O Projeto Nacional e outros enganos
"A burguesia 'brasileira' efetivamente não gosta e não quer um Brasil diferente", aponta Arnóbio Rocha
O Brasil é um país difícil de entender, assim como a Argentina, o México, o Japão e por aí vai, pois cada um deles tem sua própria dinâmica, sua história, origem, traumas, formação social e econômica. Então aquela máxima de isso ou aquilo “só acontece no Brasil” é repetida (em outro idioma) com a Argentina, com o México, até mesmo com o Japão. É uma forma de achar que algo errado é recorrente e parece ser exclusivo com aquele povo ou com aquele país.
Claro que há algumas particularidades que efetivamente dificilmente se encontraria em outros países, mas essas idiossincrasias na maioria das vezes têm a ver com a formação, a origem específica de um país, no caso do Brasil, ser o único país da América (nome inadequado para o continente) a ser colonizado por Portugal, de forma despótica, violenta, sanguinária e selvagem, assim como os demais países, pois toda colonização é uma dominação injusta e que o poder da força supera a razão, quase sempre em nome de um Deus qualquer que se impõe aos costumes locais.
Dessa colonização, a primeira particularidade é o próprio idioma, apenas falado aqui, esmagando todos os outros idiomas locais, o que de certa forma não aconteceu em outros países que, à custa de muita resistência, muitas línguas faladas antes das colonizações se mantiveram vivas. Não é o caso de Brasil/Portugal. Segunda característica marcante é a herança, uma imposição legal de ordem violenta, disfarçada por um ar de bondade que jamais se teve, a escravidão e o tratamento violento contra negros e os povos originários, que desmente qualquer sinal de cordialidade.
O traço talvez mais forte, mas isso se divide com as colonizações espanholas, é a formação de uma burguesia sem nenhum apego ao Brasil, sem criar uma perspectiva de nação e de soberania. Desde os primórdios o grande objetivo das classe dominantes locais é o ódio ao povo, nenhum apreço à Democracia ou relações humanas dignas, o que explica a submissão não apenas no passado à Portugal, como hoje aos EUA e à Europa.
O que impede a possibilidade de um “Projeto Nacional” contando com essa “burguesia Nacional”, como forma de desenvolvimento do capitalismo mais aprimorado e com capacidade de competir no mundo, com distribuição de renda, aproveitando todas as características locais de proteção ao meio ambiente, impondo aos demais países contrapartida para limitar exploração que possa piorar o clima, mudar a cultura de exploração do campo e garantir o fim da fome, da miséria, do analfabetismo e ter um padrão de saúde e educação.
Essas tarefas tipicamente burguesas não serão cumpridas pela burguesia “brasileira”. Aqui o peso da história e formação falam mais alto. A questão da democracia nunca foi vista como uma forma de desenvolvimento social e econômico. Os atalhos autoritários e de dirigentes sem compromisso como povo/nação são características que explicam figuras francamente idiotas terem sido presidentes, governadores, ministros. Nesse sentido, a mídia burguesa reflete exatamente essa lógica, incapaz de produzir qualquer visão minimamente crítica, ao contrário, trabalha contra os eventuais governos populares, como Getúlio, Juscelino, Jango, Lula e Dilma.
O Brasil recentemente atravessou oito anos de turbulência, após a vitória de Dilma, em que a própria reeleição passou por questionamentos das urnas pelo finado PSDB. Depois, em um ano e quatro meses, a presidenta sofreu os mais virulentos ataques para inviabilizar seu mandato e tornar uma unanimidade sua queda. O pior veio à cavalo, Temer e Bolsonaro. Mesmo assim, pareceu pouco, o nível de destruição da economia, da falência do Estado e da quase inviabilidade de ser país independente.
O esforço do governo de “salvação nacional” feito por Lula-Alckmin, numa coalizão de centro-esquerda com centro direita, mesmo com a desgraça herdada, repôs o país nos eixos, com muito a se fazer, mas para a mídia e à boca comum, o Brasil está sendo destruído, e novamente se revela de forma cristalina o caráter de classe e de como a burguesia “brasileira” efetivamente não gosta e não quer um Brasil diferente. Ela torpedeia diariamente as iniciativas que possam mudar o cenário nacional.
É uma constatação dura, mas realista, sobre o Brasil, sem nenhum maneirismo e bobagens de que só acontece aqui. Acontece aqui por uma conjugação de fatores, nem sempre ligados ao Brasil.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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