O "nosso desembargador Acácio"
Melhor pensar na figura, que já nasce icônica, de um "Desembargador Benjamin Acácio", produzida pela força indômita e insuperável da realidade brasileira
Em "O Primo Basilio", Eça de Queirós criou o célebre personagem "Conselheiro Acácio" como representação da mediocridade dos políticos e burocratas portugueses dos finais do século XIX. Até hoje a figura é utilizada para designar a postura pomposa e vazia da pseudo-intelectualidade, tanto em Portugal como cá, em terras tupiniquins.
Do personagem provém o termo "acaciano", que, segundo o dicionário Oxford, designa "que ou quem se mostra afetado, ridículo pelo uso de fórmulas convencionais ao falar ou pela maneira pomposa de ser; acacianista, acacista"; segundo Caldas Aulete, "que lembra o palavreado sentencioso e oco, mas de tom grave e presumido, do Conselheiro Acácio".
A realidade, porém, é dotada de tal força que a ela a imaginação de gênio algum da literatura é capaz de se igualar.
No Brasil temos, em carne e osso, um personagem que supera todos os limites da mediocridade e da postura pomposa, ridícula, vazia, afetada, representada pela criação de Eça de Queirós, e ao mesmo tempo sintetiza o comportamento presunçoso próprio de parcela do judiciário.
Por estas plagas, temos o "Desembargador Acácio".
Refiro-me ao desembargador Benjamin Acácio de Moura e Costa, do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), que teve a ousadia pérfida e mesmo criminosa de usar uma pretensa "má qualidade da vítima” como fundamento para votar a favor do habeas corpus ao assassino bolsonarista Jorge Guaranho, ex-policial penal preso por matar a tiros Marcelo Arruda, tesoureiro do PT em Foz do Iguaçu, na festa que este promovia para comemorar com familiares e amigos o seu aniversário.
Com a decisão, Guaranho aguardará em prisão domiciliar até seu julgamento pelo júri popular, marcado para fevereiro.
No seu voto, o criminoso de toga teve a petulância de classificar a vítima como uma “pessoa nefasta na sociedade” e sugeriu que, assim, “a consciência coletiva” aceitaria o assassinato “de forma mais branda”.
Por "pessoa nefasta, de má qualidade", esse nosso "Desembargador Acácio" refere-se, por óbvio, a todos nós petistas, já que era o único atributo conhecido da vítima pelo algoz e que foi a razão bastante da perpetração do crime praticado pelo policial invasor.
Marcelo Arruda foi assassinado durante a festa de seu aniversário de 50 anos.
“Eu me socorro do entendimento que me convenceu de que a ordem [de habeas corpus em favor de Guaranho] deve ser conhecida e, neste caso, deferida, em face da má qualidade da vítima. Ela realmente era uma pessoa nefasta na sociedade e, por certo, muitos podem estar pensando no sentido de que realmente houve uma limpeza social. Da forma errada, da forma injusta, da forma indevida, masque a consciência coletiva aceita de uma forma mais abrandada. Então, dessa forma, senhora presidente, conheço e concedo a ordem”, disse Costa, segundo reportagem de Paulo Capelli, do jornal Metrópoles.
O Brasil inteiro viu, estarrecido e indignado, como se deu o crime. Espero que a família do companheiro Marcelo Arruda não deixe barato e busque, no âmbito da própria justiça, uma reparação por tal infâmia. Será pela memória de Marcelo e também pela dignidade de todos nós companheiros petistas. Afinal, o conceito nazista da "limpeza social" proposta pelo desembargador põe em risco a vida e a integridade física de todos nós que ousamos ostentar uma filiação ao Partido dos Trabalhadores.
A decisão acaciana, aliás, benjaminiana, reproduz o sentimento de ódio que nutre a extrema-direita brasileira em relação a todos nós, petistas, porque não tolera o pensamento divergente e, sobretudo, qualquer comportamento que tenha o pobre como beneficiário de direitos, marca dos governos petistas.
O ridículo Desembargador Acácio chegou ao ponto de defender o trancamento da ação contra Guaranho por "legítima defesa", o que, acaso tivesse sido vitorioso, tornaria impune o assassino. “Para mim, é o típico caso de trancamento penal. Porque é matar ou morrer, é sempre legítima defesa”, afirmou.
Acácio foi voto vencido quanto à suspensão do processo, mas os demais desembargadores concederam o habeas corpus para o acusado, que estava detido no Complexo Médico Penal de Curitiba.
O argumento, por mais abjeto e inverossímil que seja, com certeza será explorado pela defesa do criminoso durante o júri, e com chances reais de prosperar. Será ridículo e antijurídico defender a tese da "legítima defesa", mas o colega que o fizer terá o respaldo da opinião vergonhosa de uma autoridade superior representada pela figura perversa do "Desembargador Acácio".
Pensando bem, não sei se "acaciano" é suficiente para sintetizar o caráter do usurpador da condição de magistrado que tem assento no tribunal de justiça do Paraná. Afinal, o "Conselheiro Acácio", de Eça de Queirós, era dotado de um refino que escapa ao magistrado paranaense, que se revelou absolutamente grosseiro e incapaz de qualquer exercício de empatia e bom senso.
Melhor pensar na figura, que já nasce icônica, de um "Desembargador Benjamin Acácio", produzida pela força indômita e insuperável da realidade brasileira. E logo pelo judiciário do Paraná, estado em que se forjou a "Orcrim da Lava Jato", que é para fechar o pacote com fitilhas de ouro.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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