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    Debate político, notas da comunidade e multimídia: como funciona o Weibo, a 'versão chinesa' do X?

    Com meta de expansão global, rede é conhecida no gigante asiático como espaço de controvérsias, discussões sociais e repercussão de notícias em tempo real

    Sina Weibo (Foto: REUTERS/Florence Lo/Illustration/File photo)
    Guilherme Paladino avatar
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    Por Guilherme Paladino, de Pequim, para o 247 - O debate sobre redes sociais e o papel das big techs no Brasil tem se intensificado nos últimos anos, atingindo um ponto crítico com a suspensão do X (antigo Twitter) no país por mais de um mês no ano passado. O episódio reacendeu discussões sobre a concentração do mercado digital e o impacto das plataformas na política e na informação.

    Apesar do crescimento de alternativas como BlueSky e Threads, redes tradicionais como Facebook, Instagram e WhatsApp seguem dominando o cenário. O próprio X, após meses de turbulência, recuperou sua posição e hoje opera sem restrições no Brasil.

    Diante desse contexto, cresce entre setores progressistas o interesse por plataformas que escapam ao controle das big techs estadunidenses. Com isso em mente, o Brasil 247 visitou, nesta quarta-feira (19), a sede da Sina, empresa responsável pelo Weibo, uma das maiores redes sociais da China. Após dias utiliando a plataforma, nossa reportagem explora o que foi possível aprender sobre seus mecanismos de moderação, seu papel no ambiente digital chinês e suas ambições globais.

    Weibo, a rede do debate público na China

    Nascido em 2009 como um serviço de "microblogging" (textos com número restrito de caracteres), o Weibo passou por diversas modificações e expandiu suas funcionalidades ao longo dos anos. Hoje, já se permitem publicar fotos, vídeos e textos longos, assim como realizar transmissões ao vivo, enquetes e até mesmo podcasts. 

    No entanto, para o público chinês, a essência deixada pelos tempos de microblogging segue sendo o principal atrativo da plataforma. Afinal, diversos outros fortes concorrentes surgiram ao longo do tempo e ganharam mais popularidade em outras funções, como vídeos curtos e longos, fotos pessoais, mensagens instantâneas, etc. Desta forma, o Weibo ainda é relevante como um espaço de debate público e repercussões de acontecimentos e notícias quentes em tempo real - exatamente o espaço que o X/Twitter ocupa no Ocidente. 

    Redes sociais mais populares da China no Terceiro trimestre de 2024
    Redes sociais mais populares da China no terceiro trimestre de 2024(Photo: Lai Lin Thomala/Statista)Lai Lin Thomala/Statista

    Em conversas informais com chineses tanto durante a visita à sede da plataforma quanto em outros momentos no dia a dia em Pequim, algumas das frases usadas para descrever o Weibo foram "uma das redes onde há mais controvérsia na China" e "os debates lá chegam a ser um pouco agressivos". Curiosamente, tal descrição pode soar até mesmo como mais atraente do que negativa a internautas ocidentais, tão acostumados a intensas discussões online e, muitas vezes, temerosos de que as redes chinesas possam suprimir as exposições de opiniões diversas. 

    De acordo com um relatório da própria plataforma, a distribuição de Trending Topics (assuntos mais discutidos no momento) é observada, em média, em: 

    • 40% para temas de entretenimento
    • 30% temas sociais
    • 30% conteúdo de interesse específico (voltados para um grupo específico de usuários que compartilham um interesse em comum, como Inteligência Artificial)

    Em uma rápida busca feita pela reportagem do 247 na manhã de quinta-feira (horário local), os 5 temas que estavam no topo dos Trending Topics eram: 

    1. "menina de 8 anos em Gaza quase perde todo seu cabelo enquanto fugia" - 1.155.332 posts
    2. "empresa de Zhang Xuefeng dá feriado de 3 dias uma vez por mês" - 489.675 posts
    3. "isso é Colorful Guizhou" [colorful Guizhou se trata de uma companhia aérea] - 412.874 posts
    4. "Guan Xiaotong disse: "eu rapidamente troquei isso"" [aparentemente relacionado a uma atriz chinesa e a algum evento do qual ela participou] - 403.155 posts
    5. "CCTV ainda não transmite a partida entre China e Arábia Saudita" - 367.025 posts
    Trending topics do Weibo
    Trending topics do Weibo(Photo: Captura de tela na manhã de 20/03/2025)

    A rede confere liberdade em debates relacionados aos mais diversos assuntos. Testamos buscas com temas relacionados à comunidade LGBT, pessoas transgênero, Donald Trump, Elon Musk, corrida tecnológica, etc, e há uma infinidade de posts falando sobre eles - com publicações vindas de contas verificadas de jornalistas a até perfis pessoais com poucos seguidores.

    Os pontos em que se pode notar um controle maior são relacionados quase que somente a autoridades públicas do mais alto escalão. Termos como "Xi Jinping" são apenas permitidos em caracteres chineses e veiculados por contas oficiais de notícias. Tal prática, no entanto, não é exclusiva do Weibo: o próprio DeepSeek restringe buscas que incluam estes termos. Tampouco é algo que existe somente na China; afinal, incontáveis influenciadores e internautas progressistas ocidentais já denunciaram ter sofrido restrições a seus perfis no Instagram, Facebook e Twitter quando fizeram publicações relacionadas à Palestina, por exemplo.

    De resto, se pode observar um debate bastante amplo no Weibo. Por uma questão de tempo, não foi possível testar todos os termos existentes, mas a rede é aberta ao mundo inteiro e qualquer pessoa pode se cadastrar e explorar a plataforma - lembrando que é sempre importante respeitar as leis, tradições e culturas locais, como em qualquer país do mundo.

