Marilena Chauí diz que economia digital mascara servidão e cria ilusão de liberdade
Filósofa aborda impactos da hiperconectividade na subjetividade contemporânea e nas relações de poder
247 – Em uma análise profunda e provocadora, a filósofa Marilena Chauí, uma das mais importantes intelectuais do Brasil, discutiu as transformações trazidas pela economia digital e seu impacto nas relações sociais e políticas. Em entrevista ao programa Dando a Real, da TV Brasil, Chauí destacou como a hiperconectividade molda uma nova subjetividade e reforça mecanismos de controle sob o disfarce de liberdade. “Esse objeto aqui [celular] faz com que eu acredite que sou livre quando o utilizo, mas, na verdade, é um objeto de servidão”, afirmou Chauí, referindo-se ao papel central dos dispositivos móveis na vida moderna.
A filósofa explicou que a digitalização anula a relação física com o espaço e o tempo, criando um ambiente de “atopia” (sem lugar) e “acronia” (sem tempo). “Vivemos uma experiência limitada do corpo, que perde seu papel de participante no mundo de percepções e sentimentos. Essa desconexão resulta em uma descorporificação que reforça a ilusão de autonomia”, argumentou Chauí.
A nova subjetividade: narcisismo e depressão
Chauí explorou o surgimento de uma nova subjetividade que ela define como “narcisista e depressiva”. “Existir hoje é ser visto. Se você não é visto, você não existe. Mas, como não se pode controlar o olhar do outro, a dependência desse reconhecimento externo cria um ciclo de insegurança e depressão”, explicou. A filósofa alertou sobre o aumento significativo das taxas de suicídio entre os jovens, associando esse fenômeno à hiperconectividade e ao uso excessivo das redes sociais.
Fake news e controle social
Outro ponto crucial abordado por Chauí foi o papel das fake news. Para a filósofa, elas não se limitam a boatos ou desinformação, mas representam um “modo de vida” vinculado ao controle externo das mentes e sentimentos. “A fake news é uma forma de dominação que exerce controle sobre nossas percepções e pensamentos, promovendo o discurso de ódio e sustentando guerras indiretas.”
Chauí também abordou a figura do “empresário de si mesmo”, que ela associa ao conceito de precariado – uma classe caracterizada pela insegurança e pela falsa sensação de independência. “A ideia de que somos donos de nós mesmos é uma ilusão. Na verdade, estamos servindo aos interesses de grandes oligopólios sob a fachada de autonomia”, destacou a filósofa. Segundo ela, essa nova estrutura dissolve a coesão social tradicional que antes era fortalecida pela classe trabalhadora e suas relações concretas com o mundo.
“A classe trabalhadora, que se relacionava com o mundo por meio do trabalho concreto, foi substituída por uma dispersão, onde cada indivíduo acredita ser autônomo, mas está, na verdade, em um estado de dependência total”, concluiu Chauí.
Para Marilena Chauí, as mudanças trazidas pela economia digital representam mais do que uma simples evolução tecnológica; elas configuram uma mutação civilizacional que poucos estavam preparados para enfrentar. A filósofa enfatiza que a liberdade prometida pela era digital é ilusória, sustentada por um sistema que controla e molda sentimentos, pensamentos e ações de maneira imperceptível. Assista:
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