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      Sara Goes

      Sara Goes é âncora da TV247, comunicadora e nordestina antes de brasileira

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      FrenCyber: a bancada das Big Techs e o risco para 2026

      Extrema direita e Big Techs se articulam na FrenCyber para interferir em 2026 e enfraquecer a soberania informacional do Brasil

      (Foto: Reuters)

      Por Sara Goes e Reynaldo Aragon - Enquanto Jair Bolsonaro ocupava o plenário do Supremo Tribunal Federal durante o histórico julgamento do núcleo central do golpe de Estado, o Congresso Nacional, longe dos holofotes, instaurava a Frente Parlamentar de Apoio à Cibersegurança e Defesa Cibernética (FrenCyber). O gesto, aparentemente técnico, abre uma discussão urgente sobre os reais interesses por trás da iniciativa. À primeira vista, a FrenCyber se apresenta como uma resposta à crescente preocupação com a segurança digital no país; no entanto, um olhar mais atento revela um cenário mais complexo – e perigoso.

      Composta majoritariamente por parlamentares de extrema direita ligados diretamente ao bolsonarismo – como Esperidião Amin (PP-SC), Damares Alves (Republicanos-DF), Hamilton Mourão (Republicanos-RS), Jorge Seif (PL-SC) e Sergio Moro (União-PR) – e, por extensão, aos interesses do conservadorismo internacional, em especial do trumpismo, essa frente ilustra um movimento estratégico rumo à influência direta das grandes plataformas digitais sobre a política brasileira.

      A criação da Frente parece integrar uma estratégia já testada internacionalmente, especialmente a partir de 2016, quando a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos evidenciou o uso político das Big Techs – como Google, Meta e Twitter – em operações de guerra híbrida voltadas à desestabilização de governos e ao favorecimento de projetos autoritários. No Brasil, essa lógica se aprofundou a partir de 2018, com a instrumentalização massiva da desinformação e da polarização digital, moldando um ambiente político frágil, conflituoso e altamente suscetível à manipulação algorítmica. A FrenCyber, nesse contexto, sinaliza uma nova etapa dessa ofensiva: institucionalizar, sob o pretexto da segurança cibernética, um aparato voltado à vigilância, ao controle narrativo e à preparação técnica para operações ainda mais sofisticadas de interferência digital – especialmente com vistas às eleições de 2026. Por isso, é essencial compreender como essa bancada pode atuar, do ponto de vista político e técnico, favorecendo interesses externos e minando a soberania informacional brasileira. 

      Esse alinhamento institucional abre espaço para que a extrema direita opere livremente no ambiente digital, protegida pela retórica da “liberdade de expressão” e pela blindagem legislativa oferecida pela Frente. Com ferramentas legais à disposição, figuras ultraconservadoras podem impulsionar, de dentro do Congresso, práticas que facilitam a manipulação informacional em larga escala. 

      Como a FrenCyber ​​pode operar politicamente a favor das plataformas - O poder político da FrenCyber reside justamente na busca pela capacidade de influenciar a criação e aprovação de legislações sobre internet, privacidade e segurança digital. Na prática, os parlamentares dessa frente poderão propor normas que, sob a aparência de reforçar a cibersegurança nacional, acabarão por beneficiar diretamente as Big Techs estrangeiras, garantindo sua operação quase irrestrita no Brasil. Um exemplo internacional que serve de alerta é a Seção 230 do Communications Decency Act dos Estados Unidos, que isenta plataformas digitais de responsabilidade sobre os conteúdos publicados por seus usuários. Medidas semelhantes podem ser replicadas aqui, através de projetos com redações técnicas complexas, que dificultem a responsabilização das plataformas por conteúdos extremistas, teorias conspiratórias ou campanhas de desinformação.

      Além disso, essa bancada pode atuar de forma ativa para bloquear iniciativas que busquem limitar o poder das grandes plataformas — por exemplo, projetos de lei voltados à transparência algorítmica, à restrição da coleta indiscriminada de dados ou à criação de regras para a moderação de conteúdos. A experiência internacional mostra que, em diversos países, legislações supostamente neutras foram redigidas para proteger o modelo de negócios das plataformas, sustentado na coleta massiva de dados pessoais, perfilamento de usuários e segmentação política altamente precisa, fatores decisivos em campanhas eleitorais marcadas pela polarização.