    Moderação de conteúdo ao estilo X/Twitter

    O Weibo vem implementando um novo mecanismo de moderação de conteúdo bastante similar às "notas da comunidade" do Twitter, as quais Mark Zuckerberg também já afirmou que pretende adotar nas redes da Meta. Trata-se do mecanismo Weibo Fuzhu, no qual usuários qualificados - como professores influentes, perfis de checagem de fatos e profissionais de mídia - podem acrescentar notas em publicações de outros usuários que contenham desinformação ou dados equivocados/incompletos. 

    Assim como no Twitter, tais notas ficam agregadas logo abaixo do post original, evitando que a desinformação se espalhe sem controle.  Para usar o mecanismo, existe uma hashtag chamada 微博附注 (que significa "nota do Weibo", em tradução livre), na qual os usuários qualificados apresentam um comentário ao post duvidoso. É possível também acessar a hashtag para monitorar todos os posts que tiveram notas de checagem de fatos adicionadas.

    No post abaixo, por exemplo, um usuário fez uma publicação apresentando supostas promessas não cumpridas pelo governo chinês no contexto de sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001. Na sequência, o perfil verificado "Stop Rumours" acrescentou uma nota contendo um link para um vídeo jornalístico esclarecendo os boatos sobre o tema.

    Exemplo de "notas da comunidade" do Weibo
    Exemplo de "notas da comunidade" do Weibo(Photo: Captura de tela)Captura de tela

    "Se existem notícias falsas, podemos usar a função Fuzhu. Eliminar conteúdos diretamente não é a melhor forma de combater a desinformação; nós garantimos publicamente que as notícias são falsas e apresentamos quais são os conteúdos verdadeiros", explicou Liu Ying, diretora de operações de mídias do Weibo, quando questionada pelo 247 sobre as medidas adotadas para inibir a disseminação de fake news na plataforma.

    Apesar do destaque dado à iniciativa, o impacto do Weibo Fuzhu como mecanismo de moderação de conteúdo ainda aparenta ser razoavelmente tímido. Em uma plataforma que conta com 260 milhões de usuários ativos diários, apenas 150 notas de correção originais foram feitas nas últimas 24 horas, de acordo com dados públicos do próprio Weibo. A reportagem passou horas tentando encontrar algum post com nota do Weibo Fuzhu apenas navegando pelo feed, mas não foi possível. Somente encontramos posts com notas adicionais ao buscar a hashtag específica das "notas do Weibo".

    Desejo de expansão ao Ocidente

    Assim como já ocorreu com os concorrentes Douyin (Tiktok) e Xiaohongshu (Red Note), o Weibo agora também busca ampliar sua presença no mercado global, de acordo com seus representantes. Para isso, a estratégia adotada será a de atrair influenciadores e profissionais de mídia de outros países para que estes possam trazer seu público consigo. 

    "Os principais usuários do Weibo no exterior são de comunidades chinesas, mas vamos nos esforçar para expandir o Weibo a usuários estrangeiros. Para fazê-lo, queremos convidar pessoas com influência a tomar a dianteira em usar o Weibo. Queremos começar a expansão plantando esta semente em primeiro lugar. Por isso, queremos convidar jornalistas ou influencers para ajudar a expandir nosso produto no mercado de seus países", explicou Yu Qi, editora-executiva e gerente-geral do departamento de comunicação com mídias. 

    O caminho existe, como provado pelos concorrentes mencionados anteriormente. No entanto, ainda há claros obstáculos a serem superados para atrair mais público de fora da China.

    Em primeiro lugar, a questão do idioma é crucial, pois, apesar de existir a possibilidade de deixar o app em inglês, ela ainda é bastante limitada - mesmo na versão em inglês, muitos itens da interface ainda continuam em chinês, assim como o conteúdo postado na plataforma. A ressalva positiva é que, no caso dos posts em texto, já existe um botão para traduzi-los instantaneamente ao idioma padrão do celular do usuário, com o português incluso. 

    Edifício-sede da Sina, empresa responsável pelo Weibo, em Pequim
    Edifício-sede da Sina, empresa responsável pelo Weibo, em Pequim(Photo: Guilherme Paladino/Brasil 247)Guilherme Paladino/Brasil 247

    Além disso, assim como no caso de quase todos os apps chineses, a interface do Weibo é bastante diferente do estilo mais minimalista das redes ocidentais. Desta forma, é preciso um certo tempo para o usuário de fora se acostumar com o volume de informações, botões, opções e anúncios que aparecem na tela do celular ao abrir o aplicativo. De início, é comum ficar um pouco perdido e não saber muito bem o que fazer e onde clicar.

    Apesar de tais "desafios", a experiência de usar o app torna-se interessante depois de um curto período de adaptação. O mecanismo de busca funciona bem, especialmente se o usuário utilizar ferramentas de Inteligência Artificial como o ChatGPT ou o DeepSeek para traduzir os termos desejados ao chinês, e os Trending Topics são interessantes para estrangeiros acompanharem o que está acontecendo em tempo real no país. Além disso, a função de traduzir os posts em texto é bastante útil, pois possibilita ler as publicações sem muitas dificuldades.

    Em síntese, se você é uma pessoa curiosa em conhecer mais sobre o comportamento dos chineses na internet e como o país repercute os grandes debates globais e acontecimentos internos, o Weibo certamente é uma opção interessante para isso. Principalmente aos mais "vividos" em fóruns digitais e redes sociais, vale a pena o esforço. 

    ❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com redacao@brasil247.com.br.

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