrática" na Venezuela, tal como apresentada, é inócua. Sem reconhecer a reeleição de Maduro e a realidade política venezuelana, qualquer tentativa de negociação estará condenada ao fracasso. A solução para a crise venezuelana deve ser encontrada internamente, respeitando a soberania do país e as complexidades de sua sociedade.

    Fidel Castro dizia que “Revolução é sentido do momento histórico” e Chávez afirmava que “o espírito de nossa época é a luta anti-imperialista”. A negação desses princípios explica a posição colaboracionista com o imperialismo ou a omissão por parte da falsa esquerda. Nunca, jamais, a esquerda deve ceder ao chamado do imperialismo dos EUA de contribuir para fazer a “transição democrática” no país irmão. Não devemos nem podemos coonestar os erros nem as falsas políticas que abraçaram aqui. 

    Apoiar a Venezuela bolivariana é ato de consciência, responsabilidade e compromisso com a genuína integração da América Latina. Não é hora de ataques ao líder venezuelano, críticas descontextualizadas, ataques aos procedimentos eleitorais, muito menos de conciliação ou aliança com o inimigo número 1 dos povos. 

    (*) O Palácio Miraflores é a sede da Presidência da República; a Casa Amarela é o Ministério das Relações Exteriores

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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