"Continuaremos reféns de uma estrutura militar que tutela a política e ameaça a democracia", diz Manuel Domingos Neto
Manuel Domingos Neto analisa a crise militar no Brasil e aponta soluções para reduzir o peso das Forças Armadas na política nacional
247 - No programa Boa Noite 247, o professor e pesquisador Manuel Domingos Neto apresentou uma análise contundente sobre o papel das Forças Armadas no Brasil e suas relações com o poder político. Durante a entrevista, Domingos criticou a atuação de instituições como o Judiciário, o Legislativo e o Executivo em relação à tutela militar. Segundo ele, a solução passa por uma profunda reforma estrutural que redefina as funções das Forças Armadas.
“O presidente precisa parar de ser comandado pelos comandantes”, afirmou Domingos, ressaltando a necessidade de o chefe de Estado assumir o comando efetivo da política de defesa nacional. Para ele, a atual postura de subserviência às diretrizes militares perpetua um modelo que favorece “o monopólio do saber” e mantém as Forças Armadas como uma instituição isolada e autônoma.
Herança de tutela militar
Domingos fez um diagnóstico histórico da tutela militar no Brasil, que remonta ao Império. Segundo ele, a cultura das Forças Armadas é sustentada por um treinamento que perpetua valores hierárquicos e conservadores. “Desde o Colégio Militar até a Escola Superior de Guerra, os militares são moldados para pensar que civis são inferiores e que apenas eles são os guardiões da pátria”, explicou.
Ele também criticou o artigo 142 da Constituição Federal, que permite às Forças Armadas atuarem na manutenção da lei e da ordem. Para Domingos, essa atribuição é incompatível com a defesa nacional. “Uma força armada voltada ao controle interno da sociedade é inconcebível. Isso apenas reforça o poder corporativo e limita a capacidade de enfrentamento a ameaças externas.”
Reforma militar: um desafio inadiável
A solução, segundo o professor, passa por uma reforma ampla que mude as funções das Forças Armadas. “Temos que fechar quarteis que não servem para nada, vender terrenos em grandes centros urbanos e direcionar recursos para o desenvolvimento de tecnologia militar nacional”, propôs. Ele destacou a necessidade de investir em autonomia tecnológica, com satélites, drones e armamentos produzidos no Brasil, para reduzir a dependência de países como os Estados Unidos.
Domingos alertou para a influência do Pentágono na estrutura militar brasileira, evidenciada pela dependência de equipamentos estrangeiros. “Se o Brasil tomar uma posição política contrária a Washington, pode ter seus sistemas militares desativados, como já aconteceu no caso das Malvinas”, exemplificou.
O papel de Lula e a pressão popular
Ao avaliar o governo Lula, Domingos reconheceu avanços em áreas sociais, mas criticou a postura conciliatória do presidente com os militares. “No primeiro mandato, Lula deixou os militares entregues a si mesmos, o que resultou em uma relação de mando e obediência invertida. Isso não pode se repetir”, alertou.
Ele enfatizou a importância de uma pressão popular organizada para impulsionar mudanças. “Sem mobilização da sociedade e apoio das forças democráticas, continuaremos reféns de uma estrutura militar que tutela a política e ameaça a democracia”, concluiu.
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