      Trata-se, portanto, de um projeto articulado: ao garantir um ambiente regulatório extremamente favorável às plataformas digitais estrangeiras, a FrenCyber fortalece, simultaneamente, as condições para que grupos da extrema direita continuem utilizando essas mesmas ferramentas para difundir conteúdos polarizantes e desestabilizadores — especialmente no contexto das eleições de 2026. O resultado direto é o enfraquecimento da soberania regulatória do Brasil e o aprofundamento da dependência tecnológica frente às Big Techs, ampliando seu poder de interferência nos rumos políticos nacionais.

      Para além do campo político, a Frente também traz consequências algorítmicas diretas sobre a soberania informacional do Brasil. Um dos riscos mais imediatos é o incentivo a parcerias tecnológicas com plataformas internacionais como Google, Meta e Amazon, sob o argumento sedutor de cooperação em segurança digital. Na prática, essas parcerias podem abrir caminho para um aprofundamento técnico de vigilância em massa e coleta sistemática de dados pessoais de brasileiros por empresas estrangeiras — agora com chancela legislativa.

      Com o respaldo de legislações desenhadas pela bancada, a coleta de informações sensíveis pode se tornar praticamente irrestrita. Isso inclui dados de geolocalização, padrões de navegação, interesses pessoais, consumo de conteúdo, posicionamentos políticos e até comportamento emocional. Esses dados são capturados por meio de cookies persistentes, pixels de rastreamento invisíveis, fingerprinting de dispositivos e cruzamento de informações entre aplicativos e plataformas. Uma simples navegação em redes sociais, um clique em links patrocinados ou a utilização de assistentes virtuais pode resultar em um perfil comportamental detalhado — utilizado, posteriormente, para segmentar eleitores com mensagens personalizadas, manipular emoções e reforçar bolhas ideológicas.

      Um exemplo emblemático desse tipo de operação foi o escândalo envolvendo a Cambridge Analytica, que utilizou dados coletados via Facebook para interferir em processos eleitorais nos Estados Unidos, no Reino Unido e em países da África e América Latina. A empresa acessava perfis psicológicos detalhados para microdirecionar conteúdos políticos e manipular decisões eleitorais de forma altamente precisa — sem consentimento explícito dos usuários. O caso revelou o potencial devastador do uso político dos dados pessoais e como ele pode operar à margem dos sistemas democráticos tradicionais.

      Ao reduzir a capacidade do Estado brasileiro de regular a coleta, o uso e a circulação de dados dos seus próprios cidadãos, a FrenCyber fragilizará a autonomia nacional frente às plataformas digitais estrangeiras. O resultado é a erosão da soberania informacional, a diluição da privacidade individual e o enfraquecimento da democracia como prática baseada em informação plural, transparente e acessível.

      Consequências e riscos concretos da FrenCyber ​​para o Brasil

      Para um país que já vive sob alta polarização e instabilidade institucional há mais de duas décadas, a criação dessa frente parlamentar significa potencializar ao extremo essas vulnerabilidades. Em um cenário onde plataformas estrangeiras têm liberdade técnica e proteção legislativa para manipular a informação, a própria democracia se torna comprometida. Em termos de soberania informacional, isso representa uma vulnerabilidade estrutural inédita: o Brasil entrega sua capacidade de regular o fluxo de informações a empresas estrangeiras motivadas por lucro e alinhamentos políticos transnacionais. Decisões políticas e sociais cruciais passam a ser moldadas por algoritmos opacos, desenhados para maximizar engajamento — não democracia.

      O risco que a FrenCyber representa, portanto, não é uma abstração futura: é real, concreto e urgente. Enfrentá-lo é defender a integridade democrática, a autonomia política e a soberania informacional do Brasil. Com as eleições de 2026 no horizonte, compreender e expor as implicações práticas dessa frente parlamentar é um passo indispensável para evitar que o país mergulhe num ciclo irreversível de manipulação digital e dependência tecnológica. O tempo para reagir é agora.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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