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      Denise Assis

      Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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      Para entender Donald Trump

      Em seu livro “Medo", Bob Woodward entrega tudo. Desenha quem foi Trump no primeiro governo, e o que estaria pronto para vir agora

      Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump - 09/04/2025 (Foto: REUTERS/Nathan Howard)

      Voluntarista, ele desarrumou o mundo tal como o conhecíamos. Isso é perigoso, traz incertezas, mas é o que ele quer. E Donald Trump só faz o que ele quer. Ainda que desarrume o mundo tal como o conhecíamos. Com isso, estamos fechando um ciclo. Vimos e vivemos o apogeu do império. E é alguém tipicamente fruto desse império que o está colocando abaixo. Um homem poderoso, de negócios e de vontades.

      Em seu livro “Medo” – publicado pela Editora Todavia, em 2018 -, em que traça um perfil impiedoso e dolorosamente verdadeiro, calcado em entrevistas, documentos oficiais e pesquisas sobre Trump, Bob Woodward entrega tudo. Desenha quem foi Trump no primeiro governo, e o que estaria pronto para vir agora.

      Sim, Woodward é ele mesmo, um dos jornalistas da dupla Carl Bernstein/Bob Woodward, que levaram Richard Nixon à renúncia, revelando o escândalo nas eleições americanas. Em 18 de junho de 1972, membros do Partido Republicano (Estados Unidos) tentaram instalar um sistema de espionagem na sede do Partido Democrata e foram descobertos. O caso que envolvia o presidente Nixon, dos EUA, marcou o jornalismo investigativo. 

      A história se passa em início de setembro de 2017 e vale ser reproduzida tal como Bob a escreveu: 

      “No começo de setembro de 2017, no oitavo mês de governo Trump, Gary Cohn, ex-presidente da Goldman Sachs e principal assessor econômico da Casa Branca, caminhou cuidadosamente em direção à mesa do presidente no Salão Oval. (...)

      Na mesa, havia o rascunho de uma carta de uma página de Trump para o presidente da Coreia do Sul, encerrando o tratado de livre-comércio entre os dois países, conhecido como Korus. Cohn ficou chocado. Por meses, Trump tinha ameaçado cancelar o acordo, um dos pilares de uma relação econômica, de uma aliança militar e, o mais importante, de operações altamente confidenciais dos serviços de inteligência.

      Sob um trabalho que datava dos anos 1950, os Estados Unidos posicionaram 28,5 mil soldados na Coreia do Sul e operaram os mais altamente confidenciais e secretor Programas de Acesso Especial (SAPs, na sigla em inglês), que forneciam sofisticados códigos de inteligência e poderio militar. Os mísseis balísticos intercontinentais da Coreia do Norte já tinham a capacidade de carregar armamento nuclear, talvez até o continente americano. Um míssil saído de lá levaria 38 segundos para chegar a Los Angeles.

      Tais programas permitiam que os Estados Unidos detectassem um lançamento de míssil balístico intercontinental da Coreia do Norte em sete segundos. Fazê-lo a partir do Alasca levaria quinze minutos – uma diferença impressionante.

      A capacidade de detectar um lançamento em sete segundos daria às forças militares dos Estados Unidos tempo de derrubar um míssil norte-coreano. Talvez fosse a operação mais importante e secreta do governo norte-americano. A presença dos Estados Unidos na Coreia do Sul representava a essência da segurança nacional.

      Desfazer o acordo comercial Korus, que a Coreia do Sul considerava essencial para a sua economia, poderia levar um desmantelamento de toda a relação. Cohn não podia acreditar que o presidente arriscaria perder recursos vitais aos serviços de inteligência cruciais para a segurança nacional.

      Tudo aquilo era resultado da fúria de Trump quanto ao déficit de 18 bilhões de dólares anuais no comércio com a Coreia do Sul e nos gastos de 3,5 bilhões de dólares para manter os soldados lá.

      Apesar dos relatos quase diários de caos e discórdia na casa Branca, o público não sabia da gravidade da situação interna. Trump se mostrava sempre volátil, errático, mal conseguia ficar parado. Quando ficava de mau humor porque algo importante ou pequeno o enfurecia, o presidente comentava , referindo-se ao acordo: “Vamos cancelá-lo hoje”.

      Mas agora havia a carta, datada de 5 de setembro de 2017, um potencial gatilho para uma catástrofe na segurança nacional. Cohn ficou preocupado , se Trump a visse poderia assiná-la.

      Então tirou o rascunho da mesa do presidente. E o colocou em uma pasta azul onde se lia numa etiqueta: “MANTER”.

      “Eu a roubei”, Cohn contou depois a um colega. “Não podia deixar que a visse. Ele nunca vai ver o documento. É preciso proteger o país.”

      Na anarquia e desordem da Casa Branca e da sua própria mente, Trump nunca notou a falta da carta.

      Cohn e Porter trabalharam juntos para descarrilar o que acreditavam ser as ordens mais impulsivas e perigosas de Trump. (...) Não se trata de fazer algo pelo país, Cohn confidenciou. “Mas de impedir que ele faça.”

      Àquela altura, em 2017, em seu primeiro mandato, o que estava no alvo de Trump, na mira de suas explosões emocionais era apenas um pequeno país, a Coreia do Sul. Cohn e Porter estavam a postos para tirar da frente de Donald Trump a carta estopim que poria um importante acordo comercial a perder. Dessa vez, eles não estavam lá. Trump rompeu acordos com mais de 75 países e desmoronou a economia e o mundo tal como o conhecíamos. Porque Trump quis. Porque Trump quer. Agora, de laranja, está amarelo. Continua a dizer que está tudo maravilhoso, mas colado ao telefone, esperando que Xi Jinping lhe faça um aceno. 

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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