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A outra face do superávit que Milei celebra na Argentina não é animadora, avalia analista

Economista adverte que superávit corresponde ao Setor Público Nacional e que, se considerar apenas a Administração Pública Nacional, "em março o resultado foi deficitário"

Javier Milei (Foto: Reuters/Ammar Awad)

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Sputnik Brasil - Embora o governo argentino tenha comemorado um superávit de cerca R$ 2 bilhões em março, os dados podem não ser tão esperançosos. Em uma conversa com a Sputnik, a economista Micaela Fernández Erlauer alertou sobre a falta de sustentabilidade do resultado, uma vez que a atividade econômica e a arrecadação continuam a cair.

Em transmissão em cadeia nacional de TV, na última segunda-feira (22), o presidente argentino, Javier Milei, anunciou, em março de 2024, o Setor Público Nacional (SPN) teve superávit financeiro de cerca de 276,6 bilhões de pesos (cerca de R$ 2 bilhões), completando assim três meses consecutivos de excedente financeiro, algo que não ocorria no país sul-americano desde 2008.

Em seu discurso, o mandatário enfatizou que "o superávit fiscal é a pedra angular a partir da qual construiremos a nova era de prosperidade da Argentina". Ele enfatizou ainda que o resultado alcançado deve ser visto como "um marco que deve nos orgulhar a todos como país, especialmente".

No entanto, especialistas questionam a sustentabilidade do feito celebrado por Milei. Em sua conta no X, a economista argentina Micaela Fernández Erlauer advertiu que o superávit celebrado por Milei corresponde ao Setor Público Nacional e que, se considerarmos apenas a Administração Pública Nacional (APN), "em março o resultado foi deficitário".

Consultada pela Sputnik, Fernández Erlauer explicou que a principal diferença entre o setor público e a administração pública é que o primeiro inclui o segundo, uma vez que além da administração pública, também engloba empresas estatais, fundos fiduciários e entidades públicas, como por exemplo, o serviço estatal de saúde para aposentados e pensionistas (PAMI).

Para a especialista, pesquisadora do centro de estudos Fundar, fazer essa distinção entre SPN e APN é fundamental porque neste último é onde se concentra a maior parte dos gastos do Estado, como aposentadorias, obras públicas ou transferências.

A questão, alertou a economista, está nos gastos devolvidos, ou seja, gastos que já foram registrados, mas cujo pagamento ainda não foi realizado. "A diferença entre o SPN e a APN é a dívida flutuante, ou seja, essa diferença entre o que foi devolvido e o que foi pago", detalhou, observando que a capacidade de enfrentar esses pagamentos dependerá da arrecadação futura do Estado.

"O problema é que a arrecadação está caindo. Está caindo, porque a estratégia principal do governo é reduzir a atividade econômica para diminuir a inflação", destacou ela.

Fernández Erlauer apontou que, embora o aumento da taxa de câmbio tenha impulsionado a arrecadação do imposto PAIS (sobre operações em moeda estrangeira) e dos direitos de exportação, "o lado oposto é que a arrecadação de outros impostos, como o Imposto de Renda, a seguridade social ou o IVA, é menor porque os rendimentos das pessoas estão caindo e o consumo está encolhendo".

Dados oficiais coletados pelo jornal argentino Ámbito indicaram que em março de 2024 a arrecadação fiscal caiu 16% em termos reais em relação ao mesmo mês do ano anterior. De fato, a queda afeta especialmente o IVA e o Imposto de Renda, que diminuíram 15% e 40%, respectivamente.

A especialista admitiu que "equilibrar as contas públicas era necessário" para a Argentina, mas alertou que, nesse caminho, o governo optou por cortar gastos "que impactam na atividade econômica".

Ela salientou que são muitas as dúvidas sobre se há "um caminho sustentado" para manter esse superávit em um contexto de queda na arrecadação e enquanto o presidente ratifica que não mudará seu rumo econômico. "Milei ratificou que não aumentará os gastos, mas também não está muito claro como conseguirá aumentar a arrecadação em um cenário de contração econômica como o que estamos vivenciando", sintetizou a economista.

A APOSTA NO SETOR PRIVADO - Fernández Erlauer também relativizou a expectativa que o governo de Milei deposita na chegada de grandes investimentos privados. Em seu discurso, Milei apelou para "a mineração, o petróleo, o gás e o campo" como setores da economia privada que sustentariam o crescimento econômico futuro do país.

"São investimentos de longo prazo, que não estão olhando apenas estes últimos três meses, mas todo o histórico e o futuro", explicou a economista.

A especialista considerou ainda que deveria haver uma "sinergia" entre esses projetos privados e o setor público para "garantir que os investimentos sejam produtivos e gerem riqueza, mas também que se leve em conta que tipo de emprego eles criam e o quão sustentável é sua atividade".

"Há uma clara intenção do governo de convocar os empresários, mas também deve haver um rumo consistente e sustentável. Não acredito que o setor privado esteja disposto a investir em absolutamente tudo por conta própria e vai considerar que facilidades são oferecidas em termos fiscais e quanto apoio é dado ao investimento público para poder realizar esses investimentos", pontuou.

Fernández Erlauer disse ainda que, mesmo que Milei assegure que as metas do FMI estão sendo "superadas", o organismo multilateral levará em conta essa "dívida flutuante" do setor público ao avaliar o país. Dessa forma, disse a economista, "não está tão claro que todas as metas impostas pelo acordo estejam sendo cumpridas".

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